Pesquisa sobre contaminação por mercúrio em gestantes e bebês indígenas dá novos passos
O Grupo de Pesquisa “Ambiente, Diversidade e Saúde”, da ENSP/Fiocruz, realizou, entre os dias 11 e 13 de junho, em Itaituba (PA), uma oficina de trabalho para avaliação do Estudo Longitudinal de Gestantes e Recém-nascidos Indígenas Expostos ao Mercúrio na Amazônia. Na atividade, foram apresentados resultados parciais da pesquisa. Além disso, o encontro foi uma oportunidade para alinhar, junto às lideranças Munduruku e à Coordenação do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Rio Tapajós, a continuidade do estudo até, pelo menos, o segundo semestre de 2026. A pesquisa está no âmbito do 'Projeto Proteção de Povos Indígenas e Tradicionais do Brasil', financiado pelo Ministério Federal de Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha por intermédio do WWF.
No primeiro dia da oficina, o pesquisador da ENSP e coordenador do estudo, Paulo Basta, abriu os trabalhos apresentando a carta da Associação Indígena Pariri, que deu origem à parceria entre a Fiocruz e o povo Munduruku. Em seguida, ele atualizou os participantes sobre o contexto de desenvolvimento do projeto, enfatizando todas as etapas cumpridas para iniciar o funcionamento do sistema de vigilância de base comunitária. O sistema foi elaborado para garantir o acompanhamento de gestantes e seus recém-nascidos, em dez aldeias Munduruku, nas regiões do médio e do alto Rio Tapajós.
Fotos: Fabio Miranda - Sesai/MS
A professora Juliana Vaz, da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), analisou o preenchimento do questionário utilizado na pesquisa. Uma das colaboradoras do projeto, ela orientou os participantes sobre a melhor forma de registrar os dados de interesse para o estudo, incluindo a caracterização do consumo de pescados, o registro do peso, da estatura e de outros parâmetros clínicos das gestantes. A professora destacou ainda a importância de notificar os resultados dos níveis de mercúrio nas amostras de cabelo e a forma de comunicar os achados às comunidades. O instrumento de coleta de dados é bilíngue e foi concebido em português e Munduruku, com auxílio de professores, lideranças e representantes do conselho distrital de saúde do DSEI Rio Tapajós, a fim de facilitar a compreensão dos agentes indígenas de saúde (AIS) e das participantes do estudo.
À tarde, a neuropsicóloga Mirian Akiko Furutani de Oliveira, da Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da USP, também parceira do projeto, apresentou os fatores que influenciam o desenvolvimento do cérebro do feto durante a gestação, bem como as estratégias para avaliar os principais marcos do neurodesenvolvimento infantil – motores, psicológicos, linguagem, sociais, adaptativos, interação mãe-bebê – nos primeiros mil dias de vida. Em seguida, Lunielle Caldeira, médica pediatra especializada em neuropediatria e neurogenética pelo Hospital das Clínicas da USP, compartilhou os resultados da Avaliação Neuropediátrica, realizada em dezembro de 2023 e novembro de 2024, durante uma ação conjunta do DSEI Rio Tapajós, com os especialistas da USP e de Harvard, com coordenação do grupo de pesquisa liderado por Basta.
No dia seguinte, houve relatos das equipes de pesquisadores que realizam supervisão dos trabalhos desenvolvidos no território, destacando o número de gestantes e recém-nascidos acompanhados por aldeia. Foram revisadas e enfatizadas as atribuições de cada um dos membros das EMSI que atuam no projeto para garantir o bom funcionamento do sistema de vigilância de base comunitária. Além disso, foram expostas propostas para aperfeiçoamento das atividades de vigilância e monitoramento das gestantes nas aldeias.
Em seguida, a equipe da Divisão de Atenção à Saúde Indígena (DIASI) do DSEI Rio Tapajós fez um balanço das operações realizadas desde outubro de 2023, informando o número de profissionais envolvidos nas operações, as implicações logísticas para os deslocamentos das equipes, a quantidade de horas de voo necessárias para os deslocamentos, bem como os gastos com combustível para garantir as viagens terrestres e fluviais do grupo de pesquisa ao território indígena. Os enfermeiros Michael Blandes e Jacqueline Aguiar concluíram destacando os avanços e as dificuldades enfrentadas para garantir a operação do sistema de vigilância de base comunitária nas aldeias incluídas no estudo.
Posteriormente, os participantes da oficina foram divididos em subgrupos para debater estratégias para: i) aperfeiçoar o registro dos dados no questionário bilíngue; ii) aprimorar a aplicação dos testes para avaliação do neurodesenvolvimento infantil; iii) otimizar a coleta de amostras de sangue, cabelo, células da mucosa, cordão umbilical, bem como os exames de imagem; e iv) acurar o levantamento de dados sobre óbitos em mulheres em idade reprodutiva e recém-nascidos. Os debates foram conduzidos de modo a garantir a execução do protocolo de pesquisa e a estruturar a vigilância e o monitoramento das gestantes e recém-nascidos nas comunidades.
No último dia, os debates ocorridos nos subgrupos foram sintetizados e compartilhados na plenária da oficina com todos os participantes, e por fim, a pesquisadora da EPSJV Ana Claudia Vasconcellos (coordenadora adjunta do estudo longitudinal) fez a apresentação do ‘Manual Técnico para o Atendimento de Indígenas Expostos ao Mercúrio no Brasil’. O documento que contém as principais diretrizes para as EMSI que atuam em áreas impactadas pelo garimpo acolherem os indígenas expostos ao mercúrio foi recentemente lançado pela Fiocruz, em parceria com a Sesai e o MPI, e está disponível na Biblioteca Virtual do Ministério da Saúde.
O evento foi encerrado com o lançamento do álbum de canções temáticas ‘Amazônia Sem Garimpo – Volume 2’, um produto de comunicação em saúde do grupo de pesquisa. As canções estão disponíveis em todas as plataformas digitais. Conheça o trabalho do grupo aqui.
Com o sistema de vigilância de base comunitária em operação, foram matriculadas 131 gestantes no estudo, e já existem 99 recém-nascidos em monitoramento pelas EMSI com apoio dos especialistas do grupo de pesquisa Ambiente, Diversidade e Saúde, coordenado por Basta.
Os achados preliminares apontam que os níveis médios de mercúrio nas amostras de cabelo das gestantes atingem cifras em torno de 10 partes por milhão (ppm), sendo que em algumas mulheres grávidas os níveis ultrapassam 30 ppm. Os níveis médios de mercúrio nas amostras de cabelo dos recém-nascidos ficaram em torno de 6 ppm, atingindo cifras superiores a 16 ppm. Vale lembrar que o ‘Manual Técnico para o Atendimento de Indígenas Expostos ao Mercúrio no Brasil’ do Ministério da Saúde entende que níveis seguros de exposição ao mercúrio não devem exceder 2 ppm. Para mais informações sobre os achados, confira a reportagem veiculada na TV Globo em 17 de junho.
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