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Congresso mundial de nutrição evidencia experiências brasileiras

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Publicado em:09/03/2012

Filipe Leonel

De 27 a 30 de abril, a cidade do Rio de Janeiro sediará mais um evento mundial em 2012, o World Nutrition Rio2012, promovido pela Associação Mundial de Nutrição e Saúde Pública (WPHNA) e a Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco). O evento, junto com a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, coloca a cidade no centro das discussões sobre os campos da saúde pública, meio ambiente e desenvolvimento.

O World Nutrition Rio2012 abordará os enormes e complexos desafios contemporâneos para aqueles que atuam na área de alimentação e nutrição em saúde coletiva, de forma que todas as sessões foram concebidas a fim de garantir o diálogo e o debate, sendo também um espaço para compartilhamento de experiências. O tema geral do congresso é Conhecimento, Política e Ação, o que significa a tradução da melhor evidência para políticas e programas efetivos que protejam, preservem e melhorem a saúde das populações em todo o mundo.

As pesquisadoras da Escola Nacional de Saúde Pública, Rosana Magalhães, do departamento de Ciências Sociais (DCS), e Denise Cavalcante de Barros, do Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição da Região Sudeste (Cecan), irão coordenar duas oficinas preparatórias para o evento mundial, no qual serão discutidos os aspectos da segurança alimentar e nutricional e as questões que envolvem a alimentação e cultura. Em entrevista ao Informe ENSP, elas falaram sobre o momento e as discussões dos campos no país, as contribuições que os estudos brasileiros podem dar aos países visitantes e a posição do Brasil como sede de dois importantes eventos mundiais.

Informe ENSP: O Rio de Janeiro sediará o World Nutrition Rio2012, considerado o mais importante congresso de alimentação e nutrição em saúde coletiva do mundo. Quais os principais objetivos e propostas do evento?

Congresso mundial de nutrição evidencia experiências brasileirasRosana Magalhães: O Congresso Mundial de Nutrição 2012, que será realizado entre os dias 27 e 30 de abril, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), representará um marco no debate nacional e internacional sobre a questão alimentar e nutricional. Frente aos imensos desafios que envolvem a ampliação do direito humano à alimentação, superação do quadro de fome e desnutrição em vários países, além da redução de problemas graves como a obesidade, o evento será um espaço para que múltiplos pontos de vista, abordagens conceituais e metodológicas e também experiências sejam apresentadas e debatidas. Todavia, com diversos pesquisadores renomados e vinculados aos mais importantes centros de pesquisa e formação do mundo, o Congresso será organizado a partir dos seguintes temas: sistemas alimentares justos, políticas de alimentação e nutrição, meio ambiente e segurança alimentar, determinantes e ameaças à saúde, estratégias e intervenções de sucesso, natureza e fortalecimento da nutrição em saúde pública.

Informe ENSP: Quais são as principais discussões a respeito dos campos da alimentação e nutrição atualmente no mundo? Em qual contexto se insere a realização do World Nutrition Rio2012? Quais serão seus principais temas?

Congresso mundial de nutrição evidencia experiências brasileirasDenise Barros: Atualmente, mais da metade da população mundial sofre de algum tipo de problema de nutrição, seja por deficiência, como a desnutrição e carências de micronutrientes, seja por excessos, que se refletem em problemas como obesidade e doenças associadas. Assim, este campo precisa ser pensado para além do cuidado das pessoas com seu corpo saudável e a vida humana. A discussão se volta para o fato de que as políticas devem ser pensadas de modo a contemplar um conjunto de problemas que afetam o mundo e, dia a dia, afetam a biosfera de maneira alarmante, trazendo graves consequências para a vida humana. A discussão deve estar aberta para abarcar todos os problemas que envolvem a alimentação e nutrição dos povos e que precisam ser resolvidos e compreendidos como um conjunto, de modo sistêmico, pois são dependentes um do outro. As questões ambientais, sociais, biológicos entre outras interferem diretamente na situação de segurança alimentar e nutricional das populações, e as políticas devem articular ações voltadas tanto para a produção, acesso e distribuição de alimentos como para seu consumo pela população. Então, será este o contexto em que o World Nutrition será desenvolvido. Contemplando discussões que tragam à tona os problemas, que ajudem na compreensão das diversas interações que envolvem a problemática alimentar e nutricional e mobilizem os pesquisadores, os gestores para atuarem nas diversas esferas de modo integrado, contribuindo para a formulação de políticas éticas, equânimes e abrangentes.

Informe ENSP: Nesta edição, o tema geral do congresso é Nutrição Mundial: Conhecimento, Política e Ação. De que forma esses três campos se inserem nos objetivos do congresso?  

Rosana Magalhães:
A meu ver, há uma feliz associação entre a perspectiva de aprimoramento do conhecimento e a demanda por alternativas políticas efetivas.  Nesse sentido, o tema do congresso chama a atenção para a importância do conhecimento científico combinado à responsabilidade social com a mudança. Sem o engajamento acadêmico e político em torno da alimentação como direito humano, o alcance das iniciativas será reduzido. A segurança alimentar e nutricional não é uma questão isolada ou privilégio para poucos. Ao contrário, é um tema fortemente articulado à saúde, ao ambiente e ao desenvolvimento sustentável global. O aumento da obesidade, a violência da fome, o esgotamento das fontes de energia renováveis, a redução dos recursos hídricos e as ameaças à biodiversidade são faces de uma dinâmica política e econômica cujos impactos transcendem fronteiras regionais ou nacionais. No contexto recente, as mudanças climáticas e as crises econômicas tendem a revelar, de maneira ainda mais contundente, a necessidade de soluções sistêmicas.  Assim, o congresso será um momento rico de reflexão sobre tais questões.

Informe ENSP: A ENSP irá organizar alguns seminários preparatórios para o World Nutrition Rio2012, e vocês estão na coordenação de dois desses eventos. Quais serão seus temas e objetivos? Quais serão suas contribuições para o evento mundial?

Rosana Magalhães:
A Estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional (Esan) apresentada pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) na 37ª sessão do Comitê Mundial de Segurança Alimentar, em Roma, reafirmou como prioridades a promoção do acesso e utilização de alimentos entre os grupos socialmente vulneráveis, a construção de novos arranjos de governança na área de segurança alimentar e nutricional e maior alcance das políticas públicas voltadas ao desenvolvimento social nos territórios. Na oficina Segurança Alimentar e Nutricional na Lusofonia: novos desafios para o PECS, pesquisadores e autoridades de Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Timor Leste, Portugal e Brasil irão discutir as diferentes experiências e buscar avançar em parcerias.

Congresso mundial de nutrição evidencia experiências brasileiras

Em linhas gerais, a perspectiva é analisar possíveis caminhos para a consolidação do direito humano à alimentação nos diferentes contextos. Eu me sinto honrada em participar desta atividade, cuja organização envolve o CRIS e a Universidade de Lisboa, e pretendo contribuir na medida do possível com a reflexão sobre a experiência brasileira em torno da avaliação de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional e combate à fome.

Denise Barros: Além da apresentação de trabalhos científicos avulsos, o Cecan/ENSP irá realizar duas atividades por meio da Rede Interinstitucional de Alimentação e Cultura (Rede A&C), sendo ambas coordenadas por mim e pela pesquisadora Denise Oliveira e Silva da Fiocruz Brasília. A primeira será o Curso Pré-Congresso de Alimentação e Cultura, que pretende oferecer aos participantes a oportunidade de aproximação teórico-metodológica com as Ciências Sociais e Humanas, com vistas a propiciar a reflexão sobre as injunções entre alimentação e cultura, partindo do entendimento de que o ato de comer remete a uma dimensão simbólica, resultado de construções culturais e históricas mais complexas.

A outra atividade será um grupo de trabalho com a temática Resgate e reinvenção de hábitos e práticas alimentares e de identidade corporal na promoção a saúde, que contará com os membros da Rede A&C e pesquisadores nacionais e internacionais das ciências sociais e da saúde coletiva. A discussão a ser iniciada no WNRio2012 buscará encontrar elos entre a tríade biológica-simbólica-cultural da alimentação e do corpo, para contribuir com estratégias de resgate e reinvenção de hábitos e práticas que estão e podem ser transmitidos pela sociedade para a superação dos problemas relacionados ao excesso de peso e obesidade.

Informe ENSP: De que forma um congresso mundial realizado no Brasil pode evidenciar as pesquisas desenvolvidas aqui? Qual a contribuição que o país pode oferecer em relação aos campos da alimentação e nutrição para os países participantes?

Denise Barros:
O Brasil está vivendo um momento político importante. Com a crise mundial, o país está em maior evidência e desperta o interesse de outros países nos acontecimentos e estratégias políticas voltadas para a área econômica e também a social que são desenvolvidas por aqui.  Acredito que a nossa experiência em nutrição em saúde pública é diferenciada pelo fato de termos de lidar com situações extremas, como carências nutricionais e obesidade convivendo em uma mesma família ou comunidade, e onde as pesquisas precisam ser desenvolvidas de modo a compreender todos os aspectos socioeconômicos, ambientais, culturais e biológicos que envolvem essa questão. As trocas de experiências, os espaços de discussão, a transparência desses debates serão a grande contribuição para os participantes.

Rosana Magalhães: O Brasil tem uma longa e rica trajetória de pesquisa no campo da alimentação e nutrição. Com Josué de Castro, médico e sociólogo brasileiro, o tema ganhou enorme repercussão nacional e internacional desde a década de 1930. Nos últimos anos, além da formação de excelentes pesquisadores e centros de pesquisa, o país também tem avançado na implementação de marcos regulatórios, programas e iniciativas no campo da segurança alimentar e nutricional. A experiência brasileira de integração da agricultura familiar ao programa de merenda escolar, determinando que 30% dos alimentos utilizados sejam comprados de agricultores familiares, reflete o processo de construção de estratégias inovadoras na área. A Lei dos Agrotóxicos (Lei nº 7.802, de 12 de julho de 1989 ), que regula  o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos,  também  representa  uma conquista importante, dada a conjuntura em que o país é considerado o maior consumidor de agrotóxicos no mundo. Mas, sem dúvida, nos demais países da CPLP, existem experiências  exitosas, e  esperamos que, nessa oportunidade, seja possível compreender melhor as diferentes dimensões do problema alimentar em cada realidade e, dessa maneira,  favorecer a troca de aprendizados.

Informe ENSP: Em 2012, a cidade do Rio de Janeiro será palco de intensos debates mundiais envolvendo os campos da saúde pública, meio ambiente e desenvolvimento, sendo sede da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) e do World Nutrition Rio2012. Qual a importância para o país em estar no centro dessas discussões? De que forma podem influenciar o desenvolvimento das políticas nacionais?

Rosana Magalhães:
Acredito que o Brasil tem a chance de protagonizar o debate sobre alternativas de desenvolvimento social no contexto contemporâneo. No que se refere à segurança alimentar e nutricional - dimensão crucial do desenvolvimento sustentável -, é fundamental fortalecer as ações de vigilância sanitária dos alimentos, regulamentar a publicidade e propaganda de alimentos e bebidas com baixo teor de nutrientes, excesso de açúcar, gordura saturada e sal, ampliar a informação do consumidor sobre possíveis riscos à saúde de acordo com cada fase do ciclo da vida; apoiar a agricultura familiar e controlar o uso de agrotóxicos. Ao mesmo tempo, é importante ampliar a pesquisa e a avaliação das iniciativas na área, privilegiando múltiplas abordagens metodológicas capazes de combinar dados quantitativos e qualitativos com o objetivo de apreender a complexidade dos diferentes perfis de segurança alimentar. Também é preciso monitorar as cadeias de produção, comercialização e consumo de alimentos. Mudanças efetivas e sustentáveis serão alcançadas através da articulação estratégica e cooperativa em que o horizonte comum seja a busca do desenvolvimento  com foco na qualidade de vida e saúde da população.


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