Exames podem antecipar realização de cesarianas
Segundo Silvana Granado, pesquisadora do Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos da ENSP e coordenadora adjunta do Projeto Nascer no Brasil, o excesso de confiança nos dados apontados pelas ultrassonografias em exames feitos no terceiro trimestre de gravidez leva médicos a realizar cirurgias cesarianas antes que o corpo do bebê esteja perfeitamente maduro para a vida extrauterina. O alerta foi dado em reportagem veiculada no jornal Diário Catarinense, publicada no sábado (24/3). De acordo com a reportaem, a profusão de exames laboratoriais para grávidas mostra que a medicina avançou, mas que sua grande oferta não corresponde, necessariamente, a um bom uso desses exames.
A pesquisadora explicou, ainda, que tais erros induzem a nascimentos precoces: bebês muito mais magros do que o esperado, ou com o sistema respiratório imaturo, o que gera a necessidade de internação na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI). De acordo com Silvana Granado, a ideia de que o bebê está totalmente pronto para nascer com as 38 semanas de gestação completas também é um erro.
Leia abaixo a entrevista na íntegra:
A profusão de exames laboratoriais para grávidas mostra que a medicina avançou. A grande oferta não implica em um bom uso deles. As polêmicas em torno dos exames morfológicos são muitas. Se, por um lado, eles podem prever doenças sérias, por outro, podem gerar, para uma minoria de 5% das gestantes, aflições desnecessárias. De acordo com o médico obstetra e diretor do ambulatório de obstetrícia do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, Daniel Holnik, é normal a preocupação e a ansiedade pré-ultrassons morfológicos, porque é nesse momento que se detecta a maioria dos problemas do feto.
A questão é que 5% das translucências nucais (nome do exame que aponta os riscos de o bebê ter uma alteração cromossômica, uma malformação ou alguma síndrome genética) apontam falsos positivos. Todo exame tem sua margem de erro, podendo tanto detectar algo que não existe, como não detectar um problema existente. Esses 5% de erro são considerados normais. Um pequeno grupo de mulheres acabará sendo prejudicado pelo estresse desse falso positivo. Mas outro enorme grupo será beneficiado, opina Daniel.
Quando o exame detecta a probabilidade de alguma alteração, muitas mulheres optam por exames mais específicos, que além de invasivos (a agulha chega até a placenta), oferecem um risco de aborto de até 1%. "É um risco que existe e são casos que, mesmo raros, acontecem", diz o médico. Daniel explica que a importância de tais triagens é descobrir alguma alteração que possa ser tratada ainda na vida intrauterina, ou que aponte para cuidados especiais na hora do parto.
Não são exames motivados apenas pela curiosidade, como muitos pensam. Se o bebê apresentar um problema cardíaco, a equipe vai se preparar para um procedimento mais complicado, com possibilidade de uma cirurgia de emergência no pós-parto. "São exames que salvam muitas vidas, de mães e crianças", finaliza. O mesmo vale para a realização dos exames laboratoriais. "Detectar um HIV por meio de um exame de sangue pode prevenir que a criança nasça com o vírus", explica a consultora médica da assessoria científica do laboratório Sabin, Silvana Fabel.
Antecipação desnecessária
Iniciativa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o estudo Nascer no Brasil: Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento revela o aumento da taxa de nascimentos prematuros (pré-termo intermediário e tardio), bem como um maior número de cesarianas e de recém-nascidos que necessitam de ventilação mecânica. São sinais negativos, que merecem atenção dos profissionais de saúde. Segundo a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Silvana Granado, o excesso de confiança nos dados apontados pelas ultrassonografias em exames feitos no terceiro trimestre leva médicos a realizar cirurgias cesarianas antes que o corpo do bebê esteja perfeitamente maduro para a vida extrauterina.
Tais erros induzem a nascimentos precoces: bebês muito mais magros do que o esperado, ou com o sistema respiratório imaturo, o que gera a necessidade de internação na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI). Para datar uma gestação é necessário avaliar os dados do ultrassom realizado no primeiro trimestre, que é quando a margem de erro é de, no máximo, cinco dias. Mas existem muitos profissionais despreparados. "A ultrassonografia do terceiro trimestre tem uma margem de erro muitíssimo maior com relação à idade gestacional", avalia o médico obstetra Victor Bunduki, especialista em medicina fetal e ultrassonografia do CDB Premium.
De acordo com Silvana Granado, a ideia de que o bebê está totalmente pronto para nascer com as 38 semanas de gestação completas também é um erro. Tem bebês que vão alcançar o desenvolvimento total apenas com 40 semanas. E como o pulmão é o último órgão a amadurecer, os problemas respiratórios são uma constante em casos de prematuros. O fato é que só quem pode dizer o momento certo para um bebê nascer é o corpo da mulher.
Movidas pela curiosidade
No Brasil, o exame de sexagem fetal, que aponta o sexo do bebê já na oitava semana de gestação, custa em torno de R$ 400. Nenhum plano cobre esse exame, porque ele é motivado puramente pela curiosidade. São raros os casos em que elas chegam com indicação médica (quando se preveem patologias ligadas ao sexo, como a hemofilia). Mesmo assim, ele já é um dos exames particulares mais procurados nos laboratórios. A superintendente técnica do laboratório Sabin, Lidia Freire, conta que, em 2004, foram realizados 20 exames de sexagem fetal pelo laboratório. Em 2011, o número cresceu para 1.200 exames por ano no país. Tem grávida que faz o ultrassom todo mês, por desencargo de consciência.
A cantora Ivete Sangalo comprou um ultrassom para ter em casa quando estava grávida. Depois que o filho nasceu, doou o aparelho. "É um exagero, mas depois do primeiro trimestre, a verdade é que não existem contraindicações que freiem essa curiosidade", conta um dos médicos entrevistados.
Ferramentas da ciência
Primeiro trimestre:
Hemograma completo: feito pela coleta de sangue da mãe, avalia as células sanguíneas, conta as plaquetas e detecta infecções e problemas. Tipagem sanguínea: revela o Rh sanguíneo da mãe. Se pai e mãe tiverem Rhs diferentes (ele positivo, ela negativo, ou vice-versa), a gestante precisará fazer um tratamento simples para evitar sensibilizações.
Sorologia para HIV: detecta a presença do vírus HIV no sangue da mãe. A detecção pode prevenir que a criança nasça com o vírus.
Sorologia para hepatite B e C: verifica a presença desses vírus no sangue da mãe, evitando que o filho os contraia e apresente problemas graves de fígado ao longo da vida.
Sorologia para toxoplasmose: busca a presença do protozoário causador da toxoplasmose no sangue da mãe, podendo causar aborto ou problemas graves no feto, como hidrocefalia e cegueira.
Sorologia para rubéola: a doença que, em geral, é de baixa gravidade para o adulto, pode trazer transtornos sérios para uma mulher grávida, expondo o feto a malformações e até à morte.
Sorologia para sífilis: Detecta se a mãe é portadora da doença, que pode causar malformações graves e aborto.
Sorologia para citomegalovírus: Detecta a presença do citomegalovírus na corrente sanguínea. O vírus é o principal causador de surdez congênita no bebê, além de estar relacionado a baixo peso e quadros de icterícia.
Urina 1 e urocultura: busca infecções no aparelho urinário feminino, que podem causar parto prematuro.
Papanicolau: busca infecções vaginais que podem trazer complicações diversas para a gravidez.
Ultrassom básico obstétrico endovaginal ou transvaginal: é feito com uma sonda introduzida na vagina da gestante. Além de confirmar a presença de um ou mais fetos, vai definir a idade gestacional, medir os batimentos cardíacos e analisar o útero.
Translucência nucal (décima-primeira à décima-quarta semana): feita por meio de um ultrassom transabdominal, verifica o acúmulo de líquido na região da nuca do feto, avaliando, assim, os riscos de o bebê apresentar alguma síndrome genética, malformações e alterações cromossômicas. É conhecido por ser o exame que indica o risco da síndrome de Down.
Teste oral de tolerância à glicose: para o diagnóstico de diabetes. A grávida faz um primeiro exame de sangue, depois ingere uma mistura de glicose. Duas horas depois faz outro exame de sangue.
Recomendados para casos específicos: TSH, T3, T4 e T4 livre, ecocardiografia fetal, coombs indireto, perfil bioquímico fetal, protoparasitológico de fezes, cariótipo, biópsia de vilo corial, dosagem de ureia, ácido úrico e creatinina, teste de enzimas hepáticas, ecocardiograma e eletrocardiograma, sexagem fetal.
Segundo trimestre:
Ultrassom morfológico: vai analisar e medir toda a morfologia do feto.
Recomendação para casos específicos: amniocentese, ecocardiograma fetal, cordocentese, beta gonadotrofina coriônica humana, teste de proteína plasmática associada à gravidez, dosagem de ureia, ácido úrico e creatinina, teste de enzimas hepáticas, ecocardiograma e eletrocardiograma.
Terceiro trimestre:
Ultrassom obstétrico: verifica a quantidade de líquido amniótico, a morfologia do bebê, o crescimento, o peso e a maturação da placenta.
Ultrassom obstétrico com dopplervelocimetria colorida: busca uma avaliação mais específica, por meio de ultrassom mais moderno, do fluxo sanguíneo no corpo do bebê e a resistência vascular, avaliando se há sofrimento fetal.
Cardiotocografia: feito durante o trabalho de parto, consiste na monitoração elétrica dos batimentos cardíacos do bebê e das contrações uterinas. Indica sinais de sofrimento fetal.
Recomendados: pesquisa da bactéria estreptococo B na cultura de secreção vaginal, perfil biofísico fetal, ultrassom 3D ou 4D, dosagem de ureia, ácido úrico e creatinina, teste de enzimas hepáticas, ecocardiograma e eletrocardiograma.
Fonte: Diário Catarinense
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