Simpósio Internacional debate cenário das novas substâncias psicoativas
O Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz) realizou o 'Simpósio Internacional Opioides e Novas Substâncias Psicoativas: Desafios para a Política de Drogas'. O evento discutiu a crescente preocupação da saúde pública no Brasil em relação ao aumento do uso de Novas Substâncias Psicoativas (NSPs), reunindo especialistas nacionais e internacionais que apresentaram experiências e discutiram estratégias para o desenvolvimento de políticas públicas eficazes e inclusivas frente ao complexo cenário das drogas. Parte do Programa Institucional sobre Política de Drogas, Direitos Humanos e Saúde Mental da Fiocruz, o seminário destacou a importância da implementação de estratégias de redução de riscos e danos.
Na abertura do evento, realizado na última quinta-feira (21/11), a coordenadora do Laps/ENSP e do Programa Institucional, Ana Paula Guljor, iniciou a atividade contando brevemente a história do Programa na Fiocruz, que existe há mais de dez anos, e sua missão de construir um diálogo permanente com a sociedade. Segundo ela, a estratégia do programa é estabelecer um diálogo com a comunidade científica e com a sociedade. "A função da Fiocruz é lançar luz sobre esse debate, com o principal objetivo de construir políticas públicas efetivas", afirmou.
Vice-diretora de Pesquisa e Inovação da ENSP, Luciana Dias de Lima, e coordenadora do Laps/ENSP e do Programa Institucional, Ana Paula Guljor, durante abertura do evento.
A vice-diretora de Pesquisa e Inovação da ENSP, Luciana Dias de Lima, representou o diretor da Escola, Marco Menezes, no evento. Para ela, o evento foi uma oportunidade crucial para discutir questões que afetam a saúde pública e os sistemas de saúde globalmente. Luciana também citou os desafios que alguns fenômenos impõem aos sistemas de saúde, mencionando dados alarmantes do Relatório Mundial sobre Drogas, como mais de 110 mil óbitos anuais e mais de 950 Novas Substâncias Psicoativas identificadas.
Opioides e NSPs: contribuições sobre o cenário emergente no Brasil
Maria Angélica Comis trouxe reflexões sobre o cenário das NSPs no Brasil, abordando a prevalência e o conceito de uso de metanfetamina e canabinoides, duas classes de substâncias psicoativas que têm moldado os desafios contemporâneos. Ela explicou que a metanfetamina tem ganhado espaço nas grandes metrópoles. Conhecida como "cristal", a droga sintética tem seu uso ainda pouco disseminado no Brasil, mas seu uso recreativo está associado a práticas de "Chemsex", ou sexo químico, termo utilizado para o consumo de substâncias psicoativas durante o ato sexual. Angélica destacou o aumento de notificações de intoxicação e a falta de dados epidemiológicos.
Sobre os canabinoides sintéticos, ela alertou que o uso dessas substâncias pode induzir quadros psicóticos. "Essas drogas são vendidas como maconha sintética, imitando os efeitos do THC, mas essa não é a realidade. Elas estão muito associadas a comunidades vulneráveis e pessoas privadas de liberdade. No contexto de uso, os canabinoides sintéticos são consumidos por pessoas de classes sociais mais baixas, enquanto a metanfetamina é mais utilizada por pessoas mais ricas. Por isso, é importante fortalecer a formação dos profissionais de saúde e ampliar as estratégias de redução de danos. Precisamos construir respostas rápidas e eficazes", defendeu ela.
A psiquiatra Camila Magalhães, da USP, abordou o tema a partir dos determinantes sociais da saúde, destacando o uso de substâncias baratas e de fácil acesso. Segundo ela, o Brasil está entre os cinco países do mundo com maior prevalência de depressão. "Nas populações com maiores índices de privação social, esses números são ainda mais alarmantes, chegando a ser seis vezes maiores quando associados ao uso de drogas", advertiu, ressaltando a influência dos determinantes sociais nesse contexto.
No âmbito das novas drogas sintéticas, Camila mencionou que mais de 290 milhões de pessoas consomem drogas no mundo, e o Brasil tem apresentado um aumento contínuo nesse cenário. Por fim, ela apresentou dados de uma pesquisa realizada na USP, na qual 75% dos 145 atendimentos analisados relataram o uso de pelo menos uma substância psicoativa.
O professor da Unicamp, José Luiz Costa, apresentou o Centro de Informação e Assistência Toxicológica (CIATox), da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, que oferece assistência, ensino, pesquisa e extensão na área de toxicologia. Costa abordou o gráfico de atendimentos do CIATox, que, de modo geral, atende casos mais leves, mas que, com o novo cenário das NSPs, está mudando. Ele relatou o atendimento de casos de intoxicação por fentanil, além de intoxicação por metanol. "É necessário viabilizar a testagem para informar os usuários sobre o tipo de substância que estão consumindo. Por isso, é preciso debater a regulamentação para ter controle sobre o que está sendo usado", defendeu ele.
Encerrando o painel, a coordenadora do CAPS-AD Heleno de Freitas, Vânia Nogueira, falou sobre a atuação do centro, ressaltando que o álcool ainda é a droga mais prevalente nos atendimentos do CAPS-AD. Ela apresentou o perfil dos usuários do serviço e as principais drogas utilizadas, especialmente entre a população adulta de 18 a 30 anos, que frequentemente relata o uso recreativo. Vânia destacou a importância de estratégias de redução de danos e de intervenções socioeducativas nos serviços da Rede de Assistência.
O cenário internacional das Novas Substâncias Psicoativas
Kellen Russoniello, diretor da DPA, apresentou as estratégias de saúde pública e políticas de drogas nos Estados Unidos. Ele iniciou destacando que 60% das pessoas em situação de rua no país consomem drogas. Russoniello afirmou que as leis de drogas no EUA visam o controle social baseado no racismo, apontando as disparidades raciais no país. Ele mencionou que 1 milhão de pessoas são presas anualmente nos EUA, sendo 90% por porte de drogas. Em seguida, ele discutiu a entrada do fentanil no mercado dos EUA e suas quatro ondas.
Russoniello lamentou que os EUA não possuam um sistema universal de saúde como o Brasil, o que dificulta ainda mais a abordagem das drogas como um problema de saúde pública. No país, o tratamento ainda é focado na droga, e não na pessoa em si. Por fim, o diretor da DPA apresentou o mapa de acesso à metadona nos EUA e as disparidades raciais nesse acesso. Ele também citou o programa de distribuição de seringas, destacando que esses programas salvam vidas e reduzem os riscos associados ao uso de drogas.
O diretor da ATS, Julian Quintero, discutiu a experiência latino-americana no enfrentamento dos desafios das novas substâncias psicoativas. Ele apresentou a ATS, que trabalha nas áreas de saúde pública e direitos humanos, e compartilhou alguns dos projetos da organização. Quintero afirmou que, na Colômbia, a guerra às drogas está perdida, mencionando que mais de 800 substâncias estão registradas e mais de 260 mil consumidores estão espalhados pelo mundo. Somente na Colômbia, em 2024, foram identificadas 59 NSPs. Ele também apresentou o Observatório de Drogas da Colômbia, que tem como maior sucesso o monitoramento de substâncias. Por fim, Quintero destacou as preocupações com as novas substâncias no país e sugeriu recomendações para enfrentar esse desafio.
Assista ao Simpósio na íntegra no YouTube!
Manhã:
Tarde:
Nenhum comentário para: Simpósio Internacional debate cenário das novas substâncias psicoativas
Comente essa matéria: