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Gestoras falam da importância da RedEscola e do curso de especialização em Saúde Pública para a formação de sanitaristas

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Publicado em:28/01/2021
Por: Danielle Monteiro

A Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública (RedEscola), sediada na ENSP, e o curso de especialização em Saúde Pública (Cesp), fruto de cooperação da ENSP com o Ministério da Saúde e coordenado nacionalmente pela Secretaria Executiva da RedEscola, são algumas das principais ações da ENSP com vistas à formação de sanitaristas para o SUS. O sanitarista, que tem seu dia comemorado em 2 de janeiro, é um profissional fundamental para o Sistema Único de Saúde, pois é ele quem analisa a saúde pública local, identificando problemas e propondo soluções para a execução de medidas.

Confira abaixo entrevista com a coordenadora da Secretaria Técnica e Executiva da RedEscola e vice-diretora da Escola de Governo em Saúde da ENSP, Rosa Souza, e as integrantes do Cesp Colegiado sobre a importância, os desafios e as novidades dessas ações:

Qual a importância da RedEscola na formação de sanitaristas para o Brasil?

Rosa: Essa pergunta me instiga profundamente a fazer uma revisita no histórico mais recente da atuação da Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública (RedEscola), que tem como missão articular e fortalecer as escolas, os núcleos e os centros formadores em saúde pública e em saúde coletiva que a integram, mediante estratégias para o desenvolvimento de políticas e ações no âmbito da Educação na Saúde, visando a produção de conhecimentos e a qualificação no e para o SUS. A RedEscola é composta por 55 instituições formadoras que atuam no campo da saúde pública, entre escolas estaduais, municipais, universidades, institutos de pesquisa e centro formador de saúde pública, distribuídos em todas as regiões brasileiras formadoras. A Secretaria Técnica e Executiva - STE da RedEscola realizou um levantamento junto às instituições formadoras, cujo principal achado foi a constatação de uma lacuna na formação de sanitaristas no país, evidenciada pela irregularidade na oferta, interrupção e inclusive inexistência da formação de sanitaristas em alguns estados brasileiros.

A partir desse diagnóstico, a ENSP, que sedia a STE da RedEscola, propôs ao Ministério da Saúde o projeto denominado A Acreditação Pedagógica dos Cursos lato sensu em Saúde Pública e a Formação em Saúde Pública: uma possibilidade de caminhos convergentes, coordenado pela STE da RedEscola. O projeto foi constituído por dois componentes articulados e complementares: Acreditação pedagógica e Formação em Saúde Pública. O componente Acreditação Pedagógica abordarei, mais adiante, em um outro momento dessa entrevista. Já o componente Formação em Saúde Pública foi concebido como um curso de especialização lato sensu ancorado na Política Nacional de Educação Permanente em Saúde – PNEPS, desenvolvido na modalidade presencial. Os objetivos propostos consistiram em redesenhar as bases de formação em saúde pública, considerando as novas agendas do SUS e a perspectiva do território como espaço das intervenções sanitárias e sociais, e prover as Escolas de condições para o desenvolvimento de um novo ciclo de formação de sanitaristas no Brasil. 

Foram ofertadas duas turmas, por dez instituições formadoras, responsáveis desde a concepção do projeto pedagógico, desenvolvimento e avaliação dos cursos; sendo duas por região: Escola de Saúde Pública de Pernambuco, Escola de Saúde Pública do Ceará, Escola de Saúde Pública da Bahia, Escola Tocantinense do SUS, Universidade Federal do Acre, Escola de Saúde Pública do Paraná, Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul, Escola de Saúde Pública de Minas Gerais, Escola de Saúde Pública de Goiás e Escola de Saúde Pública do Mato Grosso. Foram formados 610 novos sanitaristas.

Dentro dessa perspectiva, um conjunto de movimentos foram desencadeados junto a essas instituições com vistas a promover verdadeiramente uma construção coletiva. Entre os eventos realizados, destaco as Oficinas de Saúde Pública, que se desenvolveram em torno de três questões norteadoras: 1. O que esperamos de um sanitarista no sistema de Saúde hoje? 2. Que temas e questões são importantes para a formação deste sanitarista? 3. Que estratégias, metodologias e processos pedagógicos são necessários para a construção desta formação? Desta feita com a participação dos docentes e pesquisadores da ENSP e das instituições formadoras envolvidas, foram delineadas as diretrizes e os princípios da formação de sanitaristas, entre elas, o perfil do egresso, a abordagem metodológica e o perfil docente. O propósito era formar um sanitarista comprometido com os novos desafios e cenários cada vez mais complexos da realidade em saúde pública. Um sanitarista que fosse capaz de dialogar com diferentes atores políticos e de intervir em seu território de atuação – um novo sanitarista.

A parceria com a ENSP, a retomada dos cursos para algumas instituições formadoras e mesmo a oportunidade de se ofertar pela primeira vez a formação de sanitaristas inauguraram um ciclo virtuoso entre as instituições formadoras que mobilizou a comunidade escolar em torno da construção dos projetos pedagógicos, da promoção da formação docente, além das discussões em torno de metodologias ativas de aprendizagem, com a adoção de estratégias de aprendizagem significativa. As duas ofertas desses cursos executados pelas 10 instituições envolvidas resultaram na formação de 610 novos sanitaristas. 

O êxito dessa iniciativa e a demanda reprimida existente na formação lato sensu em saúde pública nos instigou a apresentar um novo projeto à SGTES/MS, desta vez já considerando a apropriação de lições aprendidas nas ofertas anteriores. Esse novo projeto em desenvolvimento é denominado Nova Formação em Saúde Pública na Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública: uma abordagem interprofissional. Seu objetivo é expandir a oferta dos cursos lato sensu na área da saúde pública para todos os estados brasileiros, contribuindo para a qualificação das práticas profissionais e para a organização do trabalho nas instituições de saúde de forma alinhada aos princípios e diretrizes do SUS. 

A proposta pretende ainda atualizar e avançar na formação de novos sanitaristas, como sujeitos críticos, capazes de intervir nos territórios, transformando práticas e realidades. A meta é formar 650 sanitaristas em 26 estados brasileiros. Para atender aos objetivos propostos e considerando a introdução da Educação Interprofissional, foram realizadas oficinas regionais envolvendo os coordenadores e apoiadores pedagógicos para discutir coletivamente a concepção e o desenvolvimento do curso e a abordagem da Educação Interprofissional frente aos desafios da formação para o SUS, contemplando a elaboração e o planejamento de iniciativas de Educação Interprofissional em Saúde. 

Até o momento, foram abertos 30 cursos em 25 estados. Isso porque algumas escolas estaduais ofertaram mais de uma turma. O curso da Universidade Federal de Rondônia está em vistas de implantação, no início deste ano. Atualmente, já foram concluídos 11 cursos e formados 397 sanitaristas, distribuídos em todas as regiões brasileiras. Temos em curso 742 discentes. Nossa expectativa é alcançar 1.139 formados.

Quais são os principais desafios impostos pela pandemia enfrentados pelas instituições formadoras em Saúde Pública no que diz respeito à formação de sanitaristas?

Rosa: A crise sanitária e humanitária provocada pela pandemia nos tomou de assalto. Atravessou os cursos em andamento e o que estava em fase de implantação, como o caso da Universidade Federal de Rondônia. A salas de aula ficaram vazias e a perplexidade se instalou dada a complexidade e emergência da situação. Muitas perguntas e respostas confusas e insuficientes geraram muita insegurança. No início, os dirigentes, equipes de governança dos cursos e discentes perguntavam: E agora? Como vamos seguir com os nossos cursos que são presenciais, vamos interrompê-los? E aí vieram os planos de contingência institucionais e a possibilidade de adotar o ensino remoto. O advento da pandemia nos provocou a revisitar e repensar o projeto pedagógico e as práticas educativas do curso à luz do contexto atual, incluindo certamente a compreensão das dificuldades dos profissionais de saúde pública para atuarem durante a pandemia e identificar alternativas, não só para os problemas diretamente relacionados a ela, mas também aos indiretamente derivados dela, sem negligenciar os outros problemas de saúde pública. Seguiram-se, então, novas questões decorrentes de reflexões compartilhadas com a Coordenação de Desenvolvimento Educacional e EAD da Ensp/Fiocruz, parceira nas discussões sobre as estratégias pedagógicas possíveis durante a pandemia.

Como nos manter atualizados para o enfrentamento dessa grave situação nova, inesperada e de longa duração? Como manter o projeto pedagógico concebido para desenvolvimento na modalidade presencial original com o uso de novas tecnologias digitais de informação e comunicação? Que recursos e estratégias da modalidade EAD poderão ser utilizadas no ensino remoto? Por quanto tempo faremos a adaptação do planejamento do ensino presencial para que possamos atuar remotamente? Quanto vale investir (tempo e recursos) nestas adaptações, considerando o tempo em que teremos que atuar remotamente e o que deve ficar para uso mesmo nos cursos presenciais? Como trazer o trabalho dos profissionais/alunos para o interior dos cursos, com o ensino remoto? Quais atividades educacionais não cabem no ensino remoto e o que fazer? Como vencer a resistência às adaptações necessárias, o preconceito com a tecnologia e com a modalidade EAD? Como evitar a reificação da tecnologia em detrimento da educação? Ademais é importante considerar que, ao levar o trabalho para casa, o docente terá novas necessidades de conectividade, recursos computacionais e kit para comunicação virtual. O atual cenário exige nova pactuação com os docentes sobre seu trabalho e a preparação deles para o uso de novas estratégias pedagógicas e uso educacional dos recursos tecnológicos virtuais.

Em relação aos discentes, as perguntas transitavam entre: O curso vai ser mantido e como vou concluir o curso? Alguns encontravam-se atuando diretamente na assistência e o tempo disponível para a dedicação ao ensino remoto se encontrava muito restrito. Emerge, então, a necessidade de familiaridade com recursos tecnológicos (digitais e internet); maior conectividade em casa; acesso a recursos computacionais e kit para comunicação virtual. No âmbito do contexto normativo, foi urgente debruçar-nos sobre o acompanhamento de novos documentos legais acerca do ensino remoto; ajustes em regulamentos institucionais (das instituições formadoras) e nos editais das novas ofertas educacionais; e atenção aos cursos em execução quanto a sua compatibilidade com os editais que o originaram.

Do ponto de vista da gestão novas questões, apareceram indagações e, logo, a resposta, como: Os recursos institucionais precisam ser melhorados e ampliados para o modelo do ensino remoto? Há necessidade de melhoria da infraestrutura tecnológica e da incorporação de um ambiente virtual de aprendizagem. 

A STE da RedEscola, consciente da gravidade da situação do atual cenário e sensível às condições estruturais e emocionais provocadas pela pandemia que exigiu ressignificação do nosso modo de olhar a vida e repensar o nosso processo de trabalho, lançou mão de algumas estratégias de suporte aos coordenadores e apoiadores pedagógicos dos cursos. 

Foram realizadas reuniões regionais virtuais dos cursos de especialização em Saúde Pública. A primeira sessão de reuniões virtuais teve como objetivo entender como a situação da pandemia e do isolamento social está afetando a formação em Saúde nas escolas que compõem a rede e quais as estratégias pedagógicas e comunicacionais estavam sendo desenvolvidas no âmbito dos cursos de especialização em Saúde Pública que fazem parte do projeto coordenado pela RedEscola. Foram realizadas três reuniões regionais. Os encontros reuniram diretores de instituições formadoras, coordenadores e apoiadores pedagógicos dos cursos de especialização. Cada evento regional contou com a participação de convidados de outras regiões, que compartilharam suas experiências e estratégias adotadas. 

Diante das demandas sobre ensino remoto e ensino à distância, a STE organizou rodas de conversa com o tema Os arranjos pedagógicos possíveis e o Ensino a Distância, em parceria com a Coordenação de Desenvolvimento Educacional e Ensino a Distância - EAD da ENSP, com o objetivo de abrir um espaço de diálogo com os diretores, coordenadores  e apoiadores de cursos e docentes sobre as possíveis estratégias que permitissem a continuidade dos cursos de especialização em Saúde Pública, considerando o cenário de pandemia de Covid-19 e o distanciamento social que dele deriva. As rodas de conversa aconteceram em caráter regional com a utilização da plataforma Zoom.

A preocupação com a preservação da qualidade do curso, aliada ao compromisso com a proposta da abordagem da educação interprofissional - EIP, nos mobilizou a promover um ciclo de Debates Virtuais intitulado A Educação Interprofissional e o Trabalho Colaborativo no Enfrentamento à Pandemia de Covid-19. Esses eventos, coordenados pela STE – RedEscola, foram organizados regionalmente, com o objetivo de reforçar a importância da educação interprofisisonal e o trabalho colaborativo para a melhoria da qualidade da Atenção à Saúde, especialmente no cenário atual. Participaram diretores, coordenadores de cursos, apoiadores pedagógicos, docentes e discentes dos cursos de especialização em Saúde Pública. Para abordar a temática, contamos, em cada debate, com dois convidados de referência no tema da EIP no Brasil. 

Não restam dúvidas de que os coordenadores e apoiadores dos cursos, com o suporte dos dirigentes de suas respectivas instituições formadoras, tiveram que fazer um esforço hercúleo para manter os cursos em funcionamento em realidades crivadas de adversidades. Muitos cursos estavam finalizando, outros estavam mais avançados e alguns ainda começando. Fizemos uma breve enquete com os membros do Grupo de Condução da RedEscola e sumarizamos algumas das ações que foram empreendidas para fazer face a um contexto tão desafiador marcado pelo fato de que muitos discentes encontravam-se atuando diretamente na Assistência. Agrega-se a isto, a situação de adoecimento de trabalhadores e discentes, destacando-se:

Adequação da proposta pedagógica, fundamentada no uso das metodologias ativas para o novo momento, com utilização de ferramentas tecnológicas virtuais
Adoção de plano estratégico de apoio aos discentes e docentes no que tange ao acolhimento de demandas e adequação de novas estratégias e dinâmicas pedagógicas 
Elaboração e apresentação dos projetos de intervenção no formato virtual assegurando a qualidade do processo formativo.
Articulação com os gestores do sistema para apoio a continuidade dos cursos
Envio de questionários aos alunos para levantamento das facilidades e dificuldades que encontrariam para a continuidade do curso de forma remota. 
Diálogos com os docentes com o intuito de viabilizar que os conteúdos fossem ministrados com a qualidade requerida pelos cursos. 
Força tarefa no interior das instituições para que discentes e docentes se familiarizassem com as plataformas AVASUS e RETSUS.

As lições aprendidas nos ensinam que a atuação da Rede são fundamentais para o enfrentamento dos desafios comuns que dificilmente conseguiríamos enfrentar individualmente, isoladamente. Nunca o trabalho colaborativo foi tão necessário como agora, neste contexto de pandemia.

Quais são os principais desafios enfrentados pelas instituições formadoras da RedEscola?

Rosa: Dada a diversidade de configuração das 55 instituições que integram a RedEscola, desde a sua vinculação institucional, estrutura organo-funcional, certificação própria ou não e quadro e vínculo de servidores/trabalhadores, os desafios são também diferenciados e imprimem movimentos específicos e singulares. Selecionamos uma breve síntese dos inúmeros desafios, trazidas pelas contribuições de alguns representantes dessas instituições na RedEscola:

Dificuldade na utilização das plataformas de aprendizagem EAD
Precariedade de infraestrutura para a continuidade do ensino remoto e dos cursos no formato EAD
Incerteza sobre a manutenção da regularidade da oferta de formação de sanitaristas
Cenário de insegurança diante do desfinanciamento da saúde e sobretudo da PNEPS
Ausência de quadro próprio da maioria das escolas estaduais e municipais
Dependência de outras instituições formadoras para a certificação de seus próprios egressos
Implementação de projetos e atividades de extensão 
Intensificação da implementação da abordagem da Educação Interprofissional na formação em Saúde Pública.
Oferta de meios de apoio e acompanhamento de discentes, proporcionando-lhes as orientações necessárias em momento oportuno
Desenvolvimento de procedimentos adequados, que permitam acompanhar as modificações que o ambiente apresenta, possibilitando a adoção de medidas que respondam de maneira eficiente e eficaz
Concepção e desenvolvimento de projetos de ensino e pesquisa voltados para a realidade dos territórios, considerando as demandas e necessidades da população no contexto da pandemia

Quais foram as principais conquistas da RedEscola ao longo de sua trajetória na formação de sanitaristas?

Rosa: Ao mirar o retrovisor, visualizamos um conjunto de conquistas que somente foi possível alcançar pelo trabalho em parceria e em Rede. Os dois projetos voltados para a formação de sanitaristas. O primeiro foi A Acreditação Pedagógica dos Cursos lato sensu em Saúde Pública e a Formação em Saúde Pública: uma possibilidade de caminhos convergentes, coordenado nacionalmente pela STE da RedEscola. Esse projeto desdobrou-se em dois componentes. Um deles, mencionado no início dessa entrevista, foi a Formação em Saúde Pública, que ofereceu duas turmas em dez escolas e formou 610 sanitaristas, com projetos pedagógicos concebidos e executados pelas dez instituições formadoras, inaugurando um novo ciclo de formação no país, com o início da primeira turma em 2016. 

Já o segundo componente Acreditação Pedagógica, iniciativa pioneira voltada para os cursos lato sensu em Saúde Pública, teve como objetivo melhorar a qualidade da oferta dos cursos lato sensu da área da saúde pública no Brasil, contribuindo para que as práticas profissionais e de organização do trabalho nas instituições de saúde estejam alinhadas com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde – SUS. Desenvolvido em parceria com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva -  Abrasco, foram acreditados cinco cursos, entre os anos de 2017 e 2018:  curso de especialização em Vigilância Sanitária, da Escola de Saúde Pública do Ceará; o curso de especialização para a Formação de Gestores e Equipes Gestoras para o SUS, da Escola de Saúde do Paraná; o curso de especialização em Saúde Pública de Minas Gerais; o curso de especialização em Gestão em Tecnologias de Saneamento; e o curso de especialização em Promoção da Saúde e Desenvolvimento Social da ENSP.

O êxito dessas iniciativas ensejou a aprovação do Projeto Nova Formação em Saúde Pública na Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública: uma abordagem interprofissional. Com a implantação da terceira oferta de formação de sanitaristas, buscando progressivamente a qualificação do processo formativo, foi incorporado o enfoque da Educação Interprofissional - EIP, visando a adoção de práticas colaborativas tão importantes e fundamentais para a melhoria da qualidade da Atenção à Saúde. A RedEscola, dada a capilaridade dessa oferta, é considerada uma liderança na introdução da EIP em cursos lato sensu no país.

Os avanços alcançados não param por aí, uma vez que seguimos investindo na produção do conhecimento e inauguramos mais uma linha de atuação dentro do escopo da RedEscola, gerando, assim, dois livros, organizados por mim e por Patricia Pol Costa, com a participação de coordenadores e docentes dos cursos, sendo estas as primeiras publicações indexadas da RedEscola: uma lançada em 2017, sob o título RedEscola e a Nova Formação em Saúde Pública, e a outra em 2019, intitulada Nova Formação em Saúde Pública: aprendizado coletivo e lições compartilhadas na RedEscola

Na busca por aperfeiçoamento do processo de trabalho, sabemos que a conectividade é um desafio importante para as Redes. Já vínhamos melhorando a imagem da RedEscola, com a construção de um site, reposicionamento de marca e criação de identidade visual no segundo semestre de 2014. Em 2019, construímos um novo site, com o apoio da CCI para atender as exigências de crescimento da Rede, tornando-o mais acessível e conferindo melhor legibilidade, navegabilidade e funcionalidade, mas ainda não havíamos alcançado a capilaridade desejada. E foi justamente no ano de 2020 que apostamos fortemente nas redes sociais como ferramenta capaz de gerar novas sinergias entre as instituições formadoras que compõem a RedEscola e entre parceiros, amigos e apoiadores desta Rede. A nossa presença e atuação nas redes sociais, neste ano, ratificou o nosso interesse na criação de um espaço de colaboração mútua e compartilhamento de conteúdo informativo qualificado que contribuiu para a construção de uma imagem de credibilidade das instituições que compõem a RedEscola no âmbito da Comunicação em Saúde, o que, no contexto atual, se mostrou de extrema relevância. 

Esse ambiente de referência, criado a partir da reativação e da criação de algumas contas da RedEscola nas principais plataformas de interação social, fizeram com que a “marca” RedEscola fosse revitalizada e reconhecida em novos e antigos espaços como uma Rede de diálogo permanente entre instituições de ensino de Saúde no Brasil e comprometida com uma cultura de cooperação, favorecendo a construção compartilhada e a circulação de conhecimentos e o desenvolvimento de competências no interior do Sistema Único de Saúde.

Em 2020, durante a pandemia, realizamos o maior o Encontro Nacional da RedEscola - #ENRedEscola2020, sob o tema Educação na Saúde como Indutora de Justiça Social: enredando saberes e vivências, trazendo sessões de grande interesse para a formação de sanitaristas, com a participação de convidados especiais. A Conferência Magna intitulada A Educação na Saúde como Indutora de Justiça Social foi proferida pelo prof. Dr. Jairnilson Silva Paim, da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O encontro teve transmissão simultânea em todas redes sociais da RedEscola. Naquela ocasião, alcançou quase 1 mil pessoas, que assistiram ao vivo aos quatro dias do evento. Hoje já contamos com mais de 8.700 visualizações. Como parte da programação, foram levadas a efeito três sessões de grande interesse na formação de sanitaristas: Educação na Saúde: experiências e desafios no contexto da COVID-19 e pós-pandemia, que contou como palestrantes Emerson Elias Mehry (UFRJ) e Mario Rovere (Universidade do Rosário – UNR/Argentina). Ciência, saúde e cidadania: qual o espaço da educação para a promoção da justiça social?, que teve como convidados Roberto Leher (UFRJ) e Gulnar Azevedo e Silva (Abrasco); e Determinantes sociais e suas repercussões no acesso à saúde e à educação, com a participação de Deis Gonçalves Rocha (UNB) e Patricia Tavares Ribeiro (ENSP). No escopo desse evento, realizamos o I Encontro Nacional dos Sanitaristas, que reuniu os sanitaristas formados e os ainda em curso, favorecendo um rico espaço de diálogo, acolhimento e troca de experiência. O encerramento do ENRedEscola2020 culminou com a realização da Plenária Nacional, conforme prevê o Regulamento da RedEscola. 

Os desafios são muitos, sem dúvida, mas os resultados obtidos até agora nos mostram que juntas/os e em rede podemos contribuir para valorizar as instituições formadoras e  qualificar os processos formativos em Saúde Pública para fortalecer o SUS!

Por fim, em homenagem aos sanitaristas, eu não poderia encerrar essa entrevista sem reconhecer aqui a dedicação e o compromisso dos gestores; coordenadores e apoiadores pedagógicos; e docentes e equipes técnicas das instituições envolvidas nesse projeto, na formação de sanitaristas. Aproveito esse espaço para saudar os agora já formados sanitaristas e aqueles cursistas que ainda se encontram em formação, os quais não mediram esforços e lutaram corajosamente para transformar um sonho, sonhado em um cenário livre da pandemia e tornado realidade em um contexto tão adverso, enfrentando, com muita persistência, tenacidade e resiliência, os obstáculos impostos por esse período tão desafiador. 

Conte um pouco da trajetória do curso de especialização em Saúde Pública (CESP/ENSP) e suas principais conquistas.

Cesp Colegiado: O curso de especialização em Saúde Pública da ENSP acompanha a trajetória da política de saúde brasileira desde os anos 1960. Atualiza-se mediante as necessidades de formação que se apresentam em cada conjuntura, em especial frente às mudanças ocorridas no quadro social e sanitário, bem como na organização dos sistemas e serviços de saúde. 

O curso passou por uma mudança curricular importante, entre os anos 1980 e 1990, com o processo de formulação e instituição do Sistema Único de Saúde. Nesses anos, os cursos descentralizados de saúde pública foram reafirmados em todo o território nacional, ampliando a formação em Saúde e contribuindo para o fortalecimento do projeto de consolidação de uma Política Nacional de Saúde Pública, universal e integral. 

Na década de 1990, principalmente nos anos 2000, a formação em Saúde Pública tornou-se mais complexa com o desenvolvimento da Política de Saúde e suas áreas temáticas como Atenção Básica, Promoção da Saúde, Gestão em Saúde, Saúde do Trabalhador, Saúde Mental, Saneamento,  Vigilância Sanitária, entre outras, exigindo formações específicas e complementares à formação de base do sanitarista.

Também nos anos 2000, o cenário de mudanças globais na organização política, econômica, social e sanitária acarretou novas demandas de formação em Saúde, trazendo o desafio de atualização e renovação do currículo do sanitarista.

O curso expressa o compromisso institucional com o sistema público e universal de saúde. A cada ano, oferta vagas para a formação de profissionais e recebe candidatos/as nacionais e estrangeiros, tendo formado milhares de trabalhadores que atuam na saúde, educação e outras áreas sociais.
Os princípios e pressupostos da formação que norteiam o projeto do curso são: 

1. Saúde como direito humano
2. Saúde como bem público
3. Princípios do SUS (universalidade, integralidade, descentralização e participação social)
4. Enfrentamento das desigualdades (econômicas, sociais e culturais)
5. Reconhecimento das especificidades territoriais e do contexto local
6. Trabalho como produtor de vida e de organização social
7. Ética e valorização do vínculo
8. Perspectiva pedagógica crítica, dialógica e transformadora
9. Responsabilidade sócio ambiental com a humanidade

Como é modelado o curso de especialização em Saúde Pública da ENSP e qual seu objetivo?

Cesp Colegiado: O curso é constituído por uma carga horária de 576 horas/aulas e 114 horas para a elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), totalizando 690 horas. Geralmente, são ofertadas 33 vagas, sendo 30 para candidatos nacionais e três para candidatos estrangeiros. Do total das vagas, 10% (três vagas) são destinadas às/aos candidatos/as que se declararem pessoa com deficiência ou que se autodeclararem negros (pretos e pardos) ou indígenas.

O principal objetivo é promover o olhar crítico, reflexivo e abrangente sobre a situação de saúde e o contexto político-social, comprometido com a defesa do direito universal à saúde e do sistema público.

A estrutura curricular é constituída por quatro Unidades de Aprendizagem (UA), que tratam dos grandes temas que constituem os desafios e perspectivas da saúde pública:

UA I: Modos de viver, adoecer e morrer no Brasil
UA II: Políticas de saúde e organização de sistemas e serviços de saúde
UA III: Práticas e cuidados em Saúde
UA Transversal: Pesquisa e produção de conhecimento em Saúde

Qual a importância dos sanitaristas na história da saúde pública do país? E como o curso de especialização em Saúde Pública da ENSP contribui para assegurar a continuidade da importante contribuição dos sanitaristas para a Saúde no Brasil?

Cesp Colegiado: A formação de trabalhadores que atuam ou pretendem atuar na Saúde Pública brasileira é muito importante, e se mostra mais necessária em momentos de crise sanitária e de ataques ao SUS, como o que estamos atravessando. 

Os primeiros sanitaristas formados, inicialmente apenas médicos, tiveram uma grande importância na história da Saúde Pública brasileira e na construção do nosso Sistema Único de Saúde. Vários nomes de profissionais (como Oswaldo Cruz, Carlos Chagas, Vital Brazil, Emílio Ribas, Adolfo Lutz, Sérgio Arouca) se destacaram pela dedicação à saúde dos brasileiros/as. Marcaram, ainda, a trajetória da Saúde Pública dado o impacto social que as suas pesquisas tiveram.

A gama de conhecimentos presentes na formação do sanitarista (epidemiologia, planejamento em saúde, ciências sociais e outros) conduz a uma visão ampliada do processo saúde-doença-cuidado. Além, é claro, de proporcionar habilidades para o acompanhamento dos agravos à saúde e para o planejamento de ações que visem minorar as consequências desses agravos. A formação ofertada pelo curso está voltada diretamente para atuação no SUS, bem como para a pesquisa e o ensino em Saúde. Visa fortalecer valores, como o direito à uma saúde pública e de qualidade para todos/as os/as brasileiros/as, e defender o SUS, como um sistema que precisa, sim, ser melhorado através de investimentos públicos, mas que, neste momento, se consolida como um bem público e patrimônio nacional.

O curso terá novidades para esse ano? Quais?

Cesp Colegiado: Em 2020, fizemos uma mudança pedagógica importante em função de pandemia, pois ajustamos a metodologia para oferecer um ensino remoto emergencial, fazendo uso da plataforma moodle (atividades assíncronas) e do zoom (atividades síncronas). O propósito do curso foi totalmente mantido, mas ajustamos para oferecer quatro horas de aula online, em estreita relação com as atividades assíncronas, isto é, diversas atividades no moodle (fóruns, grupos de trabalho, tarefas, vídeos,etc.). Além desta alteração no modo de apreensão do conhecimento coletivamente construído pelos/as alunos/as, também mudamos a modo de elaborar o TCC, no sentido das orientações acontecerem ao longo do curso, com orientação dos próprios docentes que integram os grupos de orientação. 

A mudança para o formato remoto emergencial exigiu de alunos/as e docentes um grande esforço de adaptação, seja pela conectividade (que implica em “idas e vindas” durante a aula online), seja pelo desafio de manter o princípio dialógico e grupal do formato pedagógico que adotamos. Ainda assim, estar próximo das necessidades dos/as alunos/as foi uma das diretrizes centrais deste momento, no sentido de ouvi-los (com avaliações  processuais e contínuas, fomento ao diálogo, leitura e produção de textos) e acompanhar o desenvolvimento individual e grupal.

Quais são os principais desafios enfrentados pelo curso atualmente? E como ele tem se reinventado em tempos de pandemia?

Cesp Colegiado: Desde os últimos cinco anos, o Colegiado de Coordenação tem feito mudanças estruturais no curso. Elegemos as desigualdades como um dos temas centrais para pensar o “nascer, viver e morrer no Brasil”. Nesse sentido, um desafio é articular as discussões e conteúdos ao tema das desigualdades em saúde, como entendê-las, como conectá-las às várias dimensões da saúde e como produzir melhores intervenções.

Os principais desafios em termos pedagógicos já foram, em parte, respondidos anteriormente. Mas, outros se somam, devido ao contexto em que vivemos em termos sanitários e que nos aproxima diretamente do objetivo do curso. Nesse sentido, pensar, analisar e intervir sobre o momento da pandemia está sendo transversal e constante: lançam-se perguntas, para as quais ainda não temos respostas, há experiências que não foram vividas (são novas), o que requer um esforço muito grande e rápido (individual e grupal) de adaptação ao novo cenário sanitário. 

Igualmente, o contexto de diretrizes incertas nas políticas de saúde (em diferentes níveis), a austeridade fiscal e o impacto sobre o financiamento da Saúde têm implicações severas sobre o campo da Saúde, a formação em Saúde e os/as trabalhadores/as e usuários/as.
 
Quais são os principais desafios de um sanitarista recém-formado no país?

Cesp Colegiado: O trabalho do sanitarista ganhou mais evidência. Assim como o de todos/as os/as trabalhadores/as de Saúde que atuam no SUS (na Atenção Primária, Secundária ou Terciária). Todos/as têm tido um papel fundamental no enfrentamento da pandemia, o que reforça a importância da formação básica em saúde coletiva.

Muitos profissionais chegam ao curso com uma formação técnica específica das respectivas graduações e sem um conhecimento mais amplo da importância do SUS. E, em geral, as graduações da área da Saúde, em especial a de medicina, ainda tem um olhar para a saúde centralizado na ação médica e no atendimento hospitalar, dificultando o trabalho interdisciplinar e a atuação em outros espaços. 

Subjacente a esse olhar, está a concepção de saúde apenas como ausência de doença e, coerente com essa concepção, uma ação pontual visando resolver a queixa dos usuários. Nesse sentido, a formação em Saúde Pública/coletiva amplia a visão desse aluno/a, não só para compreender os condicionantes da saúde, mas também para que possa rever sua prática, compreendendo os/as usuários/as do SUS, no seu contexto de vida e trabalho.

Paralelamente à formação dos/as trabalhadores/as do SUS, está a importância da sociedade conhecer os diversos aspectos da atuação do sanitarista, como as ações de Educação Popular em Saúde. A compreensão da população sobre saúde, no seu conceito ampliado e, mais especificamente, sobre o SUS é vital para que possa entender o seu papel na defesa desse sistema e contribuir para o seu fortalecimento, sendo coparticipante na construção do SUS, pois como as pessoas, sempre inacabado, como nos lembra Paulo Freire.









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