Pesquisadores de diferentes países compartilham experiências na vigilância dos expostos ao amianto
Por Barbara Souza
Experiências internacionais sobre a vigilância de pessoas expostas ao amianto foram compartilhadas nesta terça-feira (8/4), no auditório da ENSP/Fiocruz. O evento foi organizado pela Escola em parceria com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea). Intitulado IV Seminário Internacional de Vigilância dos Expostos ao Amianto: Uma Abordagem Interdisciplinar sobre a Saúde, Trabalho e o Ambiente, o encontro contou com palestras de sete convidados. Eles apresentaram o cenário do uso do mineral em países como Índia, Itália, Colômbia e Austrália, destacando os prejuízos à saúde. A mesa foi coordenada pela procuradora do MPT Aline Zerwes Bottari Brasil e está disponível na íntegra no canal da ENSP no YouTube. Assista!
Realizado entre 8 e 9 de abril, o evento contou ainda com a participação de técnicos, lideranças das associações de vítimas, trabalhadores, membros da ABREA/RJ, do MPT e do MPF, além de peritos do MPT. Entre as discussões, destacaram-se os riscos da exposição ao amianto, tanto nos ambientes de trabalho, como no meio ambiente. As principais doenças associadas à exposição ao amianto incluem o mesotelioma — um tipo raro de câncer quase exclusivamente ligado ao mineral — além de asbestose (doença pulmonar crônica) e outros tipos de câncer, como de pulmão, laringe e ovário. A maioria das mortes ocorre décadas após a exposição, devido ao longo período de latência. Apesar de proibido em mais de 70 países, o amianto ainda é utilizado. Também chamado de asbesto, é um mineral natural formado por fibras muito finas e resistentes, usado na construção civil, no setor automotivo e em outras áreas industriais.
Quem abriu as apresentações foi o pesquisador estadunidense Arthur Frank, da Universidade de Drexel. Phd em medicina ocupacional, ele estuda questões relacionadas ao amianto ao redor do mundo há mais de 50 anos. Em sua palestra, o convidado focou na situação da Índia, onde a situação é complexa e preocupante. O país asiático ainda permite o uso do amianto branco, a crisotila, e é o principal importador do produto no mundo. “A Índia, como a maioria dos outros países, não treina bem os médicos em relação à saúde ocupacional ou ambiental”, alertou Frank.
Pesquisadora de Antropologia da saúde e dos movimentos sociais e investigadora o impacto social da exposição ao amianto na Itália e no Brasil, Mazeo falou sobre a importância das redes de trabalho formadas por diferentes atores da sociedade e afirmou que “uma vigilância eficaz dos expostos segue necessariamente uma abordagem participativa transdisciplinar, numa perspectiva global”. Ela defendeu que práticas de ativismo são práticas de “cura e de vigilância” pela mobilização: “é assim que os direitos à saúde se tornam concretos”.
Também da Itália, o palestrante Corrado Magnani, da Universidade do Piemonte Oriental Amedeo Avogadro participou remotamente do evento. Ele abordou Epidemiologia e Prevenção a partir do exemplo de Casale Monferrato. Esse é um dos casos mais emblemáticos do mundo quando o assunto são os efeitos devastadores do amianto. A cidade italiana de 40 mil habitantes tornou-se símbolo internacional da luta por justiça ambiental e sanitária após a fábrica Eternit expor, por décadas, trabalhadores e moradores à fibra tóxica. A região registrou milhares de mortes por doenças como o mesotelioma. O caso gerou processos judiciais de grande repercussão contra ex-diretores da empresa e mobilizou a população em busca de reparação. Hoje, Casale é referência na luta contra o amianto, promovendo conscientização, apoio às vítimas e debates sobre saúde ambiental.
As discussões seguiram com a participação dos representantes dos Instituto de Pesquisa sobre Doenças por Amianto e Poeira (ADDRI), Matthew Peters e Catherine Jones. Peters é professor de Medicina Respiratória e ex-presidente da Sociedade de Pneumologia da Austrália da Nova Zelândia, enquanto Jones é professora radiologista consultora no I-MED e professora adjunta na Universidade de Sydney. Eles compartilharam a experiência australiana de vigilância dos expostos ao amianto. Um dos pontos abordados foi sobre Wittenoom, cidade-fantasma conhecida um dos casos mais trágicos relacionados à mineração de amianto azul (crocidolita) no mundo.
O governo australiano desativou oficialmente a cidade na década de 2000. Inclusive, Wittenoom foi removida do mapa oficialmente, e os últimos prédios remanescentes foram demolidos. Hoje, é considerada uma zona altamente contaminada e perigosa, com acesso restrito. A cidade é lembrada como um alerta global sobre os perigos do amianto e a negligência industrial com a saúde humana. O caso gerou inúmeras ações judiciais, mudanças em políticas públicas e aumentou a fiscalização sobre o uso de materiais tóxicos.
A palestra “Desafios após a proibição do amianto: a experiência colombiana”, do diretor da Fundação Colômbia Livre de Amianto – FundClas, Guillermo Villamizar, encerrou a mesa. Villamizar é artista visual colombiano e ex-crítico de arte. O trabalho da FundClas resultou na proibição do amianto na Colômbia em 2019. Ele compartilhou sua vivência e contou como tem sido, desde 2012, trabalhar com a identificação de processos que definam as políticas públicas para combate ao amianto no seu país.
Entre os principais resultados da atuação da FundClas estão a participação na elaboração de uma guia nacional de boas práticas para o manejo seguro de materiais com amianto, a organização de eventos e conferências sobre os desafios pós-proibição, e o envolvimento ativo em campanhas e pesquisas que contribuíram para a proibição do amianto na Colômbia. As ações também buscam conscientizar a população e apoiar a implementação de medidas protetivas à saúde pública.
As palestras estão disponíveis na íntegra no canal da ENSP no YouTube. Acesse e conheça diferentes perspectivas globais sobre os impactos do amianto e os caminhos para sua eliminação.
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