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COP 26: expectativas sobre a conferência da ONU e participação brasileira

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Publicado em:28/10/2021
*Andréa Vilhena

Depois de ter sido adiada no ano passado em função da pandemia, a COP 26 (Conference of the Parties) vai se realizar entre os dias 1º e 12 de novembro em  Glasgow, na Escócia. O encontro anual da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima reúne representantes de vários países para debater as mudanças climáticas e as medidas para limitar o aquecimento global. O blog do CEE conversou com a pesquisadora e professora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz) Sandra Hacon, a respeito das expectativas em torno desse evento e sobre o papel da representação brasileira. Sandra Hacon representa o Brasil no GT do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e integra o corpo de pesquisadores do Centro Colaborador em Saúde Pública e Ambiental da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (Opas/OMS). 

No dia 20 de outubro, ela foi uma das debatedoras, ao lado de Paulo Gadelha, coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030, do terceiro seminário preparatório do IX Congresso Interno da Fiocruz, que abordou os impactos das mudanças ambientais e a Fiocruz do futuro, com conferência do pesquisador Paulo Artaxo, do Instituto de Física da USP, integrante do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). Leia a entrevista a seguir.

Qual a expectativa mundial sobre a COP26, depois da divulgação do último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em agosto deste ano, trazendo evidências científicas inquestionáveis a respeito da grande ameaça para a saúde do planeta, representada pelas emissões de gases de efeito estufa?

Sandra Hacon: A COP26 vai discutir principalmente o Acordo de Paris, acordo global adotado em dezembro de 2015 pelos países signatários, 147 países que participaram da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre o clima. Esse acordo gerencia medidas de redução de emissão de dióxido de carbono a partir de 2020. Tem por objetivos fortalecer as respostas às ameaças da mudança do clima e reforçar a capacidade dos países para lidar com os impactos gerados pelas mudanças climáticas. Então, o principal objetivo é manter o aumento da temperatura média mundial abaixo de 2ºC em relação aos níveis pré-industriais e colocar todos os esforços para limitar esse aumento em 1,5 ºC. No entanto, não podemos esquecer que o relatório 1 do IPCC, divulgado no dia 9 de agosto, já indica um aquecimento médio acima de 1.5 grau para os continentes. A COP26 envolve a expectativa pela regulamentação do artigo 6 do Acordo de Paris, que tem como objetivo limitar as emissões abaixo de 2º C, buscando não passar de 1,5ºC. Essa limitação visa tentar evitar os eventos extremos que estamos presenciando em todos os continentes, distribuídos de forma heterogênea com danos à saúde, à economia e aos ecossistemas, mas sempre com maior impacto sobre as populações mais pobres do planeta. 

O Acordo de Paris voltando à mesa de negociação, qual é a perspectiva desta vez?

Sandra Hacon: É a do mercado global de carbono, ou seja, a precificação do mercado de carbono. Quanto mais um país emite CO2 para a atmosfera, pior vai ser seu cenário em termos de atender o artigo 6. Esse mercado de carbono vai tentar mitigar para atingir a meta de carbono zero para as atividades econômicas.

Isso requer que os países e as empresas removam da atmosfera a mesma quantidade de CO2 emitido pelas atividades econômicas. Como isso ocorre na prática?

Sandra Hacon: É estabelecido um limite para a emissão de CO2. Governos e empresas que ultrapassem esse limite podem negociar créditos de carbono com o setor privado ou governos que não atingiram esse limite e, por isso, podem vender seus créditos de carbono. O mercado de carbono é a menina dos olhos da COP26, sem sombra de dúvida. Vários países estão se preparando para apresentar seus cenários como protagonistas, inclusive a China, mesmo sendo o maior poluidor do mundo. O país está propondo zerar suas emissões até 2060 e investir em energia limpa. O mesmo vem acontecendo com o Reino Unido. E a volta dos EUA com foco na Economia Verde também chama a atenção do mundo em relação às perspectivas da COP26. 

O Brasil, com tamanha biodiversidade, que propostas e compromissos poderia apresentar para contribuir com esforço mundial para frear as mudanças do clima?

Sandra Hacon: O Brasil sempre foi protagonista. Nossa ministra do Meio Ambiente protagonizando a COP das mudanças climáticas durante muitos anos, Era esperado, justamente com as novidades, com as novas tecnologias que mantivesse esse papel. Mas, hoje, infelizmente o Brasil é ridicularizado, é o pária, como estamos verificando. Principalmente depois da reunião da ONU, onde a posição do governo brasileiro deixou todos os brasileiros envergonhados. Parece que agora, bem próximo da COP, o Banco Central e o ministro da Economia estão correndo contra o tempo para ver se apresentam um cenário um pouquinho melhor para o país. Entre 2018 e 2021, tivemos os piores cenários para o governo brasileiro em termos de mudanças climáticas, com desmatamento, incêndios florestais, perda de 30% do pantanal, na contramão do desenvolvimento sustentável. Então, não é agora, faltando pouco mais de uma semana para o início da COP 26 que o Brasil vai mudar sua imagem. 

Por outro lado, o país tem bons indicadores para ser protagonista. É o sétimo em termos de emissão de gases do efeito estufa. Se houvesse uma boa fiscalização, se tivesse implementado as políticas públicas e respeitado a Constituição e a Política Nacional de Meio Ambiente, nós estaríamos numa posição extremamente confortável para liderar inclusive as negociações na COP26. Estamos aguardando para ver o que o Brasil vai apresentar na COP26, porque o que estamos vendo é um retrocesso não só das políticas ambientais, mas do próprio ministério do Meio Ambiente, do Ibama e dos órgãos estaduais. Esperamos, ainda, que os países protagonistas possam dar alguma chance para o Brasil se colocar ou prometer um plano de redução de emissão de gases de efeito estufa. Por outro lado, um país sério que quer ser bem representado na COP não deveria ter colocado em leilão uma dezena de blocos de exploração de petróleo nas proximidades do mais importante e sensível ecossistema de recifes do Brasil, que é o arquipélago de Fernando de Noronha, como aconteceu no leilão da ANP no início de outubro. A bacia Potiguar onde ficam localizados os blocos de petróleo envolve o arquipélago e a Reserva Biológica Atol das Rocas, ambos reconhecidos em 2001 como Patrimônio Natural Mundial pela Unesco. Estamos sempre na contramão da história. Como é que se prepara para fazer parte de uma negociação internacional adotando políticas que são contrárias ao que o Brasil pretende prometer na COP 26? 

E a situação da Amazônia?

Sandra Hacon: Não podemos esquecer que entre 1985 e 2020 a Amazônia perdeu 74,6 milhões de hectares de sua vegetação natural, uma área comparável à do Chile. Essa foi a conclusão de um levantamento, divulgado no final de setembro, realizado pelo Projeto de Mapeamento Anual do Uso e Cobertura da Terra no Brasil (MapBiomas), a partir de imagens de satélites. Então, nós temos um referencial ambiental recente bem na contramão do que os países estão querendo apresentar na COP26 para que a limitação da temperatura entre 1.5ºC e 2ºC possa ser atendida nas próximas décadas. 

*Jornalista do CEE/Fiocruz

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