Livro discute métodos para avaliar a discriminação e efeitos na saúde
É possível apreender cientificamente a discriminação? Que desafios complexos devem ser enfrentados nessa iniciativa? Para responder a essas perguntas, são necessárias estratégias metodológicas capazes de identificar e medir a discriminação. Apresentar as ferramentas disponíveis e discutir suas potencialidades e limitações são os objetivos do livro Discriminação e saúde: perspectivas e métodos, lançamento da Editora Fiocruz. A obra, que compõe a coleção Temas em Saúde, é assinada por João Luiz Bastos, do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina, e Eduardo Faerstein, do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
“A principal motivação para o extenuante exercício acadêmico de medir o fenômeno da discriminação é examinar como e o quanto esta contribui para a ocorrência e a perpetuação de desigualdades sociais, incluindo os domínios da educação, da saúde, da justiça e do mercado de trabalho, entre outros”, explicam os autores. “É, portanto, o desejo de compreender melhor e, assim, contribuir para o combate efetivo dessa fonte de desigualdade social que mobiliza os pesquisadores dedicados à mensuração da discriminação”, acrescentam.
Inicialmente, João Luiz Bastos e Eduardo Faerstein apresentam o tema em perspectiva histórica. Mostram como, antes de 1920, a discriminação sequer se configurava como um problema importante de pesquisa, dadas as crenças na superioridade de algumas raças sobre outras, o que tornava natural e inquestionável o racismo à época. Principalmente durante a década de 1990, a discriminação passou a ser encarada como um fenômeno multifacetado, onde discriminadores e discriminados envolvem-se em relações dinâmicas e complexas que, não raro, dificultam sua pronta identificação.
As relações discriminatórias têm sido recentemente estudadas no âmbito da saúde coletiva. “Há vasta literatura que documenta a influência deletéria de processos discriminatórios na relação estabelecida entre profissionais de saúde e pacientes, na prescrição de tratamentos medicamentosos ou de outros procedimentos cirúrgicos e terapêuticos, assim como na própria satisfação dos usuários com o atendimento prestado”, dizem os autores. “E isso é de suma importância, tendo em vista que os serviços exercem influência expressiva sobre condições de saúde e vida de indivíduos e populações”, completam.
Identificar e quantificar essas circunstâncias é fundamental para reduzir as iniquidades na saúde. Os autores descrevem as principais estratégias metodológicas hoje utilizadas para mensurar a discriminação, como experimentos laboratoriais; experimentos de campo; análises de dados observacionais e experimentos naturais; e análise de indicadores. Embora reafirmem a importância desse conjunto de métodos, os autores lembram que a análise de seus resultados exige reflexão e senso crítico, pois a discriminação é um fenômeno complexo, com peculiaridades no contexto brasileiro. Isso significa que indicadores criados, por exemplo, nos Estados Unidos não podem simplesmente ser importados para aplicação em estudos nacionais.
A discriminação pertence ao campo das ações, e a caracterização de uma ação como discriminatória não é absoluta: ela depende do observador, o que já demonstra o quão difícil é a tarefa do pesquisador que se propõe a mensurar a discriminação. Em alguns casos, a condição de desvantagem e os tratamentos injustos estão tão internalizados que discriminadores e discriminados não identificam aquelas situações como problemáticas, considerando-as normais e naturais. Em outros, menos frequentes, pode haver uma superestimação do problema. “Indivíduos podem atribuir à discriminação o insucesso na obtenção de cargos em uma empresa, quando este pode ter sido consequência exclusiva da baixa qualificação profissional que apresentam”, exemplificam os autores.
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