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Especialistas reforçam: contaminação dos alimentos por agrotóxicos é altíssima no Brasil

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Publicado em:09/06/2016
 
Para falar sobre a real situação do uso dos agrotóxicos no Brasil e o impacto do pesticida no consumo de água e dos alimentos, o Centro de Estudos Miguel Murat de Vasconcellos da ENSP, realizado em 25 de maio, teve como tema Resíduos de Agrotóxicos nos alimentos e Doenças Crônicas Não Transmissíveis. A atividade teve participação da professora do Departamento de Nutrição Social da UERJ e secretária executiva do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN), Juliana Casemiro, do produtor de alimentos orgânicos Alcimar Espírito Santo e do pesquisador da ENSP Luiz Claúdio Meirelles. Na ocasião, o diretor da Escola, Hermano Castro, coordenou a atividade e destacou que o modelo agrário e econômico atual aprofunda as desigualdades. No campo da alimentação, a aposta nas commodities agrícolas não só estimulam as desigualdades, como também geram um conjunto de danos em função do modelo de atuação química e de proteção agrícola, ou seja, uma série de substâncias químicas que acabam contaminando o alimento e causando danos à saúde.

"O Ministério da Saúde deve apostar em uma Política de Agroecologia, em alternativas mais saudáveis para a sociedade, que do ponto de vista econômico seriam sustentáveis. Esse é o caminho”, afirmou o diretor da ENSP. Dando início as apresentações, o pesquisador Luiz Claúdio Meirelles, que atua na área de toxicologia dos agrotóxicos do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh/ENSP) focou sua palestra no tema Controle de agrotóxicos nos alimentos. Meirelles fez uma breve contextualização e afirmou que é preciso regular. Segundo ele, o Brasil é o maior mercado mundial de agrotóxicos nos últimos quatro anos, sendo os agrotóxicos um dos mais importantes fatores de risco para a saúde da população e para o meio ambiente. Sobre regulação, o pesquisador citou que infelizmente temos uma capacidade reduzida dos órgãos de saúde e meio ambiente, nas três esferas de governo, para desenvolver serviços de monitoramento e controle de agrotóxicos. 

"Mesmo em pequenas quantidades os agrotóxicos são uma ameaça a vida, eles não são inócuos. Estamos falando de produtos que foram criados para matar organismos indesejáveis, então é óbvio que eles podem causar malefícios em nós mesmos. A ingestão de resíduos pode não trazer prejuízos na hora, mas com certeza terá repercussão sobre a saúde. Não podemos rejeitar isso. Nessa discussão de modelo que o Hermano citou em sua fala, eu reforço. Que modelo de produção que nós queremos? Por que quando nós falamos em agrotóxicos, eles são caros em todas as etapas. Quando se pensa em agrotóxicos, o Estado precisa controlar uma série de etapas que não custam barato para a sociedade e com resultados duvidosos, como é o caso do controle e monitoramento de resíduos. Então o grande objetivo é ter um modelo de produção muito mais limpo do que o que é adotado hoje. No campo da agroecologia, da agricultura orgânica, já existem muitos campos de conhecimento que permitem que se produza de forma limpa, porém, isso tudo esbarra nos interesses dos grandes conglomerados de indústrias que pretendem manter o mercado como está, e o Brasil é um mercado muito importante no avanço desse capital”, reforçou ele. 

Sobre a produção e consumo de agrotóxicos o pesquisador citou os principais usos - Agricultura, Pecuária, Armazenamento de Alimentos, Campanhas Sanitárias, Doméstico e em Edificações e Logradouros Públicos - além do consumo mundial e brasileiro. Mundialmente 20 grandes indústrias comandam o mercado, vendendo 45 bilhões de dólares por ano e acumulando um total de 4 milhões de toneladas de agrotóxicos anualmente. No cenário brasileiro, seis grandes indústrias comandam o mercado, através de 130 empresas, que acumulam um valor de vendas de 10 bilhões de dólares ao ano. Existem atualmente 432 ingredientes ativos em 1.500 produtos comerciais, sendo 45% herbicidas, 27% inseticidas e 28% fungicidas. Luiz Cláudio apresentou uma série histórica sobre intoxicação por agrotóxicos. De acordo com dados do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox/Fiocruz) de 2001 a 2011 o número de casos por intoxicações aumentou gradativamente. Em 2001 eram aproximadamente 2 mil casos, em 2011 o número chegou a cerca de 9 mil casos. 

Competência Legal sobre o monitoramento

Segundo o pesquisador, cabe a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) regulamentar, controlar e fiscalizar os produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública. Desta forma, cabe a Anvisa o controle e fiscalização sanitária de alimentos, inclusive bebidas, águas envasadas, seus insumos, suas embalagens, aditivos alimentares, limites de contaminantes orgânicos, resíduos de agrotóxicos e de medicamentos veterinários. O monitoramento de resíduos de agrotóxicos no Brasil é feito pela Anvisa, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Ministério da Saúde e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), dividido por áreas de atuação. Cabe a Anvisa e ao MAPA, por exemplo, o monitoramento de alimentos in natura, alimentos processados e de origem animal ficam apenas a cargo da Anvisa. O MAPA monitora ainda os alimentos para exportação. Água potável fica com o Ministério da Saúde e Águas subterrâneas, rios, lagos e mar, e Solo, ficam a cargo do Ibama. 

Meirelles explicou ainda como é feito o registro de agrotóxicos no Brasil que inclui a Anvisa, o MAPA e o Ibama, no qual cada um é responsável por uma conclusão, o MAPA dá as conclusões agronômicas, a Anvisa as conclusões toxicológicas e o Ibama as condições ambientais. De acordo com o pesquisador atualmente existem cinco modalidades de avaliação para registros de agrotóxicos no Brasil. Luiz Cláudio Meirelles citou também alguns critérios para experimentação e sobre estudos desenvolvidos pelo regulado, o que segundo ele, podem comprometer os resultados devido a conflito de interesses. Por fim o pesquisador apresentou o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) que tem por objetivo monitorar resíduos de agrotóxicos em alimentos visando mitigar o risco à saúde quanto à exposição a essas substâncias. 

“O PARA integra medidas de controle pós-registro que têm promovido diversas mudanças na organização dos serviços de saúde para prevenção de agravos relacionados aos agrotóxicos. Suas atividades visam a promoção da saúde através do consumo de alimentos de qualidade e a prevenção das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) secundárias à ingestão cotidiana de quantidades perigosas de agrotóxicos”, explicou ele. Meirelles apresentou um histórico de amostras analisadas pelo PARA entre os anos de 2002 e 2014. Em 2012, por exemplo, em 13 culturas analisadas, 27, 9% das amostras foram insatisfatórias, em 38,2% foram encontrados resíduos permitidos e em 33,9% não foram encontrados resíduos. Para o pesquisador muitos desafios ainda se põem na questão dos agrotóxicos no país, como 100% da rastreabilidade dos produtos in natura; novos laboratórios de toxicologia para atender ao PARA; monitoramento de resíduos na água de consumo humano e alimentos processados; desenvolvimento de programas e ações nos estados; participação de representação da sociedade civil e Ministério Público no desenvolvimento do PARA, entre outros.

A contaminação nossa de cada dia

Representando o Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, a professora do Departamento de Nutrição Social da UERJ, Juliana Casemiro, destacou logo no início de sua fala que 1/3 dos alimentos consumidos diariamente são contaminados por algum tipo de agrotóxico. Os efeitos a saúde são cumulativos, a longo prazo, como problemas no sistema nervoso, câncer ou alterações fetais. Para proteger organismo é preciso higienizar os alimentos. Em seguida Juliana descreveu um pouco das dimensões da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), como disponibilidade, acesso e utilização. Segundo a professora, existem atualmente dois caminhos no modelo de produção: a agricultura camponesa e agronegócio, no qual um proporciona a segurança alimentar e o outro a insegurança alimentar.

Para Juliana muitos desafios são postos em questão na hora da alimentação saudável, muitos deles relacionados aos preços dos produtos orgânicos, para isso é preciso de informação para ação. “É preciso liberar, monitorar, fiscalizar, rastrear, reavaliar os recursos financeiros e humanos. Para isso temos vários caminhos que incluem agroecologia, agricultura familiar e camponesa, agricultura urbana, alimentação escolar, o Programa de Análise de Resíduos Tóxicos, extensão rural, participação popular e controle social, além de legislação e classificação”, apontou ela. Por fim a professora falou sobre o desafio de produzir comida de verdade, que para a Juliana é resultado de culturas diversas, de distintos biomas e de valiosa biodiversidade. “Os modos de produzir e permitir ou promover o acesso ao alimento, conectam-se ao ato de cozinhar e comer”, concluiu a secretária executiva do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.

Sob ponto de vista da produção

O debate sobre os resíduos de agrotóxicos nos alimentos buscou mostrar pontos de vista de um mesmo lado, a questão da regulação, o espaço para articulação das políticas e a ótica do produtor. Para isso o debate contou também com a participação do produtor de alimentos orgânicos Alcimar Espírito Santo, que representa os Orgânicos Lagoa. O produtor apresentou um breve histórico da introdução dos agrotóxicos e seu contexto no Brasil. Segundo ele, desde 2008 o Brasil é o líder mundial no consumo de agrotóxicos, além disso, a venda de agrotóxicos no país saltou de US$ 2 bilhões em 2001, para US$ 9 bilhões em 2011. “70% alimentos consumidos in natura no Brasil são contaminados, segundo o último Dossiê da Abrasco e 28% dos alimentos in natura, segundo a Anvisa, contém substâncias não autorizadas”, apontou o produtor. Alcimar mostrou também um ranking dos alimentos mais contaminados, segundo a Anvisa e falou sobre um agrotóxico muito utilizado, o Glifosato, que teve sua massificação em 1974, e ainda hoje é o mais popular dentro os produtos, sendo utilizado em parques, jardins, gramados, campos, dentre outros, devido a outra estratégia de marketing, em que o produto foi apresentado como biodegradável.

O produtor mostrou também em sua apresentação os dez países com mais hectares dedicados a agricultura orgânica – Austrália, Argentina, Estados Unidos, China, Espanha, Itália, Alemanha, França, Canadá e Brasil. Sobre a alternativa à oferta de alimentos contaminados - a agricultura orgânica - Alcimar finalizou sua apresentação destacando alguns pontos importantes como: o crescimento do mercado estimado entre 20 e 30%; o incremento no número de agricultores no MAPA; o aumento da área plantada destinada à orgânicos; o maior interesse e melhor divulgação do modelo de produção; a ênfase cada vez maior em saúde e bem estar; o privilégio de produtores locais; além do conhecimento da origem dos produtos. 

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