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Pesquisadora fala sobre a tuberculose e do título de Benemérito recebido no RJ

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Publicado em:26/05/2014

* Por Manuella Garcia

A médica, docente e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Margareth Maria Pretti Dalcolmo, que já desenvolveu vários projetos com o apoio da Fiotec, recebeu recentemente o título de Benemérito do Estado do Rio de Janeiro. A honraria é um reconhecimento da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) por sua dedicação pessoal e profissional em prol dos cidadãos menos abastados. Especialista em pneumologia clínica, ela dedicou grande parte da sua vida profissional ao estudo da tuberculose, em especial em protocolos de pesquisa e tratamento da doença.

Hoje, Margareth é membro do Comitê Assessor em Tuberculose do Ministério da Saúde e atua no Centro de Referência Professor Hélio Fraga (CRHF), da ENSP/Fiocruz, do qual é criadora. O Ambulatório de Referência Germano Gerhardt, do CRHF, recebe, em média, 150 novos casos de tuberculose multirresistente ao ano.

Em entrevista especial à equipe de Comunicação da Fiotec, a pesquisadora falou sobre a homenagem recebida, explicou as dificuldades do tratamento da tuberculose e comentou a importância da atuação da Fiotec como parceira da Fiocruz.

Qual foi a sensação de receber o título Benemérito do estado do Rio de Janeiro?

Pesquisadora fala sobre a tuberculose e do título de Benemérito recebido no RJMargareth Dalcolmo: A princípio eu fiquei muito surpresa e recebi a honraria como um gesto de generosidade, já que atualmente eu não ocupo nenhum cargo político. Durante os últimos anos, eu colaborei com a Escola do Legislativo, presidida pelo deputado estadual Gilberto Palmares, que foi quem outorgou esse título. Além disso, os deputados acompanharam a criação do Hélio Fraga, que é um ambulatório referência para casos mais complexos de tuberculose e outra micobacterioses. Acho que esse histórico favoreceu para que eles me concedessem essa homenagem, que eu recebi comovida e dediquei aos pacientes, que são o objeto maior de tudo o que nós fazemos.

Por que a tuberculose é uma doença perigosa?

Margareth Dalcolmo: A tuberculose é uma doença perigosa porque é infectocontagiosa, com transmissão de pessoa a pessoa. Ou seja, é o contato humano que cria as condições adequadas para sua transmissão, que está relacionada a alguns fatores individuais (imunidade celular comprometida, por exemplo). A tuberculose também é vista como uma doença de impacto social devido aos fatores ambientais que influem na sua transmissão, como as condições de moradia e saneamento. O Rio de Janeiro, por exemplo, é uma cidade cuja taxa de incidência de 75 por 100 mil habitantes é mais alta do que a média nacional, que é de 38 por 100 mil habitantes. E há determinadas áreas, como a comunidade da Rocinha, em que essa taxa se multiplica três ou quatro vezes e fica semelhante a países asiáticos onde a incidência é muito alta.

Por que as condições de moradia influenciam tanto?

Margareth Dalcolmo: Porque o convívio entre as pessoas é muito mais próximo. Por exemplo: uma casa pequenina, de dois cômodos, que abriga cinco ou seis pessoas. Tanto é que, quando você detecta um caso da doença, não é somente aquele paciente que será tratado. Em média, são examinadas quatro pessoas, entre cônjuges, filhos e pais. Todos eles são submetidos a um teste tuberculínico (purified protein derivative ou PPD) e radiografia do tórax. Se a doença não for detectada bacteriologicamente, radiologicamente ou através do PPD, nós temos a opção de fazer uma profilaxia, que é uma forma que denominamos de tuberculose latente. É a mesma que nós, agentes de saúde, temos. A pessoa toma um dos remédios de combate à tuberculose durante seis meses, mas não faz o tratamento completo.

Quando foi criado o Ambulatório de Referência Germano Gerhardt, do Centro de Referência Professor Hélio Fraga?

Margareth Dalcolmo: Em 1995 nós iniciamos um protocolo para validar um esquema “standard”, padronizado para o Brasil, para tratamento de formas resistentes de tuberculose. Durante cinco anos nós testamos o protocolo aqui no Rio de Janeiro e em outros estados brasileiros (Bahia, Pará, São Paulo e Rio Grande do Sul). Em 2000, o Ministério da Saúde reconheceu esse esquema e, então, nós precisávamos de um local adequado para atuar como realmente uma referência secundária e terciária para os pacientes do Rio. Assim, criamos este local, ainda não adaptado com sistema de biossegurança como é hoje. Paralelamente a isso, o Hélio Fraga, por meio de um acordo de cooperação técnica com um organismo não governamental norte americano, criou um sistema de monitoramento e vigilância epidemiológica no Brasil. Esse foi o que eu chamo o processo de crescimento do ambulatório, que hoje está incorporado à Fiocruz e é um modelo que deve ser seguido. Ele foi descentralizado e existem atualmente outros dois ambulatórios de referência na cidade. Os pacientes são atendidos conforme o local de moradia.

O que caracteriza os casos mais complexos da tuberculose?

Margareth Dalcolmo: São casos que a rede do Sistema Único de Saúde (SUS) não é capaz de resolver, pois exigem uma abordagem mais complexa. Pacientes portadores de HIV, que exigem um tratamento diferente do padrão, pacientes que passaram por transplante de órgãos são imunossuprimidos devido à utilização de medicamentos contra a rejeição, pacientes muito idosos e crianças. Ou seja, é tudo aquilo que sai da rotina e que não pode ser tratado com a dose fixa combinada dos quatro fármacos que compõem o esquema de tratamento da tuberculose no Brasil. Além desses casos, existe um grupo de outras micobactérias causadoras de doenças que se configuram como emergentes no Brasil. Nós aprimoramos nosso banco de dados e os casos são notificados e acompanhados desde o momento que o paciente inicia o tratamento até sua alta, seja aqui ou em qualquer outro ambulatório de referência do Brasil.

Qual é a importância da interdisciplinaridade no tratamento de casos complexos da tuberculose?

Margareth Dalcolmo: O tratamento dos casos complexos não é igual ao padrão, que dura seis meses. O paciente com casos resistentes de tuberculose vai se tratar de 18 a 24 meses e permanecerá em acompanhamento por pelo menos mais três ou quatro anos. Isso exige uma equipe interdisciplinar, composta por médicos, enfermeiros, assistentes sociais, técnicos e pesquisadores, que têm condições de acolher adequadamente um paciente dessa complexidade.

Qual é o papel da Fiotec no apoio ao desenvolvimento dos projetos?

Margareth Dalcolmo: Em um primeiro momento, captamos um recurso alto do Ministério da Saúde para financiamento de 12 subprojetos, desenvolvidos por vários pesquisadores no Brasil, sob nossa coordenação. Todos esses trabalhos, que incluem estudos feitos com comunidades, na área básica, ensino na área de tuberculose, entre outros, já foram concluídos. Sem o apoio da Fiotec, o desenvolvimento teria sido impossível. A Fiocruz, ao prover para nós pesquisadores uma instituição como a Fiotec, ela dá condições de proporcionar a transparência adequada na gestão dos projetos. A Fiotec também tem um papel importante de nos alertar em relação a pontos que, muitas vezes, nós pesquisadores não prestamos muita atenção por estarmos mais preocupados com questões de natureza técnico-científica e acadêmica. Além disso, hoje é muito mais fácil captar recursos em uma instituição internacional, por termos o respaldo da Fiotec na gestão financeira dos projetos. Por isso, sua existência é, sem dúvida nenhuma, preciosa.

(* Por Manuella Garcia é jornalista da Fiotec)


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