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Fórum discute interseccionalidades entre deficiência, raça, gênero e favela

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Publicado em:24/08/2023
Por Danielle Monteiro

As interseccionalidades entre deficiências e as questões de raça, gênero e favela foram a pauta do Fórum Interfavelas A vivência da deficiência em territórios vulnerabilizados, realizado no dia 18 de agosto, na ENSP. O evento é fruto de parceria da Escola com a Coordenação de Cooperação Social da Fiocruz e a organização da sociedade civil Acolhe - Acessibilidade, direitos e saúde. O encontro integra o projeto Pessoas com deficiência, território e políticas públicas, que acontece especialmente nos territórios das comunidades Bernardino Fonseca, em Niterói; Jardim Catarina, em São Gonçalo; Bacia do Éden, em São João de Meriti; e Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha, Rio de Janeiro.  


Presente à mesa de abertura, a vice-diretora de Ambulatórios e Laboratórios da ENSP, Fátima Rocha, reforçou o compromisso da Escola com a construção da política voltada para pessoas com deficiência e alertou para a necessidade de mais ações direcionadas a essa população: “O Brasil teve um papel muito importante quando pensamos na questão da área de gênero e de orientação sexual. Tivemos um programa que foi referência mundial, o programa de HIV/Aids. Ele teve uma importância estratégica no mundo, garantindo acesso, respeito às diferenças, e com os direitos humanos como centro da discussão voltada para essa população vulnerabilizada. Mas, não fizemos quase nada em relação às pessoas com deficiência. Isso só demonstra que precisamos caminhar e avançar no fortalecimento das políticas públicas”, afirmou.

Em seguida, o coordenador de projetos da Cooperação Social da Presidência da Fiocruz, Gabriel Simões, comentou que o órgão desenvolve projetos territorializados, voltados e construídos de forma compartilhada com populações em territórios vulnerabilizados nacionalmente. Ele contou que a Cooperação Social tem 34 projetos em andamento, além das parcerias em apoio a iniciativas de outras unidades da Fiocruz, que são organizados em seis áreas: Juventude; Educação; Cultura; Comunicação; Desenvolvimento de Territórios Saudáveis e Sustentáveis; e Direitos Humanos. “O Fórum faz parte de um dos projetos desenvolvidos em parceria com a ENSP, chamado Pessoas com deficiência, territórios e políticas públicas. É mais um projeto da área de Direitos Humanos. Ele é especial, especialmente para mim, por ser eu uma pessoa com deficiência e muito implicada nessa causa”, disse.

Pesquisadora da ENSP e coordenadora do projeto Pessoas com deficiência, território e políticas públicas, Laís Silveira Costa destacou que a Escola vai incorporar, definitivamente, em seu calendário, o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, celebrado em 21 de setembro, e realizará uma ação cidadania na Maré, no dia 23 do mesmo mês. Ela relembrou que foi a primeira vez, na história do SUS, que houve uma Conferência Livre Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência e chamou a atenção para a violação de direitos humanos dessa população. Laís também destacou que encontros como o debate sobre aleitamento materno inclusivo, realizado no mesmo dia, são uma oportunidade de se começar a constituir outra narrativa no serviço de saúde. “Quem tem deficiência, ou familiar com deficiência, sabe que nada é mais desumanizador e angustiante do que o sistema de saúde. Ele é capacitista, não te enxerga como pessoa, não enxerga a pessoa além da deficiência e nem a deficiência ele enxerga direito, pois não cuida direito”, afirmou.

Em seguida, a pedagoga Graciane Volotão, do Coletivo Ela, afirmou que o projeto Pessoas com deficiência, território e políticas públicas é uma grande oportunidade de se fazer grandes diferenças nos territórios e movimentos pelos direitos e pelas políticas públicas para as pessoas com deficiência: “Faremos muito barulho, é o que esperamos”.

Posteriormente, a representante do Coletivo Vidas Negras com Deficiência Importam (VNDI), Luciana Viegas, explicou que o coletivo desenvolve um trabalho de construção política na abordagem interseccional, sendo um movimento de pessoas com deficiência, negras ou brancas, que estão na favela. 

Fundadora do projeto Marias em Manguinhos, Norma Souza contou que foi mãe de pessoa com deficiência vítima de erro médico, o que a motivou a criar o projeto, que atualmente engloba 400 mulheres unidas pela luta do direito da pessoa com deficiência. “Não queremos mais políticas públicas, pois já temos demais. O que queremos é que as políticas que já existem se façam valer, e que todo o poder público de qualquer esfera de governo possa fiscalizá-las, de alguma maneira, para que elas cheguem a nós com equidade”, declarou.

Deficiência, raça, gênero e favela

Idealizadora do Papo Reto Defiça, Taiane Maquês falou sobre deficiência e favela. Ela trouxe relatos de sua infância como cadeirante e atentou para os desafios dessa interseccionalidade e para a necessidade de popularização do debate sobre essas temáticas: “A minha deficiência precisa de suporte. Existem muitas políticas e projetos, mas esse discurso não chega na favela, na baixada. Eu tive o privilégio de conhecer pessoas que me ajudaram, mas nem todos têm essa oportunidade. Não adianta ter leis e políticas se, quem mais precisa, não sabe acessar. É importante termos pesquisas e buscar dados, mas é importante falarmos com essas pessoas, pois, somente assim, haverá mudanças”.

Em sua apresentação sobre a interseccionalidade entre gênero e deficiência, a diretora da Associação dos Deficientes Visuais do Estado do Rio de Janeiro (Adverj), Fernanda Shcolnik, atentou para a exclusão das mulheres com deficiência moradoras de favelas. Ela contou que um estudo recente apontou que 70% das pessoas com deficiência não possuem Ensino Fundamental completo. “Quando sai, ou se sai da escola, a pessoa com deficiência é jogada para as margens da sociedade, para um trabalho precarizado, em trabalhos informais, sem nenhum direito trabalhista”, observou. Segundo Fernanda, nesse cenário, as mulheres são duplamente atravessadas, por terem deficiência e serem mulheres, sendo, assim, vítimas do machismo e capacitismo. Além das questões relacionadas a trabalho, saúde e educação, as mulheres com deficiência estão também mais expostas à violência, conforme atentou Fernanda: “Temos dados de 2021 que mostram que, a cada hora, existe um registro de violência de uma pessoa com deficiência, sendo a grande maioria delas mulheres dentro de seus domicílios. Ou seja, mulheres com deficiência que não têm condições de se defender diante de um agressor. Mulheres com deficiência são duplamente vulneráveis e sofrem violências para às quais tem certo risco”. Fernanda reforçou, ainda, a importância da implementação da educação de gênero nas escolas, para proteger meninas e mulheres, e de políticas públicas na prática.



Por fim, a representante do Coletivo Vidas Negras com Deficiência Importam (VNDI), Luciana Viegas, discorreu sobre raça e deficiência. Ela defendeu a criação de estratégias e táticas para a defesa de direitos e atentou para o impacto da colonização sobre a vida de pessoas negras moradoras de favela e com deficiência. “Quando falamos de pessoas negras com deficiência, o primeiro ponto é que não tinha dados. O segundo ponto é que essa colonização, que até um tempo atrás tinha um nome (portugueses, europeus), se torna hoje um Estado que não somente impacta diretamente a vida dessas pessoas, por meio da ausência de direitos, o que, por si só, já é uma violência, mas impacta também com a produção de deficiências gerada pela sua violência”, observou. Por esse motivo, segundo Luciana, o debate sobre raça e deficiência precisa caminhar junto, pois, é por meio da discussão sobre deficiência que é possível entender, de fato, o que é a abordagem interseccional e o que é debater deficiência.




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