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Pesquisadoras brasileiras publicam artigo na revista científica British Medical Journal Global Health

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Publicado em:16/03/2022
O onasemnogeno abeparvoveque – utilizado para o tratamento de atrofia muscular espinhal (AME) – foi registrado no Brasil em agosto de 2020. Frente à ausência de evidências robustas que subsidiassem o benefício terapêutico adicional sobre as alternativas já existentes e incertezas sobre sua segurança e sua efetividade a longo prazo, a autoridade que regula os preços no País aprovou um preço máximo 77% menor que o pretendido pela empresa detentora do registro. Em artigo publicado na BMJ Global Health, pesquisadores fazem uma reflexão sobre a saga do medicamento mais caro do mundo, e chamam atenção para precificação dos medicamentos no Brasil como política pública no contexto da saúde. Vera Pepe, pesquisadora da ENSP/Fiocruz, é uma das autoras.

Antes mesmo de estar à venda em farmácias brasileiras, o Ministério da Saúde já havia gasto até outubro de 2021 mais de R$ 430 milhões para custear, por meio de judicialização, 46 tratamentos de onasemnogeno abeparvoveque comprados no exterior pelos pacientes, ao preço médio de R$ 9 milhões cada dose, acima inclusive do preço máximo agora estipulado. Este montante teria sido mais que suficiente para tratar todos os bebes nascidos com AME tipo 1 no Brasil em um ano pelo preço máximo de venda ao governo (PMVG) inicialmente autorizado. Dados recentes divulgados pelo Ministério da Saúde indicam que este montante já chega a mais de R$ 715 milhões, tendo financiado o tratamento de 75 pacientes. Isto porque a detentora do registro recorreu da decisão sobre o preço autorizado e decidiu não comercializar o medicamento no país pelo preço autorizado.

“O caso do onasemnogeno abeparvoveque no Brasil chama a atenção para o abismo crescente entre a promessa de inovação em saúde e o acesso por aqueles que dela necessitam, em sistemas de saúde com restrições orçamentárias”, afirma a pesquisadora brasileira Adriana Ivama-Brummell, uma das autoras de artigo sobre o tema recém-publicado na revista científica British Medical Journal Global Health, considerada uma das mais influentes e conceituadas publicações sobre medicina do mundo. Com pós-doutorado na London School of Economics and Political Science, Adriana é servidora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e atua na Secretaria Executiva da Câmara de Regulação de Medicamentos.

A pesquisadora Vera Pepe, uma das autoras, comenta ainda sobre a relevância do debate que traz à tona no artigo. “O direito à saúde é uma conquista importante no Brasil. É preciso garantir o atendimento adequado a quem precisa. No entanto, essa situação impõe à sociedade o ônus de financiar um novo medicamento sem evidências robustas a um preço excessivo e pouco transparente, e cujo desenvolvimento beneficiou-se de considerável financiamento público. Especialistas argumentam que os contribuintes estão pagando em dobro: primeiro pelo financiamento público da pesquisa e, segundo, pelo alto lucro das empresas farmacêuticas com seus medicamentos.” Vera Lúcia Edais Pepe, é pesquisadora na área de Vigilância Sanitária e Avaliação em Saúde, especialmente em avaliação de serviços e tecnologias de saúde e demandas judiciais em saúde da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Participam também do artigo os pesquisadores Anita Wagner da Universidade de Harvard e Huseyin Naci da London School of Economics and Political Science.

“É extremamente importante chamar a atenção da sociedade sobre o significado da precificação de medicamentos no Brasil como política pública, implementada há quase 20 anos, que utiliza metodologias validadas e segue recomendações internacionais. Outros países tiveram conclusões semelhantes ao analisar as evidências limitadas e recomendaram a redução de preços do medicamento entre 50 e 90%”, explica Adriana Ivama-Brummell.

De acordo com as pesquisadoras, “infelizmente, poucas pessoas conhecem como são definidos os preços dos medicamentos e sua importância para a saúde pública e para as empresas, gerando previsibilidade, uma vez que as regras são claramente estabelecidas e os preços são públicos. Existe certamente a possibilidade de aperfeiçoamento das regras e este é um processo que deve ser realizado com ampla participação da sociedade”.

Para Adriana, “o debate é ainda mais relevante se considerarmos que no Brasil mais de 70% da população brasileira depende exclusivamente do Sistema Único de Saúde e 87,7% do gasto total com medicamentos e artigos médicos no país são financiados por gastos diretos do bolso das famílias. Isto ressalta a importância da regulação de preços de medicamentos no Brasil e de que os recursos destinados ao SUS sejam bem utilizados”.

No início de março, foi publicada a decisão do governo federal que, mesmo reconhecendo a ausência de benefício terapêutico adicional, aprovou o aumento de R$ 2,9 milhões para R$ 6,5 milhões do preço máximo de venda no Brasil do Zolgensma®, nome comercial do onasemnogeno abeparvoveque, da farmacêutica suíça Novartis.  A empresa não comercializou o medicamento no País até  março de 2022, tendo anunciado que o fará em 08 de março de 2022, após a revisão do preço máximo do medicamento por parte do governo federal.

Os autores do artigo concluem chamando a atenção de que “os desdobramentos desta saga do onasemnogeno abeparvoveque nos fazem lembrar que a regulação e a precificação de medicamentos estão na intersecção de valores sociais, ciência, cultura médica, necessidades e expectativas do paciente, economia e política. A responsabilidade social corporativa, as políticas de registro sanitário, de precificação e de incorporação devem ser consideradas no contexto mais amplo, da sociedade.”

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