Pesquisadores questionam lei que encaminha acidentados para hospitais particulares

Para Gisele O’Dwyer, pesquisadora do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde e coordenadora do Projeto Teias Escola-Manguinhos, o poder público tem governabilidade suficiente para encaminhar o paciente para as unidades de saúde. Além disso, medidas dessa abrangência devem ser tomadas de maneira madura e responsável, sem prejudicar a população.
“Na regulação das urgências, é fundamental que as referências hospitalares sejam bem definidas. Preocupa-me como será feita a inclusão dos hospitais privados com capacidade de atendimento de urgência e emergência. O que não pode é o paciente ter responsabilidade pelo hospital para onde será levado. Esse acordo deve ser estabelecido com bastante antecedência, pois é impensável ligar para o plano de saúde no momento de alguma urgência”, alertou.
E completou: “O nível público tem governabilidade suficiente para tomar essa decisão. A regulação da urgência possibilita definir quais hospitais podem ser incluídos. No entanto, o sistema privado fica numa situação muito confortável, porque o serviço que é caro, é de urgência, como um grande trauma ou amputação, é todo feito pela rede pública. O privado se exime dessa responsabilidade. Decisões como essa devem ser tomadas de maneira madura, responsável, sem qualquer risco de prejudicar o paciente.”
Luciana Dias Lima, também pesquisadora do Daps e coeditora do Cadernos de Saúde Pública, considera a medida um ataque à Constituição. “Não há nenhuma evidência de que hospitais privados da rede suplementar no estado do Rio de Janeiro e, particularmente, no município do Rio, tenham melhores condições de atendimento dos pacientes vítimas de acidentes que os hospitais da rede SUS. Duas questões relacionadas à sanção dessa lei me preocupam: primeiro, ela fere o princípio constitucional de que todos têm direito ao acesso ao serviço de saúde. Antes de terem planos de saúde, as pessoas têm direito a acessar esses serviços pelo SUS. Quando o estado sanciona uma lei como essa está indo de encontro com seu dever de assegurar o atendimento adequado dessas pessoas. A crise não pode ser justificativa para isso”
O segundo aspecto diz respeito ao atendimento. “Fico preocupada em relação a forma como será operacionalização essa lei, se as pessoas terão realmente a assistência garantida de forma oportuna. Não me parece claro como a rede privada credenciada ao plano da pessoa acidentada será identificada. Essas informações não estão disponíveis para os profissionais que atuam no Samu e nas ambulâncias que compõem a rede de atenção à urgência no estado do Rio de Janeiro”, admitiu.
Ligia Giovanella, tamvbém pesquisadora do Daps e do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz, corroborou: “Essa medida fere o direito universal à saúde. Além de não desafogar os hospitais públicos, ela coloca os acidentados em risco. O atendimento de urgência deve estar territorializado, com foco na boa agilidade e qualidade. Devemos ter serviços adequados, com equipamentos e equipes médicas especializados na emergência. E os hospitais públicos do Rio de Janeiro são reconhecidos por sua competência. O local para onde o paciente será levado é uma questão técnica, não pode estar baseado nos recursos ou no fato de um indivíduo ser portador ou não de um seguro de saúde, e isso pode prejudica-lo.”
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