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NAF/ENSP e Moçambique se unem para atualização de Lista Nacional de Medicamentos Essenciais

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Publicado em:16/01/2020
NAF/ENSP e Moçambique se unem para atualização de Lista Nacional de Medicamentos Essenciais *Danielle Monteiro
 
Centro Colaborador em Políticas Farmacêuticas da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (Opas/OMS), o Departamento de Política de Medicamentos e Assistência Farmacêutica (NAF/ENSP) apoiou a atualização da Lista Nacional de Medicamentos Essenciais de Moçambique, país localizado no sudeste do Continente Africano. A lista é orientadora das Políticas Farmacêuticas nacionais.
 
Em entrevista ao Informe ENSP, os pesquisadores e integrantes da Assessoria Técnica do projeto, Vera Lúcia Luiza e Rondineli Mendes, falaram sobre a importância da iniciativa e quais serão as próximas etapas da parceria.
 
Qual a importância da atualização da Lista Nacional de Medicamentos Essenciais para um país?
 
Vera: Desde que a Lista de Medicamentos Essenciais foi lançada pela OMS, em 1977, ela é defendida como um pilar de organização das Políticas Farmacêuticas Nacionais. A ideia é que cada país defina um elenco de medicamentos capaz de dar conta das principais necessidades em saúde da população. E a OMS defende que todos os países devam ter uma lista. Inclusive países ricos. A Austrália e o Canadá, por exemplo, têm retomado esse conceito. 
 
A Lista Nacional de Medicamentos Essenciais ajuda a organizar a relação com os fornecedores, as Políticas de Fomento Industrial, as Políticas de Genéricos, as Políticas de Compras, além do treinamento dos médicos para prescrever e das equipes de farmácia para dispensar etc. Ou seja, ela é orientadora das ações tanto para o uso racional como para o acesso a medicamentos. 
 
A lista é desenvolvida com base no perfil epidemiológico nacional, o que não envolve somente o número de casos de doenças. A ideia é que o país defina quais são essas doenças e os tratamentos de primeira, segunda e terceira escolha. A partir disso, o país vai se comprometer em viabilizar mecanismos de acesso aos medicamentos, além de promover o uso racional dos mesmos. 
 
Imagine, por exemplo, que um município não disponha de uma lista de grupos de anti-inflamatórios. Nesse caso, cada unidade de saúde teria que comprar cada diferente opção que o médico prescrever. Isso seria um processo enlouquecido, pois não permitiria a organização da base de fornecedores, nem o planejamento do almoxarifado. A existência de uma lista, pelo contrário, permite que, entre um número X de grupos de anti-inflamatórios existentes no mercado, o município defina a compra de dois ou três, por exemplo. Isso organiza a compra, a relação com fornecedores e permite que o médico seja treinado para prescrever aqueles itens e, ainda, as equipes da farmácia sejam treinadas para dispensá-los. 
 
Para a elaboração da Lista de Medicamentos Essenciais, comparamos os medicamentos tecnicamente, analisamos a melhor relação custo-benefício e a melhor relação segurança-eficácia. A partir dessa análise, escolhemos um deles. E esse medicamento será comprado todo mês, até sair uma nova evidência de que outro é melhor. 
 
Como podemos descrever o perfil epidemiológico de Moçambique e de que forma a atualização da lista pode ajudar o país a enfrentar os principais desafios nesse quesito?
 
Vera: Moçambique é um país muito afetado pelo HIV, possui alta taxa de pobreza e de analfabetismo, além de alta mortalidade infantil e materna e alta prevalência de malária. A Lista Nacional de Medicamentos Essenciais atende essas necessidades. A lista contempla, inclusive, situações de doenças crônicas não transmissíveis, como as doenças oncológicas. O desafio desses países pobres é a chamada Tripla Carga Viral, que engloba alto índice de doenças infecciosas, as causas externas a elas, além das doenças crônicas não transmissíveis. 
 
Fazer uma lista proforma e viável é um grande desafio em Moçambique. Como o país possui cinco níveis de prescritores, existe uma gama de profissionais que podem prescrever medicamentos. Por isso, é necessário estar previsto, na lista, quem pode prescrever o quê. 
 
Quais foram as ações/orientações elaboradas pelo NAF para a atualização da Lista Nacional de Medicamentos Essenciais de Moçambique? 
 
Vera: Essa colaboração se insere no eixo de ação de nosso Plano de Trabalho referente ao apoio a países na formulação, implementação e avaliação de sua Política Nacional de Medicamentos, assim como de componentes dessa política. Em geral, isso acontece por demanda direta dos países à OMS ou à Opas, as quais, identificando que temos expertise na área, nos acionam. Esse foi o caso de Moçambique. O trabalho, com o país, compreende o apoio à atualização da Lista Nacional de Medicamentos Essenciais, assim como a elaboração de um Plano de Implementação e um Plano de Avaliação da lista. É o país que define os eixos que precisam ser trabalhados. No caso de Moçambique, o trabalho está sendo feito com o apoio do Escritório da OMS local e do Escritório da OMS em Genebra. O projeto começou a ser desencadeado no segundo semestre de 2019.
 
Rondineli: Nós montamos um fluxo, desde o padrão para nomeação dos arquivos, até o regimento interno da comissão, que estava sendo aprovado pela parte jurídica do país. Deixamos isso tudo montado antes de nosso retorno de Moçambique. Passamos duas semanas no país, precedidas por diversos encontros virtuais. O foco da Assessoria Técnica que oferecemos foi a revisão da Lista Nacional de Medicamentos Essenciais, que pode ser comparada à Rename (Relação Nacional de Medicamentos Essenciais) no Brasil. A orientação da OMS é que os países tenham uma Lista Nacional de Medicamentos Essenciais, que sirva para o atendimento à sua população.
 
Nossa primeira viagem a Moçambique teve o objetivo de oferecer uma capacitação interna no país para a atualização da lista, além de captar desafios e dificuldades. Os representantes da comissão foram definidos pelo Ministério da Saúde de Moçambique, que foram alvo dessa capacitação. Mais de 20 profissionais foram treinados, entre médicos, farmacêuticos e outros profissionais de saúde. Além da capacitação, fizemos uma comparação da lista vigente em Moçambique com a lista da OMS, atualizada ano passado.
 
Como foi desenvolvido esse projeto e quais foram seus principais desafios?
 
Vera: Um princípio importante do trabalho do NAF é o fortalecimento de capacidades locais. Para a atualização de uma Lista Nacional de Medicamentos Essenciais, é preciso que as equipes locais tenham soberania, que saibam desenvolver e deem continuidade à iniciativa, se tornando, assim, protagonistas desse trabalho. O mote de nossa viagem foi treinar a Comissão de Atualização da Lista. Isso envolveu uma série de atividades, inclusive definir essa composição, conhecer um pouco mais do contexto local, o que havia ou não sido comprado da lista anterior, o que tinha sido consumido ou não, quais eram os principais desafios etc. A lista tem que se operacionalizar em acesso a medicamentos. Para que ela se operacionalize em acesso, o governo precisa comprar os medicamentos da lista.
 
Entre as dificuldades que encontramos, apesar de existir um plano de ampliação da Lista de Produção, ela é, atualmente. muito restrita. Há problemas no registro de medicamentos. Como Moçambique tem pouquíssimos produtores locais, essa questão do registro é muito complicada, pois faz com que o país tenha baixa ingerência sobre os ofertantes. A cada compra autorizada, os escritórios de importação são acionados. Esses escritórios, quando conseguem confirmar a compra, saem correndo atrás dos produtores, que podem ou não estar interessados em vender para o país. Moçambique tem uma estrutura tributária muito frágil e uma dependência enorme de doações. 
 
A ideia é propor uma lista viável que permita a compra de produtos de qualidade e sejam ofertados à população. De fato, vimos que existem vários problemas e ouvimos queixas de diferentes ordens no país. Por exemplo, o governo tinha acabado de fazer compras de vários itens da lista anterior, mas daí a lista mudou, e foram retirados dela medicamentos que o governo tinha acabado de comprar ou que estavam em estoque. Foi um dinheiro mobilizado, os medicamentos estavam comprados, e a equipe estava com dificuldade de colocar na rede, pois, na lista anterior, os medicamentos tinham sido retirados. Isso era algo que eles não queriam que se repetisse, nem nós. Sendo assim, fazer uma lista teórica, que fique bem no papel, não é difícil. Difícil é considerar todas essas dificuldades, todo esse contexto do país e fazer uma lista que, de fato, beneficie a população e seja viável. 
 
Rondineli: É importante que eles tenham capacidade autônoma de conseguir executar processos futuros. Essa foi a premissa que conduziu nosso trabalho, e, nas interações, tudo foi discutido coletivamente. O país dava os inputs e recebia orientação. Trabalhamos os documentos de forma compartilhada, de maneira que eles tivessem acesso a todo o processo. A ideia é o país ser protagonista desse processo.
 
Quando o projeto será concluído e qual será a próxima fase da iniciativa?
 
Rondineli: A expectativa é concluir o projeto ainda no primeiro semestre de 2020. A evidência sobre os medicamentos é dinâmica. Constantemente, saem novos estudos. E medicamentos de primeira escolha podem ser substituídos por outros. Ainda que uma boa lista tenha certa estabilidade, há variações com o avanço do conhecimento. Por isso, o ideal é que os países atualizem suas listas a cada dois ou três anos. 
 
A próxima fase será formular os Planos de Implementação e Avaliação da Lista, com o máximo de viabilidade possível. Essa semana, vamos retomar os acordos, envolvendo o escritório na OMS e em Genebra e o Ministério da Saúde de Moçambique, para retomarmos um cronograma para a conclusão do projeto. 
 
Há previsão de ações do NAF para a reestruturação da Política Farmacêutica de outros países de língua portuguesa? Se sim, quais?
 
Vera: Esse componente do nosso trabalho se dá por demanda. Tínhamos uma demanda do Sudão do Sul, mas o país está em guerra. Por isso, a viagem foi desmarcada. Os países fazem a solicitação ao seu Ministério da Saúde, e este nos aciona.
 

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