Webinário discute preparativos e expectativas às vésperas do início de novo tratamento contra tuberculose drogarresistente
Por Barbara Souza
Em janeiro de 2025, um novo tratamento estará disponível nas unidades de saúde de referência para o combate à tuberculose resistente a medicamentos. A menos de um mês da incorporação da Pretomanida e implementação do BPaL(M) no Brasil, o Departamento de HIV/Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissiveis (Dathi), da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente (SVSA/MS), promoveu um evento online para atualizar a rede assistencial sobre o novo esquema contra a TBDR. Realizado nesta quinta-feira (5/11), o webinário contou com análise dos especialistas, visão da sociedade civil e debate sobre o cenário da assistência farmacêutica. A coordenadora-Geral de Vigilância da Tuberculose, Micoses Endêmicas e Micobactérias Não Tuberculosas (MS), Fernanda Dockhorn, mediou a atividade. “É uma mudança de perspectiva para as pessoas que vão se tratar, mas há desafios em relação ao acompanhamento e monitoramento dos efeitos adversos”, disse. O evento teve a participação de dois pesquisadores do Centro de Referência Professor Hélio Fraga, da ENSP/Fiocruz.
Médica do CRPHF/ENSP e presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), Margareth Dalcolmo ministrou uma aula magna como o tema “Esquema de tratamento com a Pretomanida (BPaL/M): bases científicas e benefícios da utilização do esquema encurtado para tuberculose drogarresistente”. A especialista apresentou o contexto brasileiro e disse que o país “dá um novo exemplo de pioneirismo corajoso, generoso e muito bem fundamentado”. Após a explanação sobre o histórico do uso de diferentes combinações de fármacos em tratamentos com variadas durações e abordagens, Dalcolmo afirmou que nunca houve uma situação de tamanho conforto para defender uma associação de medicamentos. “Tenho orgulho de ter sido testemunha ocular e viva da história da adoção da curta duração para formas sensíveis no Brasil. Eu estava no meu primeiro ano de residência, quando isso aconteceu. E, agora, de ser igualmente testemunha e protagonista do início do tratamento completamente oral para formas resistentes. Mas tenho uma preocupação: nós temos que tratar esses medicamentos realmente com todo rigor, e apenas em referências onde há pessoas de muita qualificação para manejá-los”, alertou.
Em seguida, o chefe do ambulatório de tuberculose do CRPHF/ENSP, Jorge Luiz da Rocha, fez uma apresentação sobre as principais recomendações clínicas do tratamento BPaL/M. Ele comentou o novo contexto, detalhou a composição dos esquemas BPaLM/BPaL, apresentou as indicações e contraindicações, além das boas práticas no manejo clínico, as situações especiais e orientações sobre monitoramento (avaliações clínica e bacteriológica). O médico abordou ainda reações adversas, interrupção permanente do uso de fármacos e mudanças de esquema. O pesquisador também defendeu a gestão cuidadosa e racional dos medicamentos.
Entre as indicações para os esquemas BPaLM/BPaL, Jorge Rocha listou: formas pulmonar e extrapulmonar, exceto meningoencefálica, osteoarticular ou disseminada; pessoas acima de 14 anos, independentemente do diagnóstico de HIV; sensibilidade comprovada ou presumida aos componentes do esquema; e pessoas com histórico de uso dos fármacos componentes do esquema por mais de quatro semanas, desde que haja comprovação de sensibilidade. Quanto às boas práticas no manejo clínico, ele destacou a necessidade de avaliação individualizada e acolhedora, do trabalho de equipe multidisciplinar, da elaboração a um Projeto Terapêutico Singular, de integração e sinergia entre os níveis de cuidado e do Tratamento Diretamente Observado. “Precisamos cercar os pacientes do máximo cuidado possível para que ele possa se beneficiar dessa oportunidade de se tratar contra tuberculose multirresistente ou até com resistência extensiva com tratamento totalmente oral por seis meses”, salientou.
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O pesquisador destacou o papel o SUS e dos esforços de seus profissionais para a disponibilização dos melhores diagnósticos e tratamentos contra a doença. “É para nós exaltarmos nosso Sistema Único de Saúde, todos os esforços que o Ministério da Saúde e a Coordenação Geral de Tuberculose fazem diariamente para trazer os melhores esquemas e diagnósticos para todos os cidadãos brasileiros, indistintamente. E viva a ciência, que foi a responsável por essa nova conquista de novos medicamentos e novos estudos clínicos que validaram esses esquemas e que permitiram a OMS indicá-los para o uso programático”, concluiu.
O webinário teve também apresentações da farmacêutica e consultora técnica da Coordenação-Geral de Assistência Farmacêutica e Medicamentos Estratégicos (DAF/MS), Patricia de Abreu Teixeira. Ela falou sobre o cuidado farmacêutico na tuberculose e o novo esquema de tratamento. Em seguida, o membro da Articulação Social Brasileira para o Enfrentamento da Tuberculose (ART TB), Ezio Tavora dos Santos Filho, participou com uma palestra a respeito da perspectiva da sociedade civil na implementação do tratamento encurtado da tuberculose drogarresistente.
Ao final, a secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente, Ethel Maciel, comentou sobre expectativas e agradeceu aos envolvidos na questão, citando nominalmente o CRPHF, chefiado por Paulo Victor Viana. “É fundamental que nós tenhamos toda essa linha de cuidado, com todas as vertentes e possibilidades para melhorar esse diagnóstico e tratar as pessoas que a gente diagnostica, que tem sido um desafio”, disse.
Assista ao webinário na íntegra no canal da SVSA/MS:
Sobre o novo tratamento
O novo tratamento, incorporado pelo SUS em 2023, reduz em até 70% o tempo de tratamento dos casos resistentes. O medicamento Pretomanida é administrado via oral e possui menos efeitos colaterais, tornando o tratamento mais tolerável para os pacientes. Além disso, o tempo é reduzido de dezoito para seis meses, o que é um avanço significativo na eficácia do tratamento da tuberculose resistente aos medicamentos. A incorporação da Pretomanida permitirá o uso de dois esquemas encurtados, conhecidos como BPaL (bedaquilina, Pretomanida e linezolida) e BPaLM (bedaquilina, Pretomanida, linezolida e moxifloxacino), que possibilitam encurtar o período do tratamento da tuberculose multirresistente (TBMDR).
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