O conteúdo desse portal pode ser acessível em Libras usando o VLibras
Busca do site
menu

Dia Mundial da Conscientização sobre o Autismo: Alerta sobre uso de eletrochoque

ícone facebook
Publicado em:04/04/2022

Apesar do Dia Mundial da Conscientização sobre o Autismo, 2/4, ter sido estabelecido em 2007 com o objetivo de difundir informações para a população sobre o transtorno e assim reduzir a discriminação e o preconceito que cercam as pessoas afetadas pelo transtorno, ainda há muito a caminhar. O autismo é um transtorno crônico, mas que conta com esquemas de tratamento que devem ser introduzidos tão logo seja feito o diagnóstico e aplicados por equipe multidisciplinar. Envolve a intervenção de médicos, psicólogos, fonoaudiólogos, pedagogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e educadores físicos, além da imprescindível orientação aos pais ou cuidadores. É altamente recomendado que uma equipe multidisciplinar avalie e desenvolva um programa de intervenção personalizado, pois nenhuma pessoa com autismo é igual a outra. Num artigo publicado na revista Radis, Flavia Neves,  escritora, educadora e empreendedora, que é autista, faz um grave relato sobre o uso de eletrochoque em autistas. Confira!     

                                                             
“Em dezembro de 2021, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) propôs uma nota técnica que inclui a eletroconvulsoterapia (ECT) como tratamento da agressividade no transtorno do espectro autista, o que provocou reação de diversas instituições e grupos da sociedade civil organizada.


Marcia Baratto, doutora em ciência política pela Unicamp, especialista em direitos humanos e coordenadora geral da Rede Europeia de Apoio às Vítimas Brasileiras de Violência Doméstica (Revibra), vê o encaminhamento da pauta da ECT com preocupação, especialmente quanto à rigidez com que o direito regula aquilo que a justiça considera ou não desumano. Ela alerta que hoje vale, infelizmente, o entendimento de que se o paciente foi avisado dos efeitos colaterais e consentiu, não é tratamento desumano, nem tortura.


A exata natureza do consentimento precisa ser amplamente debatida, se realmente queremos intervenções em saúde alinhadas a princípios éticos. É o que mostra um dos casos mais emblemáticos de uso da ECT, retratado no filme “Um estranho no ninho”, com Jack Nicholson, em que a paciente foi submetida a 21 sessões em um ano — “quase o dobro do recomendado”, conforme matéria do Mail Online, em julho de 2020.


Em uma das internações psiquiátricas pelas quais passei, conheci a psicóloga Valéria (nome fictício), uma mulher com diagnóstico de depressão maior. Ela contou que, em 2019, numa clínica de elite de uma das maiores capitais do país, foi submetida a 21 sessões de ECT, no período de três meses. As sessões, que ela aceitou fazer “por puro desespero”, ocorriam sob monitorização cardíaca e respiratória, em uma sala com o médico responsável, uma médica anestesista, um auxiliar de enfermagem e a mãe da paciente. Em dado momento, o médico responsável disse que ela deveria ser acompanhada por um profissional “que entendesse de ECT”, já que o psiquiatra dela supostamente não entendia.


Valéria amarga terríveis efeitos colaterais. Cita problemas cognitivos em esferas como atenção, percepção e memória, chegando a passar meses sem conseguir manter o foco ou um raciocínio coerente ao conversar. É recorrente que não consiga se lembrar de pessoas e acontecimentos importantes de períodos muito anteriores à ECT: “sinto como se parte de minha vida — e de mim mesma, portanto — tivesse sido retirada”. A questão, entretanto, não tem sido vista de forma humanizada. Marcia Baratto diz que, infelizmente, são raras as vezes em que a perda parcial de memória é classificada como “efeito severo” da ECT.


A interrupção das sessões, no caso de Valéria, deu-se a pedido da própria paciente, já que o médico queria continuar. Ela conta que se ressente por não terem oferecido o tratamento fitoterápico com Cannabis antes de passar por 21 sessões de eletrochoque até que ela mesma — “quem menos tinha condição de decidir algo nessa história” — desse um basta. Ela teve muitos prejuízos cognitivos e não concorda com a imposição dessa abordagem sobre ninguém.


Se uma mulher adulta e formada em psicologia não se sentia apta a decidir sobre a ECT em seu momento de sofrimento, o que dizer de pessoas autistas e suas famílias, muitas vezes abandonadas à própria sorte, dada a generalizada falta de suporte e políticas públicas para pessoas com deficiência?


Quando se trata, sobretudo, de autistas não oralizados e sem acesso à comunicação alternativa, a questão do consentimento requer um olhar ainda mais criterioso e não pode ser delegada à família ou aos responsáveis antes de uma análise do que é realmente consentir, quais os verdadeiros riscos de uma intervenção e qual o limite recomendado. Muito menos antes que se esgotem opções de intervenção não invasivas e não controversas, como a integração sensorial e as adaptações ambientais, por exemplo.


Em mais uma ação de desmonte da Reforma Psiquiátrica empreendida pelo atual governo, há risco flagrante de violação dos direitos humanos dos autistas, tendo em vista principalmente a peculiaridade do consentimento quando há barreiras de comunicação, nos termos da Lei Brasileira de Inclusão. Além disso, ao nos excluir da formulação de suas recomendações, a Conitec viola a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.


Não fosse o bastante, a nota técnica sequer menciona o consentimento, configurando-se como violência do Estado contra pessoas que deveriam ser protegidas por políticas públicas alinhadas aos direitos humanos, conforme nota da Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas Autistas (Abraça).


Não pode haver respeito aos direitos humanos sem a possibilidade do pleno consentimento. Se não sabemos o que é isso, devemos, em comunidade, descobrir.”


Sobre o autismo



Os transtornos do espectro autista (TEAs) aparecem na infância e tendem a persistir na adolescência e na idade adulta. Na maioria dos casos, eles se manifestam nos primeiros 5 anos de vida. As pessoas afetadas pelos TEAs frequentemente têm condições comórbidas, como epilepsia, depressão, ansiedade e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. O nível intelectual varia muito de um caso para outro, variando de deterioração profunda a casos com altas habilidades cognitivas.


Embora algumas pessoas com TEAs possam viver de forma independente, existem outras com deficiências severas que precisam de atenção e apoio constante ao longo de suas vidas. As intervenções psicossociais baseadas em evidência, tais como terapia comportamental e programas de treinamento para pais, podem reduzir as dificuldades de comunicação e de comportamento social e ter um impacto positivo no bem-estar e na qualidade de vida de pessoas com TEAs e seus cuidadores. As intervenções voltadas para pessoas com TEAs devem ser acompanhadas de atitudes e medidas amplas que garantam que os ambientes físicos e sociais sejam acessíveis, inclusivos e acolhedores.

Sintomas


De acordo com o quadro clínico, os sintomas podem ser divididos em 3 grupos:


– ausência completa de qualquer contato interpessoal, incapacidade de aprender a falar, incidência de movimentos estereotipados e repetitivos, deficiência mental;
– o paciente é voltado para si mesmo, não estabelece contato visual com as pessoas nem com o ambiente; consegue falar, mas não usa a fala como ferramenta de comunicação (chega a repetir frases inteiras fora do contexto) e tem comprometimento da compreensão;
– domínio da linguagem, inteligência normal ou até superior, menor dificuldade de interação social que permite levar a vida próxima do normal.


Fontes:


Associação de Amigos do Autista
Blog da Saúde do Ministério da Saúde
Lei nº 12.764/2.012, institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista


Fonte: Radis
Seções Relacionadas:
Efemérides Radis

Nenhum comentário para: Dia Mundial da Conscientização sobre o Autismo: Alerta sobre uso de eletrochoque
Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga. Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga.