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Entrevista: ELSA-Brasil celebra 15 anos de atuação

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Publicado em:30/08/2023

As coordenadoras do Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto na Fiocruz, Rosane Griep e Maria de Jesus Fonseca concederam entrevista especial ao ‘Informe ENSP’ em celebração aos 15 de atuação do ELSA-Brasil, que atualmente coleta dados da 4ª onda, iniciada no final de 2022. Na entrevista, as pesquisadoras falam sobre a contribuição do ELSA para a saúde pública do país, da contribuição da pesquisa na promoção e prevenção da saúde do adulto, na participação dos seus voluntários e do papel da ENSP e da Fiocruz no estudo.  

Maria Fonseca (à esquerda) e Rosane Griep (à direita), coordenadoras do ELSA-Brasil na Fiocruz. Crédito foto: Portal Fiocruz.

Mais de uma década após a sua criação, o ELSA é referência nacional e internacional, como exemplo de estudo bem conduzido, sério, ético e socialmente comprometido. Seus resultados já originaram mais de 500 publicações científicas, além de já ter recebido prêmios nacionais e internacionais pela relevância e contribuição de seus resultados, e ter contribuído na formação de inúmeros estudantes e profissionais de saúde.

O Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto é uma investigação multicêntrica de coorte composta por 15 mil funcionários de seis instituições públicas de ensino superior e pesquisa das regiões Nordeste, Sul e Sudeste do Brasil, incluindo a Fiocruz, com o propósito de investigar a incidência e os fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares e o diabetes. 

Nesta uma década e meia de atuação, a pesquisa reforça que as doenças crônicas não transmissíveis são responsáveis pelos maiores índices de mortalidade e morbidade no Brasil. Segundo as coordenadoras do ELSA, o aumento substancial das DCNT não só traz consequências negativas para a qualidade de vida da população adulta do país, como também responde pelos maiores gastos com assistência hospitalar no Sistema Único de Saúde. Neste contexto, o ELSA-Brasil é uma pesquisa essencial para a gestão da saúde pública no país. 

Confira, abaixo, a entrevista completa. 

Informe ENSP: Como o ELSA-Brasil atuou ao longo destes 15 anos de pesquisa?

Rosane Griep e Maria de Jesus Fonseca: É importante sempre relembrar as bases às quais o ELSA-Brasil se fundamentou para responder à essa pergunta. Nas últimas décadas, profundas transformações sociais, econômicas e demográficas fizeram com que o Brasil vivenciasse um grande crescimento da ocorrência de doenças crônicas e, em 2002, tais enfermidades já respondiam por 75% dos gastos com internações hospitalares no Sistema Único de Saúde (SUS).

Na época da implantação do ELSA, por volta de 2005-2006, quando ocorreu o edital para o financiamento do estudo e as primeiras reuniões de planejamento, havia escassez de estudos longitudinais em populações adultas que investigassem as mudanças ocorridas em várias regiões brasileiras, portanto, a incidência dessas doenças e seus fatores de risco ainda eram pouco conhecidos no nosso contexto. 

Buscando sanar essa lacuna, o Ministério da Saúde, em parceria com o Ministério da Ciência e Tecnologia, propôs o desenvolvimento de um estudo de coorte para investigar o desenvolvimento de doenças crônicas, em particular das cardiovasculares e do diabetes. Para isso, foi formado um consórcio por seis instituições de diferentes estados do país: Fundação Oswaldo Cruz (Rio de Janeiro), Universidade de São Paulo (USP), e as universidades federais da Bahia (UFBA), Espírito Santo (UFES), Minas Gerais (UFMG) e Rio Grande do Sul UFRGS).

Esse breve histórico mostra quanto o estudo foi inovador no país em vários aspectos. Inspirados em estudos internacionais, trabalhamos intensamente na estruturação em rede do ELSA. A equipe multidisciplinar, com diferentes expertises - que desde o início foi a nossa marca - favoreceu para o sucesso do estudo. Entender as doenças crônicas não transmissíveis é complexo e multifatorial, e, no caso do ELSA, envolve desde a compreensão genética das doenças até as condições de vida, trabalho e moradia. 

Desde a primeira onda, em cada centro integrante do estudo, os sujeitos da pesquisa - que no início do estudo tinham entre 35 e 74 anos - fazem exames e entrevistas nas quais são avaliados aspectos, tais como, condições de vida, diferenças sociais, cognição, condições de saúde física e mental, relação com o trabalho, gênero e especificidades da dieta da população brasileira. Além disso, as entrevistas anuais por telefone são realizadas desde 2009 para a apuração e posterior investigação nos prontuários hospitalares de eventos incidentes. 

Nossa missão não é a assistência, embora os participantes tenham o acesso aos laudos de exames realizados. Temos retaguarda clínica em todos os centros, em que médicos orientam os participantes sobre os resultados dos exames e como proceder em casos de exames alterados. Atualmente, o estudo está bem estruturado e é amplamente reconhecido nacional e internacionalmente. Fazemos reuniões periódicas com integrantes do Ministério da Saúde apresentado os resultados e seu potencial em programas de prevenção e atenção à saúde. Mais de 500 artigos nacionais e internacionais já foram publicados e temos parceiros de pesquisa em diversos países do mundo.  

Informe ENSP? O ELSA investiga a incidência e os fatores de risco para DCNT. Neste contexto, como o estudo contribui para saúde pública do país?

Rosane Griep e Maria de Jesus Fonseca: As doenças crônicas não transmissíveis são responsáveis pelos maiores índices de mortalidade e morbidade no Brasil. Seu aumento substancial não só traz consequências negativas para a qualidade de vida da população adulta do país, como também responde pelos maiores gastos com assistência hospitalar no Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, ainda existem importantes lacunas de conhecimento sobre a incidência das enfermidades crônicas e seus fatores de risco. Políticas de controle dessas doenças têm sido formuladas de acordo com informações de estudos oriundos de países desenvolvidos. 

Dentro dessa conjuntura, o ELSA surge como pesquisa essencial para uma gestão da saúde pública no Brasil. O escopo do estudo é bem abrangente, incluindo fatores biológicos, comportamentais, ambientais, ocupacionais e sociais associados às doenças crônicas. 

Nosso último boletim traz o perfil dos participantes das três ondas. Em relação à atividade física, por exemplo, a prática aumentou nas três visitas presenciais. A atividade física regular ajuda a prevenir doenças crônicas como diabetes, câncer e cardíacas, que causam quase três quartos das mortes no mundo. Outro fator é o tabagismo, principal causa de morte evitável no mundo. Estima-se que ele seja responsável por quase 200 mil mortes por ano no Brasil. No ELSA, o número de fumantes reduziu entre os três períodos avaliados.


Informe ENSP: Como foi a participação dos voluntários ao longo do estudo? 

Rosane Griep e Maria de Jesus Fonseca: O ELSA-Brasil é uma coorte fechada. Na sua primeira onda, que ocorreu entre 2008 e 2010, foram incluídos na linha de base do estudo 15.105 servidores públicos das seis instituições mencionadas acima. Neste período, foram realizadas entrevistas e medições detalhadas para avaliar os determinantes sociais e biológicos da saúde, bem como várias condições clínicas e subclínicas relacionadas ao diabetes, doenças cardiovasculares e saúde mental. 

No entanto, como se trata de um estudo longitudinal - que avalia no tempo a situação de saúde - diversas avaliações são necessárias. Assim, além de 14 anos de ligações telefônicas anuais monitorando a saúde dos participantes, outras avaliações posteriores de entrevistas e exames foram realizadas para enriquecer a avaliação das exposições de coorte e detectar eventos de incidentes iniciais.

Uma segunda avaliação (onda 2) foi realizada entre 2012 e 2014, e contou com a participação de 14.104 (93,4%) participantes da linha de base. Na terceira onda, realizada entre 2017 e 2019, 12.636 participantes retornaram para novas avaliações e entrevistas (83,5% dos participantes da linha de base). 

Durante a pandemia de Covid-19 (2020-2021), foram realizadas entrevistas por autopreenchimento ou telefone para avaliar o comportamento dos participantes desde o início da pandemia, como hábitos alimentares, práticas de atividades físicas, além da investigação dos níveis de exposição à Covid-19. Essa etapa contou com a participação de 5.639 participantes de cinco centros de investigação do ELSA.


O ano de 2022 marcou o início de uma nova etapa no Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto: a onda quatro. Esta é quarta vez que os voluntários do estudo comparecem aos centros de investigação para novas avaliações de saúde, que incluem novas avaliações, testes e questionários. Até o final de julho de 2023, cerca de 60% já tinham participado dessa etapa. 

Além disso, em parceria com o Instituto Nacional de Infectologia (INI/Fiocruz), todos os participantes do Rio de Janeiro, após a participação na quarta onda, são convidados para fazer parte de um estudo específico sobre a saúde do fígado, em que um exame de eletrografia avalia a presença da fibrose e da esteatose. 

Informe ENSP: Como ELSA-Brasil atua na promoção e prevenção da saúde do adulto?

Rosane Griep e Maria de Jesus Fonseca: Com a divulgação dos seus resultados, o ELSA atua na promoção e prevenção da saúde do adulto, subsidiando políticas públicas para implementar estratégias de promoção e prevenção para intervenções adequadas de alguns fatores de risco importantes como: fumo, álcool, atividade física, hábitos alimentares, discriminação e desigualdades de raça, entre outros. 

Produzimos parâmetros e escores de risco a partir de dados nacionais, para serem usados pelo SUS e em práticas clínicas. Por exemplo, a determinação de percentis da distribuição do risco calculado de doença cardiovascular aterosclerótica e de percentis da distribuição do risco doença cardiovascular em 10 anos (calculado com base no IMC, de acordo com sexo e idade na população do ELSA-Brasil); validação de escalas e exames que possam ser utilizados de forma a melhorar a acurácia do agravo do que está sendo mensurado.

Além disso, temos produzido muitos materiais de divulgação, tais como, boletins, infográficos, podcast para vários públicos. O objetivo do ELSA é que seus resultados possam ser úteis tanto para o SUS, quanto para profissionais de saúde, para comunidade científica e para a sociedade civil.


Informe ENSP: Institucionalmente qual a importância de celebrar estes 15 anos de atuação e qual papel da ENSP e da Fiocruz neste projeto?

Rosane Griep e Maria de Jesus Fonseca: Por ser uma coorte com trabalhadores (servidores públicos), sua realização só foi possível porque contamos com a colaboração e parceria das seis instituições envolvidas no estudo. Principalmente, por ser um estudo de acompanhamento, garantir a adesão dos participantes e criar condições para que eles possam participar, sem prejuízo na sua rotina funcional, é a parte mais difícil. 

Por essa razão, o engajamento das instituições foi e é um dos pilares desse sucesso. No Caso do Rio de Janeiro, a Fiocruz teve papel fundamental, uma vez que no início do estudo, tornou possível a construção, dentro do Campus, de um local apropriado para realização da pesquisa. Houve um envolvimento de todos os diretores das diversas unidades e da presidência, tanto no início como durante esses 15 anos, na garantia da participação dos seus servidores. 

Apesar do ELSA estar localizado próximo ao INI, a ENSP é a responsável pela contrapartida de infraestrutura, incorporando a sede do projeto como uma estrutura que faz parte da Escola. A coordenação aproveita esse momento para ressaltar a importância do apoio institucional no alcance do sucesso do estudo ao longo desses 15 anos e em outros que ainda estão por vir.

Por fim, há muitos para agradecer pelo sucesso do estudo, sobretudo aos financiadores do projeto, que viabilizaram a continuidade ao longo dos anos, aos participantes que se mostraram parceiros assíduos nessa jornada e às equipes que estiveram conosco construindo e mantendo as ondas. Muito obrigada à todos!

Equipe do ELSA-Brasil na sede do projeto. Foto: Peter Ilicciev (CCS). 

*Crédito foto: Portal Fiocruz.

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