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Acesso aberto à investigação beneficia ciência, sociedade e economia

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Publicado em:27/04/2012

Quando falamos em Investigação e Desenvolvimento (I&D) as apostas dos países se medem muitas vezes com a régua do Produto Interno Bruto (PIB). A percentagem de investimento que um país dedica à investigação vem geralmente associada a retorno de médio e longo prazo para a economia e para o crescimento econômico. Quanto mais um país aposta em I&D, mais probabilidade tem de vir a colher frutos de grande valor acrescentado. Mas o retorno dos investimentos em I&D depende de outro fator determinante: a partilha e a abertura dos resultados da investigação. Se os resultados da investigação ficarem fechados nas gavetas e intranets das instituições também o potencial de inovação fica fechado, o que reduz a margem de retorno, quer para as entidades que financiam a investigação, públicas e privadas, quer para o próprio país.


É sobre o imperativo de abrir o acesso aos resultados da investigação que vai se concentrar o projeto europeu Medoanet (Mediterranean Open Access Network), que reúne em consórcio nove países: Grécia, Itália, França, Espanha, Portugal, Turquia, Alemanha, Holanda e Reino Unido. Financiado pelo 7º Programa-Quadro da Comissão Europeia, no âmbito do programa Ciência e Sociedade, o consórcio vai trabalhar durante dois anos com o objetivo de identificar estratégias, estruturas e políticas de acesso aberto nos seis países do Mediterrâneo: Grécia, Itália, França, Espanha, Portugal e Turquia. Em Portugal, o projeto conta com a participação da Universidade do Minho. Foi para conhecer em detalhes os objetivos e expectativas do projeto que o iGOV conversou com Eloy Rodrigues, o responsável da Universidade do Minho que está coordenando os esforços e iniciativas do Medoanet em Portugal.

 

Quais os objetivos centrais do projeto Medoanet?

 

Eloy Rodrigues; Universidade do MinhoEloy Rodrigues: O objetivo central do projeto Medoanet é promover o avanço do acesso aberto nos países do Mediterrâneo envolvidos (Portugal, Espanha, França, Grécia, Itália e Turquia), através da coordenação das políticas, estratégias e estruturas de acesso aberto desses países. Nesse sentido, numa primeira fase, o projeto vem realizando um levantamento das políticas, estratégias e estruturas de acesso aberto desenvolvidas ou em desenvolvimento nos seis países participantes, cujos resultados ficarão reunidos e disponíveis no website do projeto a partir de junho de 2012, através de uma ferramenta designada por Mediterranean Open Access Tracker.

Numa fase posterior, o projeto pretende contar com a participação e o envolvimento de pessoas chave na tomada de decisão para promover a definição e implementação das políticas, estratégias e estruturas de acesso aberto que se considerem adequadas, de acordo com a situação existente em cada país, tendo em conta as boas práticas identificadas em nível internacional e a coordenação pretendida no nível dos países do Mediterrâneo. Nesse sentido, será criado em cada um dos seis países um grupo de trabalho que vai integrar decisores políticos, instituições financiadoras de ciência e da investigação, instituições de ensino superior, editores científicos e gestores de repositórios.


Ao longo do projeto procurar-se-á também facilitar a coordenação e a interação com outras iniciativas e projetos europeus relacionados com o acesso aberto. Que questões/preocupações do acesso aberto estão em causa?

 

Eloy Rodrigues: A preocupação central é, através da coordenação e da partilha de boas práticas, otimizar e potencializar o impacto do trabalho que está sendo desenvolvido de uma forma dispersa em cada um dos países participantes, no sentido de promover o acesso aberto para os resultados da investigação científica. Como é sabido, o acesso aberto pode ser conseguido através de repositórios (a chamada via verde) ou de revistas (a chamada via dourada) de acesso aberto. Globalmente, pode-se considerar que a situação atual do acesso aberto no Mediterrâneo é ainda de algum atraso, mas a realidade do acesso aberto, no que diz respeito a repositórios, a revistas ou à existência de políticas, é muito diversificada no conjunto dos seis países participantes.


Por exemplo, relativamente aos repositórios, Portugal e Espanha se encontram claramente alinhados com as melhores práticas e entre os países mais avançados, no nível europeu, mas em outros países do Mediterrâneo a situação dos repositórios ainda apresenta um desenvolvimento incipiente. Também no que diz respeito às revistas de acesso aberto e às políticas (dos organismos de investigação, ou das instituições de financiamento) ou legislações que estimulam ou requerem o acesso aberto à literatura científica, verifica-se uma grande variação entre os seis países.


O objetivo é aumentar a porcentagem da produção científica dos países do Mediterrâneo disponível em acesso aberto, através do progresso coordenado no domínio das infraestruturas e ferramentas (repositórios e revistas) e das políticas e estratégias. Com isso, responder-se-á também aos requisitos e às diretrizes da Comissão Europeia relativamente ao acesso aberto, que já se aplicam a uma parte dos projetos financiados por fundos do 7º Programa-Quadro e que futuramente serão aplicados a todos os projetos do novo programa para a investigação e inovação, que se inicia em 2013 e que se designa Horizonte 2020.


Qual o impacto dessas questões, quer no nível das políticas, quer para a sociedade (cidadãos, empresas, investigação etc.)?

 

Eloy Rodrigues: Existe hoje cada vez mais evidência de que o acesso aberto aos resultados de investigação não é apenas benéfico para o progresso da ciência e para a visibilidade e o impacto (nomeadamente através do número de citações) dos investigadores e instituições que o implementam, mas produz também efeitos positivos na sociedade e na economia. O acesso pelos cidadãos e pelas empresas (que são, afinal, os grandes financiadores da investigação através dos seus impostos) à informação científica mais atualizada promove a qualificação e a competitividade e facilita a inovação.


Para os governos e outras entidades financiadoras da ciência, o estabelecimento de políticas que requeiram o acesso aberto aos resultados dos projetos de investigação que financiam é a forma de garantir o maior retorno (científico, econômico e social), a maior eficácia e eficiência possíveis para o investimento que realizam. A Comissão Europeia parece já ter interiorizado essa realidade e por isso anunciou, no quadro da sua política Innovation Union, o princípio do acesso aberto a todos os resultados da investigação no novo programa-quadro Horizonte 2020. Infelizmente, o mesmo não se passa na generalidade dos países do Mediterrâneo, como Portugal, que ainda não possuem políticas e/ou legislações nacionais que promovam o acesso aberto à investigação financiada em nível nacional.

A Comissão Europeia já anunciou que apresentará, proximamente, uma comunicação e recomendação aos Estados membros sobre o acesso aberto aos resultados da investigação. Tendo em consideração e em convergência com essas iniciativas, o Medoanet espera contribuir para que os governos dos países do Mediterrâneo estabeleçam políticas nacionais alinhadas com as diretrizes da Comissão Europeia, promovendo, assim, também a visibilidade e o impacto da ciência, das instituições científicas e dos investigadores dos seus países.


Por que é importante identificar estratégias, estruturas e políticas dos vários países nesses domínios?

 

Eloy Rodrigues: Porque esse é o primeiro passo para possibilitar a cooperação e coordenação das intervenções, a partilha de boas práticas, dos casos de sucesso, mas também das dificuldades e dos problemas. Apesar das diferenças culturais e da diversidade dos sistemas científicos dos países do Mediterrâneo, muitos dos desafios, problemas e potenciais soluções serão comuns ao conjunto dos seis países. Conhecer a situação em cada país, identificando pontos fortes e pontos fracos, permitirá partilhar e disseminar as boas experiências entre todos e identificar estratégias coordenadas para enfrentar os problemas com que o acesso aberto se debate.

 

Na prática, que ações e iniciativas serão desenvolvidas em Portugal?

 

Eloy Rodrigues: Já está ocorrendo a recolha de informação sobre a situação do acesso aberto em Portugal, que, além de outros meios, recorre à utilização de questionários para as instituições de investigação (http://www.surveymonkey.com/s/F7XSSRK), para instituições financiadoras de investigação (http://www.surveymonkey.com/s/NLFFR5T) e para editores de publicações científicas http://www.surveymonkey.com/s/3WFZVHY).
 

Brevemente será constituído um grupo de trabalho nacional que integrará decisores políticos, instituições financiadoras de ciência, instituições de ensino superior, gestores de repositórios e editores científicos. No dia 22 de outubro de 2012 será realizado na Universidade do Minho um workshop nacional que irá juntar os membros do grupo de trabalho de Portugal e especialistas do acesso aberto nacionais e internacionais para apresentar a situação existente em Portugal e debater as políticas, estratégias e estruturas que devem ser consolidadas ou desenvolvidas para promover o acesso aberto em Portugal.

 

No primeiro trimestre de 2013 será realizado, também na Universidade do Minho, o Workshop Europeu. Esse evento internacional para além do Medoanet vai juntar participantes de outro grande projeto europeu, o OpenAIREplus, que conta também com a participação da Universidade do Minho. Além de reunir decisores políticos e outras pessoas chave dos países parceiros do Medoanet, esse evento contará com a presença de um vasto conjunto de especialistas internacionais de acesso aberto que proporcionarão a partilha de experiências e de conhecimento. O Workshop Europeu a ser realizado em Portugal será também um contributo fundamental para a elaboração das diretrizes para a implementação de políticas de acesso aberto, que é um dos entregáveis do Medoanet.

 

Quais os principais resultados previstos no final do projeto?


Eloy Rodrigues: Como referido anteriormente, o principal resultado final esperado é o progresso do acesso aberto nos países do Mediterrâneo, nomeadamente, o aumento da porcentagem da produção científica desses seis países disponível em acesso aberto. Para isso, deverão ser registrados progressos na quantidade e qualidade dos repositórios e das revistas de acesso aberto existentes nos países participantes. Mas será indispensável também que cresça o número de políticas de acesso aberto dos organismos de investigação e das instituições financiadoras, que são decisivas para a generalização e adoção do acesso aberto na comunidade científica.

 

No caso de Portugal, que registrou progressos significativos nos últimos anos, em boa medida resultantes do projeto RCAAP, tem uma boa rede de repositórios e conta com mais de uma dezena de instituições de investigação com políticas mandatórias de acesso aberto, os principais resultados esperados se situam no domínio das políticas das instituições financiadoras da investigação e na sustentabilidade das iniciativas e infraestruturas já existentes. Espera-se que o projeto Medoanet contribua decisivamente para que as entidades públicas (como a Fundação para Ciência e Tecnologia) e privadas (como a Fundação Calouste Gulbenkian ou a Fundação Champalimaud) que financiam a investigação científica em Portugal definam e implementem políticas que requeiram o acesso aberto aos resultados das investigações que financiam. Simultaneamente, o projeto Medoanet pode contribuir para reforçar o reconhecimento nacional e internacional dos progressos registrados no domínio dos repositórios e das políticas institucionais, no âmbito do projeto RCAAP, que precisa garantir um financiamento adequado nos próximos anos para poder continuar a prestar os relevantes serviços que proporciona à comunidade científica e acadêmica portuguesa.


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