Radis 40 anos: Confira os relatos dos repórteres da revista
Vozes Ancestrais, de Luiz Felipe Stevanim
Na outra banda do rio-mar, fomos ao encontro de um pedaço da África na Amazônia. O percurso até o Quilombo Saracura é feito somente de barco, cruzando o encontro entre os rios Tapajós e Amazonas: localizada em uma ilha, essa é uma das 12 comunidades quilombolas da região de Santarém, no oeste do Pará, que nasceram da resistência à escravidão e ainda hoje lutam pelo reconhecimento do seu direito ao território. Em sintonia com a Mãe Terra, são populações que vivem do extrativismo e da agricultura familiar e, como guardiões da floresta, sofrem com a expansão do agronegócio predatório, do garimpo e de obras com grande impacto ambiental, como a construção de portos e hidrelétricas. Em comum, guardam tradições ancestrais que fazem com que se reconheçam pelo nome poético de “comunidades afro-amazônidas”.
Memórias do sertão, de Ana Cláudia Peres
Na primeira vez que voltei ao Nordeste como repórter de Radis, foi para ver água — um volume de encher os olhos mas que, apesar de abundante, ainda não havia chegado nas torneiras dos moradores. Às margens do São Francisco, testemunhei o sofrimento e a esperança de homens e mulheres atingidos por um projeto de transposição de águas do rio que atravessou governos, fez crescer o interesse do agro e do hidronegócio, atiçou as ambições do setor industrial e deixou marcas profundas na vida e na saúde de uma população destemida demais, resiliente demais.
O aprendizado nas margens, de Adriano De Lavor
Era início de 2009, e eu ainda não sabia a importância que aquela reportagem teria na minha vida profissional e pessoal nos anos seguintes, mas seguia empolgado rumo à aldeia Vila Nova, às margens do Rio Xié, afluente do gigante por onde navegava, cujo espelho d’água refletia tão perfeitamente o desenho do céu que em muitos momentos me fazia confundir onde começava um e terminava outro. O céu aqui parece mais perto, imaginei. A expectativa do encontro com agentes de saúde indígenas, o espetáculo visual e o ar puro que entrava pelas narinas compensava qualquer desconforto ou medo causados pela viagem naquela voadeira de alumínio que de modo barulhento singrava as águas de um dos rios mais potentes do Brasil. Quase cinco horas de navegação, havia avisado o barqueiro, ao partirmos de São Gabriel da Cachoeira, a cidade mais indígena do país.
Nosso lado, de Bruno Dominguez
Em 7 de março de 2006, entrava na redação da Radis na Avenida Brasil para o meu primeiro dia como um profissional de Comunicação formado. Abria as portas da profissão repetindo as regras que acabara de aprender na faculdade. Do outro lado, estava a jornalista Marinilda Carvalho, então editora da revista, e sua bagagem de uma vida inteira dedicada ao jornalismo — tendo passado por Correio da Manhã, Jornal do Brasil, Veja, IstoÉ e Observatório da Imprensa.
Foi com ela que aprendi que o principal pilar do jornalismo não é imparcialidade ou neutralidade, como repetiam na sala de aula, mas justiça. “A Radis tem lado”, me disse antes da minha primeira reportagem, a cobertura da 3ª Conferência de Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde, em Brasília, uma semana depois da minha contratação.
As pessoas, sempre elas, de Liseane Morosini
A imagem de dona Maria Grinauria da Silva estava na capa da Radis 129, em 2013. Moradora do Coque, na área central do Recife, dona Grinauria viu sua casa ser derrubada para dar passagem à rua que cortaria a comunidade. Pela perda material foi indenizada. A perda afetiva deixou um buraco em sua alma. Morava na comunidade há 40 anos, e lá queria ficar. Seu destino foi a palafita, na beira do mangue. Dona Grinauria fazia 87 anos na tarde em que conversamos, numa passagem feita em tábuas de madeira que levava à sua casa. Não havia bolo ou festa. Não havia muito o que celebrar, ela disse. Mas havia leveza e acolhimento em sua voz. Do momento em que nossos olhares se cruzaram, lembro do sorriso e o resumo de uma história marcada por dificuldades. “Minha filha, isso não é vida”, foi o que disse. E foi isso o que eu ouvi em tantas conversas como repórter de Radis.
Histórias que não cabem em palavras, de Rogério Lannes
Em meus 35 anos de Radis vivi um pouco de tudo, das reportagens pioneiras e bastidores da construção do SUS aos embates para assegurar o reconhecimento ao trabalho de meus companheiros e a sobrevivência e a consolidação do Programa. Aprendi muito com cada geração de profissionais com quem trabalhei.
Para compartilhar o espaço dessa matéria com os colegas atuais, escolhi mencionar a experiência gratificante de ter me colocado ao lado dessa geração de jornalistas em um lugar que, no fundo, o repórter da caneta e bloco de notas sempre teve vontade de experimentar um dia, o do repórter-fotográfico. A rápida passagem pelo fotojornalismo resultou em exposições e prêmios. Mas o prazer maior foi o processo de me colocar diante de uma cena sem discrição, subir em mesa e torre de caixa d’água, debruçar na linha d’água em lancha voadora, ficar atento à incidência da luz, observar movimentos e ouvir atentamente cada fala na busca por expressar o cotidiano das pessoas, a luta coletiva e os Brasis que se descortinavam diante de nós em longas reportagens, viver o desafio de contar histórias sem o recurso da palavra.
Acompanhe mais reportagens dos 40 anos da Radis aqui.
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