Condição juvenil na América Latina é tema da ‘Ciência e Saúde Coletiva’ de julho
Desde a primeira década dos anos 2000, a condição juvenil vem sendo refletida em inúmeros diagnósticos e pesquisas na América Latina, buscando subsidiar políticas públicas com foco no grupo dos 15 aos 29 anos, no caso brasileiro. As pesquisadoras da ENSP, Edinilsa Ramos de Souza e Kathie Njaine, entre outros que assinam o editorial da revista Ciência & Saúde Coletiva de julho, afirmam que as formas de existir, (re)produzir a vida e obter acesso e oportunidades dos jovens são heterogêneas e balizadas pelo cenário social e territorial no qual se inserem, caracterizado por condições materiais, relações de gênero, padrões sexuais e pertencimentos étnico-raciais.
Assim, continua o editorial, temas referentes à saúde, à educação, ao mundo do trabalho, à cultura, à segurança pública, à diversidade sexual e à participação social e política, problematizam as representações correntes sobre o significado de ser jovem na contemporaneidade, considerando as especificidades dos contextos em que se desenvolvem as distintas trajetórias juvenis.
Por meio deste número temático, a revista objetiva estimular o debate sobre aspectos que abordam a relação entre condição juvenil contemporânea e saúde nos países latino-americanos. “Tal iniciativa resulta dos esforços da Agenda Jovem Fiocruz, uma plataforma colaborativa da Fiocruz, na produção de insumos conceituais e metodológicos para formulação de políticas dirigidas à juventude com enfoque na saúde.” As questões trazidas pelos 25 artigos mapeiam preocupações correntes, como: análises epidemiológicas e socioantropológicas sobre agravos em saúde que acometem os jovens; violências; avaliações de serviços de atenção à população juvenil e estudos sobre fenômenos contemporâneos, como os efeitos do uso de tecnologias de informação e comunicação.
Segundo o editorial, o conjunto dos trabalhos reunidos ilustra a contribuição e o potencial do campo da saúde para as políticas públicas voltadas à juventude e faz um convite ao diálogo intersetorial e multidisciplinar. “Visa ampliar as abordagens históricas sobre a adolescência nas pesquisas em saúde, com enfoque nos fatores de risco e/ou proteção dos comportamentos, na educação para a saúde e situações de vulnerabilidade”.
Os editorialistas atentam, portanto, para temas que interpelam fortemente a saúde da juventude, como as múltiplas expressões de violências, a saúde de jovens que ocupam trabalhos informais e precarizados, a interseccionalidade de gênero, raça e classe, assim como os ativismos juvenis contemporâneos para além da noção reificada de protagonismo juvenil.
Por fim, o número temático foi produzido em meio à pandemia de Covid-19 que descortinou uma situação de dramática vulnerabilidade para uma parcela significativa de jovens. “A necessidade de sobrevivência, os desafios para a educação de jovens e o aumento da pobreza e da fome, ilustram como o campo da saúde pode dizer muito mais a respeito da condição juvenil contemporânea”.
Dentre os vários artigos disponíveis, constam os produzidos com participação de pesquisadores da ENSP:
Triplo tabu: sobre o suicídio na infância e na adolescência, de Maria Cecília de Souza Minayo e Orli Carvalho da Silva Filho, pretende compreender a construção e a repercussão dos tabus que envolvem o suicídio de crianças e adolescentes, considerando o incômodo, o silêncio e o pavor que esse tema provoca em toda a sociedade. Diante do reconhecimento de um continuum de tabus (tabu da morte < tabu do suicídio < tabu do suicídio infanto juvenil), propôs-se, como tentativa de clarificar essa questão, o conceito de um triplo tabu, valorizando a incomensurabilidade das mortes autoprovocadas que têm as crianças e os adolescentes como protagonistas. Tendo sido desenvolvido a partir de um estudo qualitativo com pediatras em formação, este documento se configura como um chamado aos profissionais que assistem crianças e adolescentes no país. É preciso que a formação pediátrica reconheça esses tabus e as dimensões do comportamento suicida como uma manifestação de violência e um agravo à saúde mental, identificando-o como um elemento crítico e urgente na assistência contemporânea a crianças e adolescentes.
Mediação artística e saúde coletiva: uma análise psicossocial da experiência de jovens rappers brasileiros e franceses, de Ana de Santa Cecilia Massa, discute os resultados de uma pesquisa-intervenção fundamentada na abordagem psicossocial clinica realizada junto a jovens rappers brasileiros e franceses, entre 13 e 27 anos, com objetivo de analisar a função do rap, como mediação artistica, para os jovens moradores de espaços urbanos desfavorecidos. A pesquisa de campo foi realizada a partir de observação participante e entrevistas nos dois pai?ses, entre outubro de 2007 e junho de 2009. As análises mostram que o rap é utilizado pelos jovens para pensar sobre o mundo que os rodeia e para agir sobre as representações e o imaginário social negativos aos quais são associados, buscando o reconhecimento de um lugar positivo na sociedade. Através desta expressão artistica podem realizar novas experiências sociais e subjetivas na cena social. O rap é também um suporte para constituição de grupos de pares e para construção de laços sociais entre jovens moradores de diferentes periferias do globo. Buscamos, assim, contribuir para discussão em torno da dimensão coletiva e singular de práticas de saúde, constitutivas de uma clinica que não se limita à procedimentos técnicos padronizados ou aos conhecimentos cientificos de base biológica.
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Foto: Agência Brasil
Fonte: Ciência e Saúde Coletiva
Divulgação Científica



