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ENSP 70 anos: Escola é destacada como agente fundamental na conquista do direito à saúde

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Publicado em:06/09/2024
Por Bruna Abinara e Danielle Monteiro

O contexto histórico, político e social no campo da Saúde Coletiva e o papel da ENSP como agente transformador e formulador da saúde como direito universal foram os destaques da palestra A ENSP e o SUS, realizada na tarde desta terça-feira (3/9). O evento integrou a programação de comemoração do aniversário de 70 anos da Escola. Na pauta, estiveram temas como Redemocratização, Reforma Sanitária e 8ª Conferência; Fortalecimento da Gestão Federativa do SUS; Participação social no SUS; e A formação de sanitaristas: o futuro do ensino na Fiocruz. 


O coordenador do Observatório do SUS e vice-diretor da Escola de Governo em Saúde da ENSP, Eduardo Melo, iniciou a atividade destacando que o SUS é a maior materialização do conjunto de lutas da Reforma Sanitária e pelo direito à saúde. “Essa mesa tem um sentido especial, pois a história da ENSP é atravessada, fortemente, pela construção do Sistema Único de Saúde, que continua sendo uma grande referência a partir da qual nos inspiramos, para onde miramos e que dá sentido ao que fazemos aqui em termos de formação, pesquisa e cooperação”, afirmou.

No início da mesa, a pesquisadora da ENSP Maria Helena Mendonça prestou uma homenagem ao ex-diretor da Escola Antônio Ivo de Carvalho, com a entrega de uma lembrança para os filhos do idealizador e condutor do “ENSP em Movimento”. Segundo a pesquisadora, é fundamental lembrar o seu papel na história e a dimensão de seu legado à frente de tantas mudanças e de tantos profissionais na trajetória da Escola. “Nós o perdemos há três anos, mas ele continua presente hoje”, declarou Maria Helena.  

“Para falar da saudade que deixou, digo que personalidades como a de Antônio Ivo fazem falta na vida pública e institucional da ENSP/Fiocruz, assim como na vida privada de amigos, que seguiam sua constante intervenção no saber e nas práticas de saúde depois de muitas leituras e conversas”, disse a pesquisadora. Maria Helena lembrou que sua atuação era sempre apoiada na liberdade e na inovação da educação e da gestão em Saúde Pública, como princípios para uma plena cidadania. Segundo a pesquisadora, recuperar a memória do ex-diretor é também apontar para o futuro, pois significa resgatar a memória viva de um sonho compromissado com a reparação das desigualdades e com a construção de parâmetros mais inclusivos para a saúde brasileira.  

Em seguida, em sua apresentação sobre Redemocratização, Reforma Sanitária e 8ª Conferência, o superintendente do Canal Saúde da Fiocruz, Arlindo de Sousa, relembrou o legado deixado por figuras como Antônio Ivo, o sanitarista Sergio Arouca e o médico Hésio Cordeiro no campo da saúde pública. Ele também destacou as contribuições da ENSP para os avanços nessa área, citando, entre elas, o ineditismo da Escola na criação de cursos descentralizados e multiprofissionais, assim como na cooperação com países africanos, além do apoio da ENSP na concepção de instituições como o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) e da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).  
 
Arlindo rememorou, ainda, movimentos importantes que foram o berço da criação do SUS, como a 8ª Conferência Nacional de Saúde e a criação dos Programas de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (PIASS) e de Ações Integradas de Saúde (PAIS), entre outros. “A saúde como direito de todos e dever do Estado não foi um estalo na cabeça de alguém. Foi um processo enorme com essa quantidade de atores, instituições e reflexões e experiências, que são levadas à mesa, discutidas e apresentadas. O processo da Reforma Sanitária Brasileira é civilizatório, ou seja, pretende produzir mudanças dos valores prevalentes da sociedade, tendo a saúde como eixo de transformação e a solidariedade como valor estruturante”, destacou.


Em uma viagem ao passado e presente da ENSP,  a professora aposentada da Escola, Tânia Celeste, discorreu sobre a instituição e o fortalecimento da gestão federativa do SUS. Entre as conquistas da ENSP ao longo de seus 70 anos, Tânia destacou a criação dos cursos descentralizados, em 1975, os quais, segundo ela, foram pensados como uma estratégia técnico-política e formaram sanitaristas em todo o território nacional, com professores implicados e dedicados à formação para o trabalho em Saúde, gerando, como fruto, a Política Nacional de Formação de Sanitarista.

Ainda entre as iniciativas da ENSP, rememoradas pela professora no decorrer de suas sete décadas de atuação, está a criação do EAD e da Escola de Governo em Saúde, em 1996, ancorada no conceito de Governança em Saúde, no estímulo à inovação e na estratégia de ‘rede com movimento’.


Por fim, Tânia citou, também como mais uma conquista da Escola nessa longa trajetória, as cooperações internacionais, as quais, segundo ela, são um lugar onde se faz uma cooperação estruturante, com desenvolvimento de capacidades locais, com foco na América Latina, Caribe e África, mas também com parcerias históricas com países desenvolvidos. “A cooperação internacional da ENSP já trabalha com mediações, com temas fortes, e promoção da saúde e atenção à promoção da saúde como temas prioritários e indutores desse processo. E as redes com mediações como um caminho de convivência entre os parceiros”, frisou. Entre as atuais conquistas da Escola, Tânia elencou o intenso intercâmbio de docentes, pesquisadores e estudantes, o crescimento de escolas parceiras e projetos comuns de interesse coletivo e do SUS, assim como as parcerias com organizações nacionais e internacionais, e a estratégia de ‘Redes com Movimento”.

Em seguida, a chefe da Assessoria de Participação Social e Diversidade do Ministério da Saúde, Lucia Souto, refletiu sobre a participação social na construção da saúde como direito universal de cidadania no Brasil. Segundo a pesquisadora, essa história foi escrita com muita dor, resistência e participação popular. Lucia defendeu que é preciso recuperar o espírito da 8° Conferência Nacional de Saúde, que ela apelidou de “Constituinte Popular da Saúde” pela forte participação popular, para combater o cenário atual de fortalecimento do capitalismo ultra neoliberal de exclusão de direitos. “O lema ‘Democracia é Saúde’ diz tudo, porque sem democracia não há saúde, não há vida, não há relações de solidariedade, não há nada”, declarou.  

Lúcia reafirmou a urgência de se reacender o vigor do debate público para a construção de uma democracia com participação da sociedade. “Hoje, temos um mundo de sanitaristas que defendem a saúde como direito e não como mercadoria. Nós vimos o valor disso na pandemia, quando muitos compreenderam a importância do SUS”, afirmou. A pesquisadora ressaltou que a Saúde Coletiva é uma invenção do Brasil, o que expressa a compreensão nacional de que a saúde é fruto de um conjunto de dinâmicas da sociedade. Lúcia também reforçou que o momento exige união e coragem para avançar na construção de novas políticas públicas que assegurem a saúde como direito universal no país. 

A formação dos sanitaristas e o futuro do ensino foram os temas abordados pela vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Cristiani Machado, que recuperou conquistas do passado para apontar caminhos futuros de enfrentamento de desafios. A vice-presidente relembrou os sanitaristas do início do século XX, quando as políticas públicas de saúde foram estruturadas a partir de um olhar inédito para questões da coletividade. Cristiani mencionou também o sanitarismo desenvolvimentista da década de 1950, que mudou a visão sobre a necessidade de formação de profissionais para o campo da Saúde Pública. “É nesse contexto que essa Escola foi criada e construiu uma história tão bonita de décadas de formação”, contou. 


Dentre os desafios atuais na formação dos sanitaristas, Cristiani enumerou o debate sobre políticas públicas, o enfrentamento de desigualdades, as questões contemporâneas, como transformação demográfica e migrações, além da mudança tecnológica e informacional na área da saúde. A vice-presidente ainda ressaltou que é necessário preparar os profissionais para lidar com a incerteza, uma vez que o mundo da saúde é complexo e cheio de imprevistos. “Na luta pela vida, precisamos estar dispostos a fazer isso com animação, é preciso estar o tempo todo em movimento, defendendo a democracia e o diálogo com o social. Nós temos um compromisso com a sociedade, não podemos desanimar”, concluiu.  

Presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Comdef-RJ), Cinthya Freitas, que também discorreu sobre o futuro do ensino na Fiocruz, relembrou, brevemente, o contexto histórico das pessoas com deficiência ao longo dos últimos 70 anos, desde os tempos da política higienista, quando essa parcela da população era levada para instituições e não tinha qualquer direito à saúde, até os dias atuais, nos quais aumenta a participação de pessoas com deficiência nos Conselhos e conferências de Saúde.