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Tecnologias assistivas no SUS: ENSP debate equidade, autonomia e direito à participação

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Publicado em:12/08/2025

*Por Tatiane Vargas

Webinário promovido pela ENSP/Fiocruz debateu o papel das tecnologias assistivas na atenção à saúde de pessoas com deficiência, com vozes de quem vivencia e constrói o cuidado na prática.

A Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) realizou nesta quinta-feira (8/8) o webinário Tecnologias Assistivas na Atenção à Saúde, promovido pela Vice-Direção de Atenção à Saúde e Laboratório de Saúde Pública da ENSP (VDAL). A atividade integra a Comunidade de Práticas de Cuidado Integral à Saúde e faz parte da trilha formativa voltada à saúde das pessoas com deficiência, dentro do Programa de Educação Permanente ‘Enfrentando o Racismo, o Cissexismo, o Capacitismo e o Estigma em Saúde Mental’. O debate evidenciou que, apesar dos avanços legislativos e institucionais, as barreiras ao acesso e uso das tecnologias assistivas no SUS ainda são profundas. São necessárias políticas públicas efetivas, formação qualificada de profissionais e o comprometimento com a dignidade, a autonomia e a diversidade das pessoas com deficiência. 

+ Assista, na íntegra, no canal da ENSP no Youtube!


A atividade reuniu a psicopedagoga e ativista Gabriela Pereira dos Santos; o farmacêutico e estudante de Medicina Matheus Oliveira; e a Conselheira Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Rio Grande do Sul, Vitória Bernardes. A mediação ficou por conta da pesquisadora da ENSP Laís Silveira Costa, e a vice-diretora de Atenção à Saúde, Fátima Rocha, participou, ressaltando a importância da Educação Permanente para os profissionais do SUS, especialmente os que atuam na linha de frente nos centros assistenciais da ENSP e da Fiocruz.

Entendendo as tecnologias assistivas: um direito previsto e pouco conhecido

A pesquisadora da ENSP, Laís Silveira Costa, iniciou o webinário contextualizando o conceito de tecnologias assistivas, previsto na Lei Brasileira de Inclusão (LBI) desde 2015. Segundo ela, tecnologias assistivas envolvem produtos, equipamentos, recursos e serviços que promovem autonomia, independência e inclusão social de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.

“Apesar de ser um direito garantido há décadas, o conceito ainda é pouco difundido entre profissionais da saúde”, afirmou Laís. Ela destacou que o SUS só será verdadeiramente universal se atender a todas as pessoas, respeitando suas necessidades específicas.

Laís também reforçou que as tecnologias assistivas vão muito além de próteses e cadeiras de rodas. São incluídas formas de comunicação acessível, como a Língua Brasileira de Sinais (Libras), braile, linguagem simples e sistemas de comunicação aumentativa e alternativa. “É fundamental qualificar os trabalhadores da saúde para que conheçam e saibam garantir o acesso a essas tecnologias, superando visões limitadas e preconceituosas.”

A urgência da acessibilidade comunicacional: o direito à escuta da pessoa surda

Matheus Oliveira, farmacêutico e estudante de Medicina, compartilhou suas experiências como pessoa surda enfrentando as barreiras de comunicação no SUS. Ele destacou a escassez de intérpretes de Libras nas unidades de saúde e as limitações das ferramentas tecnológicas atualmente disponíveis, como aplicativos de tradução por vídeo.

“Libras não é só uma linguagem, é uma cultura e uma vivência. A ausência de intérprete configura uma forma de violência”, afirmou Matheus, que apontou a falta de preparo dos profissionais da saúde para comunicação inclusiva e o impacto disso no cuidado.

Ele ressaltou também os problemas estruturais, como conexão de internet ruim em hospitais, que comprometem o uso de tecnologias digitais, e a necessidade de formação em Libras para médicos e enfermeiros. “Não podemos esperar. A comunicação é o principal instrumento de respeito no cuidado em saúde”, concluiu.

A realidade das famílias afroatípicas e o direito à acessibilidade integral

A psicopedagoga e ativista Gabriela Pereira dos Santos trouxe à tona a vivência das famílias afroatípicas — aquelas formadas por pessoas negras, indígenas e com deficiências múltiplas. Autista e com TDAH, ela falou sobre o capacitismo estrutural e o racismo que permeiam o atendimento no SUS.

Gabriela destacou o uso do colar de identificação para pessoas com deficiências ocultas, como ela e seu filho, que têm autismo, surdez e outras condições. “Tecnologia assistiva não é só equipamento caro. Comunicação alternativa, acessibilidade e adaptações simples também são tecnologias assistivas essenciais, sobretudo para pessoas periféricas e negras.”

Ela criticou a falta de formação dos profissionais em comunicação inclusiva e o desconhecimento sobre as diversas formas de expressão além da oralidade. Gabriela ainda denunciou a desinformação sobre direitos, dificuldades no uso de filas preferenciais e ambientes muitas vezes pouco acolhedores e desreguladores para pessoas autistas e surdas.

Com relato comovente, mostrou como, com diálogo e preparo, o atendimento pode ser humanizado e eficiente, garantindo o direito à saúde com respeito à diversidade funcional.

“Tecnologia assistiva é direito, não mercadoria”: a luta por equidade no SUS

Vitória Bernardes, conselheira estadual dos direitos da pessoa com deficiência do Rio Grande do Sul e integrante da Coordenação-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde, fechou o evento destacando a importância da equidade no SUS.

Ela explicou que o que une as pessoas com deficiência é a opressão estrutural e que a equidade exige acesso a recursos específicos para garantir participação e autonomia iguais às de pessoas sem deficiência.

Vitória defendeu o acesso às tecnologias assistivas, como cadeiras de rodas motorizadas, como elementos que respeitam e ampliam as funcionalidades corporais, e não meras compensações. “A ausência dessas tecnologias é violência institucional.”

Ela denunciou critérios arbitrários e a demora no fornecimento de órteses e próteses, ressaltando a urgência de transparência e agilidade no acesso. Para Vitória, a tecnologia assistiva deve ser vista como direito e não como produto de mercado, e a soberania nacional na produção de equipamentos é estratégica para garantir esse acesso. Ela finalizou lembrando que acessibilidade beneficia toda a sociedade, e que a luta por inclusão deve puxar “todo mundo junto”.

O webinário evidenciou que, apesar dos avanços legislativos e institucionais, as barreiras ao acesso e uso das tecnologias assistivas no SUS ainda são profundas. São necessárias políticas públicas efetivas, formação qualificada de profissionais e o comprometimento com a dignidade, a autonomia e a diversidade das pessoas com deficiência.

"A ENSP/Fiocruz reafirma seu compromisso com a promoção da saúde integral e a inclusão, atuando para que a educação permanente e o debate crítico sobre o tema sejam ferramentas de transformação no cuidado à saúde", concluiu Fátima Rocha, vice-diretora da Vdal/ENSP. 



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