Atenção Primária teve progresso, mas precisa de avanços em infraestrutura e oferta de cuidados, indica estudo
Os avanços são visíveis. Nos últimos 30 anos, houve melhorias, com redução de desigualdades sociais no acesso a serviços e na situação de saúde da população. Desde a implementação da Estratégia Saúde da Família, a Atenção Primária (APS) tem muito a comemorar. No entanto, ainda há desafios a enfrentar. Apesar do progresso, a principal porta de entrada do SUS carece de avanços na infraestrutura, além de ampliação na oferta de cuidados e na cobertura de ações preventivas e de promoção da saúde e da equidade. É o que apontam os dados do Censo Nacional das Unidades Básicas de Saúde (Censo das UBS 2024), realizado pela Secretaria de Atenção Primária à Saúde (SAPS/ MS), com apoio do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). O estudo teve parceria da Rede de Pesquisas em APS da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), da qual a ENSP participa.
Realizado entre junho e setembro de 2024, o Censo Nacional das Unidades Básicas de Saúde contou com a participação de 100% dos estabelecimentos de Atenção Primária à Saúde ativos no SUS em todo o país.
Conforme afirma a pesquisa, os dados contribuem para o planejamento de investimentos, a qualificação dos serviços e o monitoramento de resultados no Sistema Único de Saúde. O censo pode, ainda, orientar o planejamento de gestores das três esferas governamentais.
Infraestrutura e funcionamento
O Censo das UBS 2024 aponta que a maioria das Unidades Básicas de Saúde contam com ao menos uma equipe de Saúde da Família, sendo mais frequente a presença de apenas uma equipe por unidade. A maior parte das UBS (85,3%) funciona em prédios próprios, porém, uma parcela significativa (60,4%) indica necessidade de reforma ou ampliação. Foram frequentes os registros de espaços destinados à vacinação (79,7%).
Segundo Ligia Giovanella, pesquisadora da ENSP que participou do estudo, um dos resultados que chama a atenção é a presença de equipes e médicos na quase totalidade das UBS, uma diferença importante do Censo anterior, de 2012. A ampliação do Programa Mais Médicos e a retomada do credenciamento de equipes de saúde bucal podem estar por trás dos números positivos, argumenta a pesquisadora.
Parte das unidades (18,4%) relatou ter sofrido impactos de eventos climáticos extremos nos últimos cinco anos, indicando a importância de medidas de adaptação e resiliência na infraestrutura da Atenção Primária.
Saúde digital
Conforme mostram os dados, a maioria das UBS (94,6%) têm acesso à internet, embora a qualidade da conexão varie entre as unidades. A maior parte delas (77,8%) conta com consultórios conectados e equipamentos básicos de tecnologia da informação, como computadores, tablets e impressoras, ainda que distribuídos de forma desigual entre as regiões do país.
O Prontuário Eletrônico do Cidadão está implantado em 87,3% das unidades. Por outro lado, apenas cerca de metade das UBS (52,2%) informou contar com infraestrutura adequada para a realização de webconferências, indicando limitação no uso de estratégias de telessaúde.
Integração em rede, regulação e cuidado compartilhado
Os resultados indicam que a maior parte das UBS (65,5%) realiza agendamento com hora marcada e mantém, simultaneamente, oferta para atendimento por demanda espontânea (95,5%).
A comunicação com outros pontos da rede está presente em 93,2% das unidades, principalmente por meio de ligações telefônicas e mensagens. Já o compartilhamento do prontuário eletrônico para comunicação entre UBS ocorre em cerca da metade dos casos (49,9%), enquanto o uso da telessaúde para se comunicar com outros pontos da rede é ainda restrito (15,9%).
Oferta de ações e serviços
O Censo das UBS 2024 confirma a disponibilização de um conjunto abrangente de ações preventivas, clínicas e de promoção da saúde na Atenção Primária.
Vacinação (84,7%), pré-natal (95,9%), puericultura (94%) e coleta de exame citopatológico (96,3%) estão presentes na maioria das unidades.
O acompanhamento de condições crônicas, como hipertensão (97,2%) e diabetes (97,6%), é rotina em praticamente todas as UBS. Em relação à saúde da pessoa idosa, mais da metade das unidades (62,8%) aplica avaliação multidimensional.
Práticas específicas, como a inserção de DIU (19,7%) e a busca ativa para rastreamento mamográfico (57,8%), estão implantadas em parte das unidades, mas ainda com cobertura limitada em comparação às demais ofertas na APS.
Saúde Bucal
De acordo com os resultados, cerca de três em cada quatro UBS contam com equipe de saúde bucal (74,4%) e dispõem de consultório odontológico (82,7%). A maioria (95,4%) realiza atendimento por demanda espontânea e registra os procedimentos em prontuário eletrônico.
Apesar da ampla implantação da triagem para câncer de boca (93,2%), apenas 13,6% das unidades coletam material para biópsia.
Ações Comunitárias e promoção da equidade
Conforme aponta o Censo das UBS 2024, a maioria das unidades (96,4%) conta com agentes comunitários de saúde. Os profissionais atualizam cadastros, realizam visitas domiciliares e buscam ativamente usuários com vacinação atrasada ou em situações de risco. Ainda assim, cerca de um terço das unidades (35,8%) possui microáreas sem cobertura dessa categoria profissional.
A atuação comunitária inclui ações educativas, mobilização social e acompanhamento de condicionalidades do Programa Bolsa Família, embora os Conselhos Locais de Saúde e práticas específicas voltadas à população em situação de rua ainda sejam menos frequentes (21,2%). Quase metade das UBS (51,6%) não desenvolve ações explícitas de promoção da equidade de gênero, orientação sexual ou combate ao racismo.
Territorialização, promoção da saúde, vigilância em saúde e controle social
Os resultados indicam que a maioria das UBS (85,4%) têm área de abrangência definida e que pouco mais da metade (59,9%) utiliza critérios de vulnerabilidade e risco para estratificar sua população.
Práticas intersetoriais de promoção da saúde, especialmente em escolas, creches e igrejas, são frequentes (78,4%), assim como ações educativas sobre alimentação saudável (75,8%).
Por outro lado, a oferta regular de atividades físicas no território permanece limitada (44,2%). Já a articulação com os setores de vigilância em saúde é predominante (71,9%), com altas taxas (91,9%) de notificação compulsória e de investigação de agravos prioritários, incluindo sífilis em gestantes e óbitos maternos (86,8%), além do monitoramento rotineiro da situação vacinal da comunidade (90,5%).
Os dados do Censo Nacional das Unidades Básicas de Saúde (Censo das UBS 2024) foram apresentados e debatidos em seminário transmitido pela TV Abrasco.
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