Evento na ENSP/Fiocruz apresenta resultados iniciais do projeto 'Prisões TB Zero'
A Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca realizou, no dia 5 de dezembro, o 1º Seminário do Projeto 'Prisões TB Zero’ para discutir os resultados da primeira fase do projeto (rastreamento radiológico de massa) coordenado pela pesquisadora do Departamento de Endemias da ENSP/Fiocruz, Alexandra Sánchez. Desenvolvido através de ampla parceria com a SEAP-RJ, SMS-RJ, SES-RJ, e a ONG EuSouEu, o MPRJ, a DPRJ e FPSSP-RJ, o projeto, iniciado em julho 2024, é financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Departamento de HIV/AIDS, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, e Departamento de Ciência e Tecnologia (DECIT/MS).
O evento contou com a participação de aproximadamente 60 pessoas, entre gestores das instituições parceiras, equipes de atenção primária prisional (SMS-RJ) e do Programa de Controle da TB da SEAP-RJ, dentre outros.
Segundo Alexandra, 'Prisões TB Zero' é um marco no controle da tuberculose nas prisões do Brasil pois introduz, na rotina dos serviços de saúde intramuros, a tecnologia mais moderna que há no mundo para o rastreamento radiológico sistemático anual de casos de tuberculose, que é a inteligência artificial. O rastreamento radiológico anual, associado ao exame sistemático de ingressantes e ao teste rápido molecular (TRM-TB), já disponível, representam a tecnologia de ponta capaz de reduzir de forma importante a carga da tuberculose neste ambiente hiperendêmico.
Cenário preocupante da TB nas prisões
A situação da tuberculose nas prisões do estado do Rio de Janeiro é alarmante com taxas de incidência muito superior à da população em geral: 70 vezes superior à taxa nacional. O risco de morte por tuberculose é 11 vezes maior que entre a população privada de liberdade quando comparada a da população geral masculina do estado. A tuberculose nas prisões do Rio de Janeiro é uma questão prioritária para as autoridades de saúde e para os pesquisadores, especialmente para o Grupo de Pesquisa ‘Saúde nas Prisões’ do CNPq, liderado por Alexandra Sánchez. “O Projeto 'Prisões TB Zero' visa trazer inovações tecnológicas para o controle da tuberculose nas prisões, utilizando Inteligência Artificial (IA) e estimulando a expansão da oferta do teste rápido para diagnóstico da tuberculose (TRM-TB) e da cultura para BK”, explicou a pesquisadora.
Avanços tecnológicos no rastreamento
O objetivo do programa é demonstrar que é possível controlar a tuberculose nas prisões através de uma combinação de detecção passiva de casos, rastreamento radiológico anual para a população já encarcerada e exame radiológico sistemático de ingressantes. De acordo com Alexandra Sánchez, a incorporação da IA para interpretação de imagens radiológicas tem se mostrado um avanço significativo. Essa tecnologia é recomendada pelo Ministério da Saúde desde 2011, com base no trabalho da ENSP/Fiocruz, recentemente passou a ser adotada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como parte da agenda 2030 para reduzir a incidência de tuberculose a 10 casos por 100.000 habitantes por ano.
“Nos presídios do Rio de Janeiro, a incidência de tuberculose é 2.685 por 100.000 PPL, o que torna a aplicação do rastreamento radiológico sistemático uma prioridade. A IA permite identificar anomalias radiológicas sugestivas de tuberculose, mesmo em casos assintomáticos, facilitando a detecção de pessoas que de outra forma não seriam diagnosticadas”, explicou a coordenadora da pesquisa.
Resultados preliminares revelam grave situação da TB em unidades prisionais
O estudo, que está sendo realizado em unidades prisionais do Rio de Janeiro, inclui um exame radiológico de todos os presos ingressantes e um rastreamento radiológico anual sistemático durante três anos. Os primeiros resultados revelaram uma situação grave: na unidade prisional que abriga cerca de 1.500 presos, 1 em cada 5 tem histórico de tuberculose e 5% estão em tratamento e 15 a cada 100 homens presos tem a tuberculose ativa.
“Contudo, o rastreamento radiológico sistemático revelou que a prevalência real de tuberculose é de 15%, ou seja, três vezes mais do que os 5% identificados na rotina. Chama atenção que a maioria dos doentes identificados pelo rastreamento radiológico não se sentia doente, e quase dois terços negaram ter tosse. Isso explica a baixa detecção a partir da demanda espontânea e de rastreamentos baseados na existência de sintomas ”, mencionou a pesquisadora.
Desafios e parcerias no projeto
Além de dimensionar a situação e a efetividade dessa nova estratégia de controle de TB, o projeto visa demonstrar a exequibilidade dessas intervenções no cotidiano prisional. “Para isso, a colaboração com os serviços de segurança e saúde prisionais foi essencial. O serviço de segurança organizou o acesso dos presos à equipe do projeto, garantindo a realização de entrevistas, radiografias e coleta de escarro. O rastreamento, com exame de toda a população da unidade prisional foi concluído em apenas 20 dias, graças ao esforço conjunto das equipes da Fiocruz, equipe de atenção primária prisiona/SMS-RJ (e-APP), SEAP e SES”, detalhou a coordenadora.
Para a e-APP da unidade estudada, representada pela psicóloga Veridiana Santana e a médica Ana Caroline Souza, apesar das dificuldades iniciais, com necessidade de adequação da rotina da e-APP, os resultados foram amplamente positivos. A integração do rastreamento nas atividades da equipe proporcionou avanços como: qualificação dos dados cadastrais nos prontuários médicos; atendimento individualizado para queixas dos presos; realização de exames rápidos e de imagem, além de avaliação pneumológica; aumento da eficácia do rastreamento e diagnóstico precoce, com melhores índices de confirmação laboratorial; detecção e tratamento de casos positivos para HIV, sífilis e hepatites B e C; além de melhora na adesão ao tratamento e redução do abandono terapêutico.
“Um dos maiores sucessos do programa foi o aumento de 165,5% no número de casos de tuberculose identificados, que passou de 197 para 523 casos de janeiro a outubro de 2023, ao mesmo período de 2024. Esse aumento não só evidenciou a importância do rastreamento radiológico sistemático, como também a boa aceitação do projeto pelos reclusos, com nenhuma recusa ao rastreio nem para tratamento”, mencionaram.
O 1º Seminário do Projeto 'Prisões TB Zero’, realizado na ENSP/Fiocruz, em 5/12, discutiu os resultados da primeira fase do projeto de rastreamento radiológico de massa para TB em prisões do Rio de Janeiro.
Pesquisa reforça importância da ampliação de estratégias de rastreamento e tratamento de TB nas prisões
Por fim, a pesquisadora Alexandra Sánchez apontou a importância das parcerias para o desenvolvimento do projeto e ressaltou a necessidade de incorporação de tecnologia de ponta para o controle da tuberculose nas prisões, como a inteligência artificial (IA) para interpretação das imagens.
"O rastreamento radiológico anual utilizando IA e TRM-TB para confirmação diagnóstica possibilita rapidez no diagnóstico, maior efetividade da busca ativa e utilização mais racional do TRM-TB. O acesso à essa tecnologia é imprescindível para detecção de casos assintomáticos, para a redução da transmissão intrainstitucional da tuberculose, com importante impacto nas taxas de tuberculose. Tem demonstrado que é possível sua incorporação na rotina dos serviços de saúde prisional e a efetividade da estratégia será comprovada nos próximos anos. Ressalta ainda a importância da incorporação de inovações tecnológicas para otimizar a detecção da doença nas prisões, concluiu ela.
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