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Jornalismo científico investigativo na formulação de políticas públicas: jornalistas falam sobre o tema

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Publicado em:31/10/2022

A última edição do Centro de Estudos Miguel Murat de Vasconcellos da ENSP (Ceensp) teve como tema Os desafios e respostas provocadas pelo jornalismo científico investigativo na formulação de políticas de saúde pública: o caso do tabaco. A sessão foi organizada pelo Centro de Estudos sobre Tabaco e Saúde da ENSP (Cetab) e recebeu como convidados os jornalistas do Cetab, Luiz Guilherme Hasselmann e Raquel Torres, além de Maíra Mathias, jornalista investigativa do site O Joio e O Trigo, e a analista da UFRJ, Thaysa Nascimento.


Os convidados falaram sobre o papel do jornalismo investigativo na divulgação de pautas de interesse da sociedade, mas que sofrem interferências devido à atuação da indústria. Durante o Ceensp, foi debatido, especificamente, o caso do tabaco e da interferência dessa indústria na formulação de políticas públicas. A atividade esteve sob a coordenação da pesquisadora do Cetab/ENSP, Silvana Rubano Turci, e mediação da também pesquisadora do Centro de Estudos sobre Tabaco e Saúde, Vera da Costa e Silva.


Maíra Mathias, jornalista investigativa do site O Joio e O Trigo, iniciou sua apresentação contando um pouco da história do site, especializado na cobertura investigativa do poder privado, ou seja, grandes corporações que interferem diretamente na formulação de políticas públicas.

O principal foco de O Joio e O Trigo é a indústria dos alimentos ultraprocessados, conhecida como indústria dos alimentos, que se espalhou pelo mundo nas décadas de 1960 e 1970. O site acompanha as estratégias dessa indústria e como elas se conectam com o agronegócio. Segundo Maíra, o site também investiga a indústria do tabaco, como parte de um projeto inicial da página. 

Algumas diferenças entre o jornalismo factual e o investigativo foram pautadas brevemente pela jornalista, que ressaltou que, para fazer jornalismo investigativo, é necessário ter uma boa equipe, tempo para a investigação, além de recursos financeiros disponíveis. Maíra trouxe para o debate, no contexto dos temas discutidos pelo Cetab/ENSP, a questão da conquista de novos públicos, tais como o dos Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs).

“A Agência Nacional de Vigilância Sanitária manteve a proibição e reforçou a fiscalização em articulação com outros órgãos. No entanto, a indústria, com seus interesses econômicos, usando de suas estratégias, enviou um ofício à Anvisa contrariando as proibições e se utilizando da imagem de pessoas com grande influência para isso.” A cooptação de pessoas com grande influência é uma estratégia comum da indústria do tabaco, por exemplo, explicou a jornalista investigativa. 

Segundo ela, uma das características do jornalismo investigativo é dar subsídios em pontos- chave que atuem fazendo pressão política. “As matérias investigativas causam desconforto, ajudam a pressionar, com informação de qualidade e muito bem apurada, a indústria na formulação e aprovação das políticas públicas, pois a indústria tem poder pra influenciar e mudar as políticas”, advertiu Mathias.

Por fim, a jornalista pontuou que são poucos os veículos que conseguem praticar o jornalismo investigativo, já que ele exige trabalho de uma boa e grande equipe para as coberturas, pois é muito complexo, além de necessitar de bons recursos financeiros.

Dando continuidade ao debate, a jornalista do Centro de Estudos sobre Tabaco e Saúde, Raquel Torres, abordou, em sua apresentação, o jornalismo investigativo do ponto de vista institucional, no âmbito do trabalho, desenvolvido por ela como jornalista do Cetab/ENSP. Segundo ela, o Cetab atua na produção de conhecimento, com a divulgação de conteúdo nas redes, a produção de reportagens investigativas, além de relatórios e artigos científicos.

“Nosso papel é produzir conhecimento e oferecer subsídios para quem trabalha ou se interessa pelo tema. Fazemos varreduras constantes e trabalhamos nas redes nos aproximando de quem atua no tema”. Raquel apresentou também a Convenção Quadro para o Controle do Tabaco, (CQCT/OMS), que enfatiza a necessidade da adoção de medidas para monitoramento das atividades da indústria do tabaco a fim de proteger as políticas públicas de saúde.

A Convenção é assinada por mais de 180 países, os quais se comprometem a implementar os artigos. Porém, de acordo com a jornalista, eles não são implementados com tanto sucesso pelos países, como é o caso dos artigos 17 e 18, e necessitam ser reforçados.

“Esses artigos falam da necessidade de proteger o ambiente e os trabalhadores no ciclo produtivo do tabaco, oferecendo alternativas de produção para os trabalhadores dessa área. No Cetab, temos um Centro de Conhecimento cujo papel é apoiar o secretariado da Convenção Quadro a fazer com que os países-membros do acordo implementem os artigos 17 e 18”, explicou. 

O também jornalista do Cetab/ENSP, Luiz Guilherme Hasselmann, apresentou o projeto Stop (Stopping Tobacco Organizations and Products), que traz a publicação de relatórios sobre a interferência da indústria do tabaco em quatro temas específicos: DEFs, comércio ilícito, Agenda 2030 e trabalho infantil.

“O projeto visa mostrar como a indústria do tabaco se utiliza de estratégias de responsabilidade social corporativa para se colocar como parceira na busca pela solução desses problemas, quando, na verdade, ela é parte integrante", reforçou. Ele atua com campanhas informativas nas redes sociais, informando ao público e à sociedade como a indústria age, além de contestar as principais estratégias e manobras que visam à manutenção dos seus produtos no mercado. 

Hasselmann explicou que um número crescente de empresas, em todo o mundo, vem se esforçando para incorporar a responsabilidade social corporativa (RSC) em vários de seus negócios; porém, não existe consenso na definição do termo RSC. "Entretanto, autores sugerem que as definições se referem aos esforços das empresas para servir à sociedade e ao meio ambiente, de modo que vá além do que lhes é legalmente exigido", detalhou ele. 

Nessa perspectiva, o projeto fomenta a discussão para examinar os resultados e identificar novas abordagens a fim de neutralizar a influência da indústria do tabaco, além de informar os tomadores de decisão sobre as estratégias envolvendo a população brasileira na geração de respostas de saúde pública.

O jornalista destacou que "apesar de as empresas faltarem com o compromisso com a vida e a saúde de fumantes e não fumantes, elas, de fato, melhoram a sua reputação, imagem e credibilidade por meio das ações de RSC, a ponto de serem reconhecidas como empresas éticas", lamentou. 

Por fim, Thaysa Nascimento, analista da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), apresentou uma pesquisa que analisou a utilização das mídias sociais nas buscas ou interações sobre cigarro tradicional e Dispositivos Eletrônicos de Fumar (DEFs).

O estudo utilizou um conjunto de técnicas qualitativas para buscar rastros nas buscas das redes sociais. Segundo a analista, a fase exploratória da pesquisa foi realizada com base no rastro do conteúdo do Instagran e Youtube. A pesquisa mostrou que, em ternos de cigarros tradicionais, pouco conteúdo foi encontrado. Em se tratando dos DEFs e Vapes, constatou-se a produção de conteúdo articulada. “Percebemos que os cigarros tradicionais e os eletrônicos são duas categorias que se comportam de forma muito diferente nas redes sociais”, explicou ela.

Com relação à produção de conteúdo articulado dos DEFs, Thaysa exemplificou que, nas buscas sobre o conteúdo, foram identificados quatro tipo de influenciadores falando sobre os Dispositivos Eletrônicos de Fumar, entre eles: influenciador gamer; influenciador cientista (que apontam especificidades técnicas dos DEFs); influenciador comunal (que promovem resenhas sobre DEFs e juices); e influenciadores ativistas (que saem em defesa dos DEFs e chamam a comunidade para isso).

Por fim, a analista expôs que, como resultado da pesquisa, ficou claro que o cigarro tradicional não possui um conteúdo profissional nas redes sociais. Já o conteúdo dos DEFs é profissional, além de ser utilizado para fazer a defesa positiva dos Vapes nas redes sociais.

Assista, abaixo, o Ceensp na íntegra. 


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