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Em webinário internacional, especialistas alertam para desafios na governança Indígena em saúde

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Publicado em:06/06/2025
Por Danielle Monteiro

Os desafios da governança Indígena em saúde, a atuação de instituições brasileiras e canadenses na área da saúde de povos Indígenas e o papel da cooperação internacional no enfrentamento às iniquidades inerentes a essa população foram os destaques do webinário ‘Governança Indígena no SASI-SUS e Atenção Primária a Saúde nos territórios Indígenas no Brasil’, promovido nesta terça-feira (3). Fruto de parceria entre a ENSP e o Centro para Ação Colaborativa em Governança Indígena em Saúde, da Universidade Simon Fraser (SFU), do Canadá, o evento reuniu diversos especialistas em saúde Indígena. O encontro contou com o apoio da Vice-Presidência de Atenção, Ambiente e Promoção da Saúde (VPAAPS/Fiocruz) e da Secretaria de Saúde Indígena (SESAI/MS). 

A coordenadora do webinário e pesquisadora da ENSP, Ana Lucia Pontes, que, desde agosto do ano passado, atua como professora visitante na Faculdade de Ciências da Saúde da SFU, explicou que o objetivo do encontro é criar um momento de perspectivas colaborativas entre Brasil e Canadá na área de Saúde de Povos Indígenas. Ana Lucia destacou, como seu trabalho de rotina no Canadá, o reconhecimento do território de estudo em Vancouver e também agradeceu aos povos Indígenas do Brasil pela proteção milenar do território nacional. Ela discorreu, ainda, sobre o contexto do diálogo com a Universidade Simon Fraser, o qual, segundo ela, remete a uma trajetória de décadas de relações entre a Fiocruz e pesquisadores canadenses. 

Conforme destacou a pesquisadora, esse é o primeiro dos seis webinários que serão realizados sobre Governança Indígena. Os encontros vão debater questões como a necessidade de fortalecimento de Ações Afirmativas na graduação e pós-graduação em Saúde Coletiva específicas para Indígenas; a falta de representatividade de Indígenas nas instituições acadêmicas e em seus quadros permanentes de tomada de decisão;  a necessidade de rediscutir protocolos e rotinas de Ética em Pesquisa no contexto dos Povos Indígenas; a falta de mecanismos para financiamento direto para pesquisadores e coletivos Indígenas para a produção de conhecimento; e o fortalecimento das medicinas e ciências Indígenas e da gestão Indígena nas políticas públicas.

Em seguida, a diretora do Centro para Ação Colaborativa em Governança Indígena em Saúde (CCAIHG), da Universidade Simon Fraser, Krista Stelkia, traçou um panorama do contexto dos povos Indígenas no Canadá. Ela explicou que um dos trabalhos nacionalmente desenvolvidos envolve o reconhecimento dos territórios ancestrais dos povos Musqueam, Squamish e Tsleil-Waututh. No país, existem 1,8 milhões de povos Indígenas, o que equivale a 5% da população canadense. 

Krista também apresentou as ações lideradas pelo CCAIHG. Liderado por Indígenas, o Centro fomenta o diálogo global das abordagens Indígenas referentes à saúde e bem-estar no contexto da governança em saúde desses povos. Ela mencionou que um dos grandes projetos do CCAIHG foca no Programa de Ambientes de Rede para Pesquisa em Saúde Indígena (NEIHR), dos Institutos Canadenses de Pesquisa em Saúde (CIHR). Entre as iniciativas lideradas pelo Centro, Krista citou o projeto de cooperação global voltado ao povo Indígena ’Arramat', que visa o apoio à conservação e às relações sustentáveis de biodiversidade. “O valor da parceria internacional está em compartilhar práticas promissoras e evidências para tratar iniquidades na saúde enfrentadas pelos povos Indígenas, ligadas ao colonialismo, racismo estrutural e governança interrompida. Colaborações como essa com a ENSP podem ajudar a ampliar as abordagens lideradas por Indígenas, avançar na autodeterminação Indígena na pesquisa e inovar em caminhos para abordar as iniquidades em saúde de longa data enfrentadas por esses povos”, concluiu.

Posteriormente, a secretária adjunta da Secretaria de Saúde Indígena (SESAI), Lucinha Tremembé, traçou um panorama da história do órgão, que é responsável pela implementação e execução da Política Nacional de Atenção à Saúde dos povos Indígenas (PNASPI) e, ainda, pela coordenação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena no SUS. Conforme ela relatou, existem, no Brasil, cerca de 1.693.535 milhão de Indígenas, dos quais 800 mil são atendidos pelo SasiSUS.

Entre os principais êxitos da SESAI, Lucinha citou a ampliação de consultas prévias, a descentralização de soro antiofídico, a mudança na estrutura do órgão, a implantação da assistência da saúde Indígena no Piauí e Rio Grande do Sul, a construção do Plano Distrital de Saúde Indígena, entre outros. 

Em seguida, a chefe do Departamento de Atenção Primária à Saúde Indígena da SESAI, Putira Sacuena, falou sobre a organização da Atenção Primária nos territórios Indígenas, discorrendo sobre o seu fundamento legal, os princípios da PNASPI e a estrutura organizacional do SasiSUS. Nesse contexto, ela destacou a gestão participação e o controle social como marcos da governança do Subsistema de Saúde Indígena. 

Entre os resultados alcançados pelo departamento, Putira elencou a redução da mortalidade infantil; o incremento no esquema vacinal completo; a implantação de rede física e tecnológica em áreas remotas; a formação e capacitação de agentes Indígenas de saúde; e o aumento do quantitativo de profissionais de saúde. Como desafios estruturais, ela citou a logística e mobilidade em regiões de difícil acesso; a carência de profissionais fixos e especializados; e a limitação da integração intersetorial. Conforme relatou Putira, entre as perspectivas de fortalecimento e cooperação internacional, está a ampliação de mecanismos de contratualização por resultados; o fortalecimento de ações intersetoriais com ênfase nos Determinantes Sociais da Saúde; o intercâmbio internacional para boas práticas; e o investimento contínuo em formação técnica intercultural e formação tecnológica. 

Putira citou a consolidação da governança Indígena em saúde como o desafio do século 21 e defendeu que a Atenção Primária em territórios Indígenas requer um modelo próprio, institucionalmente assegurado, assim como política pública permanente e espaço decisório Indígena. “A experiência brasileira demonstra que uma Atenção Primária em territórios Indígenas não pode ser mera extensão do SUS convencional”, alertou. 

O representante do coordenador de Participação e Controle Social na Saúde Indígena da SESAI, Marcos Pádua, explicou como é estruturado o controle social na saúde Indígena, o qual é composto pelos Conselhos local e Distrital de Saúde indígena e o Fórum de Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde indígena. Ele explicou que, entre as atribuições da Coordenação-Geral de Participação e Controle Social na Saúde indígena, está o planejamento, a coordenação, a orientação, a avaliação, o monitoramento e a implementação de ações para o fortalecimento das estruturas das instâncias de participação e controle social no SasiSUS. As responsabilidades do departamento também envolvem o apoio à realização de plenárias, a promoção de capacitação de conselheiros, a produção de informações sobre controle social, entre diversas outras. 

Com o intuito de contextualizar as dificuldades enfrentadas por gestores Indígenas, a pesquisadora do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/ Fiocruz Amazônia), Luiza Garnelo, apresentou um diagnóstico elaborado a partir de resultados de pesquisas sobre governança Indígena nas políticas públicas e na produção de conhecimento. 

Entre as especificidades e contradições na gestão do SasiSUS, ela citou fatores como o acúmulo de atribuições de gestão e execução de atenção à saúde na contramão da política oficial do Ministério da Saúde; processos de planejamento, gestão e prestação de contas inadequados às necessidades de prestação de serviço em terras Indígenas; tarefas de gestão fortemente oneradas pelas múltiplas e recorrentes situações emergenciais nas terras Indígenas; além da escassez de análises sistemáticas da produção de dados realizada por profissionais e gerentes, assim como a sua aplicação no aprimoramento das ações de planejamento e avaliação. Outro desafio destacado pela pesquisadora diz respeito à interculturalidade, que, segundo ela, apesar de ser premissa crucial do SasiSUS, pouco tem avançado para além da recomendação e para uma implantação efetiva de ações rotineiras nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI). A pesquisadora também elencou alguns desafios na formação e qualificação de profissionais Indígenas para gestão, gerência e assistência. 



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