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Covid-19: Estudo analisa depressão, ansiedade e estresse entre trabalhadores de unidades de saúde

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Publicado em:18/03/2022

Um estudo, com participação da ENSP, analisou as associações entre a percepção de risco de adoecimento por Covid-19 e os sintomas de depressão, ansiedade e estresse em profissionais atuantes em unidades de saúde de diversas categorias profissionais que buscaram voluntariamente um dos primeiros Centros de Referência em Testagem no Município do Rio de Janeiro. Do total de 2.996 investigados, 81,5% eram mulheres com idade média de 40 anos. Cerca da metade apresentava grau leve, moderado ou severo de depressão, ansiedade ou estresse, sendo a frequência de trabalhadores com sintomas severos, respectivamente, 18,5%, 29,6% e 21,5%. “Eles vivenciam não apenas o medo de ser infectado, adoecer e morrer, como também o medo relacionado ao risco de infectar outras pessoas.” Os autores, Aline Silva-Costa, Rosane Harter Griep e Lúcia Rotenberg, publicaram artigo em Cadernos de Saúde Pública.
 
A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou, em janeiro de 2020, que o surto da Covid-19 constitui uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII), o que foi logo depois caracterizado como pandemia. Com o contínuo aumento do número de casos graves, hospitalizações e óbitos relacionados à doença, foram adotadas estratégias para reduzir o risco de exposição ao vírus por grande parte da população, como o distanciamento social. No entanto, em direção oposta, os trabalhadores de serviços de saúde, em especial os profissionais que prestam assistência, constituem o grupo mais vulnerável à infecção pelo SARS-CoV-2.


De acordo com o artigo referido, nesse contexto, um inquérito sobre a percepção de risco e preocupações entre profissionais da saúde durante a pandemia da Covid-19 mostrou que 59,2% dos trabalhadores referiram alta percepção de risco de serem infectados. De forma semelhante, 35,5% dos trabalhadores da saúde referiram que seu local de trabalho apresentava maior risco de infecção do que outros locais.


Segundo os autores, além de mudanças no ritmo e estilo de vida, e da sobrecarga de trabalho durante a pandemia, as preocupações com o risco de infecção podem contribuir para diversos problemas relacionados à saúde mental entre os profissionais de saúde. Assim, este grupo vivencia não apenas o medo de ser infectado, adoecer e morrer, como também o medo relacionado ao risco de infectar outras pessoas. Ademais, a pandemia impôs a necessidade de seguir protocolos que se modificam rapidamente dado o desconhecimento da patologia. Este contexto de extrema pressão favorece dilemas éticos e morais, que contribuem para o desgaste emocional enfrentado pelos trabalhadores.


De fato, revisão sistemática recente mostrou elevada prevalência de ansiedade durante a pandemia da Covid-19, porém sem diferenças entre trabalhadores nos diversos continentes, evidenciando que a ansiedade relacionada à doença entre profissionais de saúde independe do contexto cultural. Os autores reforçam ainda que a identificação de diversos fatores de risco no trabalho, incluindo os psicossociais, devem ser priorizados nos estudos relacionados à saúde mental, a fim de contribuir para o desenvolvimento de estratégias de prevenção e tratamento destes trabalhadores.
 
As profissões mais frequentes do estudo foram técnicos/auxiliares de enfermagem (27,9%), enfermeiros (23,1%), médicos (7,4%) e outros profissionais de saúde de nível superior (23,1%). A maioria trabalhava em hospitais (51,8%), sejam hospitais especializados (27%) ou hospitais gerais (24,8%). O total de 11,4% trabalhavam em UBS e 11,1% em policlínicas ou clínicas especializadas.


O artigo também relata que estudos sobre o sofrimento mental durante a pandemia têm mostrado elevadas taxas de adoecimento, principalmente, entre os profissionais de saúde. De forma semelhante ao observado neste estudo, artigo de revisão sobre a saúde mental de trabalhadores da saúde mostrou prevalências de sintomas de ansiedade que variam entre 44,6% e 62%; cerca de 30% tinham nível moderado ou grave de ansiedade. Cerca de 50% dos profissionais de saúde apresentou sintomas depressivos. Já um inquérito com profissionais de enfermagem de serviços de saúde de média e alta complexidade mostrou que 39,6% e 38% apresentaram, respectivamente, sintomas severos de ansiedade e de depressão. Uma revisão sistemática com metanálise para avaliar a ansiedade nos profissionais da saúde durante a pandemia da Covid-19 mostrou que a prevalência geral de ansiedade (leve, moderada e grave) foi de 35%, variando de 7% a 70,8%. Essa variação pode decorrer de diferenças de contextos culturais ou de métodos na avaliação dos sintomas.


Os autores destacam ainda que o estudo abordou os trabalhadores na primeira fase da epidemia, momento de muita tensão e medo diante do novo contexto. O estresse crônico e a elevada carga física e mental dos trabalhadores tendem a se perpetuar ao longo do tempo. Os profissionais de saúde, principalmente quando em contato direto com pacientes infectados, precisam ter sua saúde mental monitorada com regularidade. No entanto, não foi possível monitorar a percepção de risco e a saúde mental nos diversos momentos da pandemia, que se alastrou de forma muito especial, com patamares elevados de morbimortalidade no Brasil. No contexto brasileiro de crise política, econômica e social, a ausência de um alinhamento entre as recomendações da OMS e as medidas adotadas no país dificultou o controle da pandemia no país, contribuindo para o sofrimento mental da população. Além disso, a vacinação tardia (quando comparada a outros países) também pode ter afetado a percepção de risco e a saúde mental dos trabalhadores de maneira muito mais severa do que aquela captada nos achados apresentados. Estudo sobre a saúde mental de enfermeiros sugere que ser vacinado garante não apenas a proteção imunológica contra o vírus, mas pode também reduzir o medo e a preocupação de se infectar ou infectar outras pessoas e, portanto, reduzir a chance dos sintomas analisados neste artigo.


Por fim, o artigo alerta sobre a associação entre a alta percepção de risco de adoecimento e o agravamento do sofrimento mental aponta a demanda por medidas de proteção à saúde dos trabalhadores. Tais medidas não devem se restringir à disponibilização de equipamentos de proteção individual (EPIs), treinamento e apoio psicológico, que são imprescindíveis, como aponta a literatura de forma unânime. É essencial que os gestores busquem promover espaços coletivos de discussão sobre o trabalho na própria unidade, além de ações que favoreçam a recuperação dos trabalhadores, como maior número de folgas, novas contratações e locais adequados para a alimentação e repouso, medidas que potencialmente reduzem o impacto à saúde mental dos profissionais de saúde. Trata-se de valorizar a força de trabalho em uma situação de extrema sobrecarga física e mental decorrente do excesso de demandas conjugado ao afastamento de colegas por adoecimento e à sensação de impotência diante da doença, com potenciais riscos psíquicos.


“Neste contexto, os profissionais da saúde se ressentem da pouca preocupação da gestão com a saúde dos trabalhadores, mesmo em situações em que estes adoecem por Covid-19, ressaltando que são procurados apenas para confirmar seu retorno à atividade, e não para acompanhar seu estado de saúde. Em suma, em um contexto pandêmico de longa duração, somente uma força de trabalho bem atendida do ponto de vista da organização do trabalho e de ações em saúde do trabalhador poderá prover assistência de qualidade nas diversas unidades de saúde”, observam os pesquisadores.

Leia o artigo na íntegra aqui.


Foto: Breno Esaki - SES-DF




Fonte: CSP

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