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Covid-19 e o ambiente alimentar digital é destaque no espaço temático do 'Cadernos de Saúde Pública'

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Publicado em:26/11/2020
A revista Cadernos de Saúde Pública, da ENSP, destaca em seu espaço temático a relação entre a Covid-19 e o ambiente alimentar digital no Brasil. As autoras Laís Vargas Botelho, Letícia de Oliveira Cardoso e Daniela Silva Canella consideram que a adoção de algumas intervenções poderia proteger a saúde. Por exemplo, proibir a entrega de comida em escolas; regulamentar o uso de algoritmos de recomendação; e regular o uso do cartão refeição no âmbito do Programa de Alimentação do Trabalhador.

O artigo das autoras reforça que a Covid-19, como é uma doença infecciosa causada pelo recém-descoberto SARS-CoV-2, para a qual ainda não há vacina ou tratamento comprovadamente eficaz disponível, sendo que esse coronavírus tem alta taxa de transmissibilidade e que sua transmissão se dá por contato pessoal próximo ou com superfícies contaminadas, o distanciamento físico é a melhor estratégia disponível para enfrentar sua disseminação. Por isso, desde que foi declarada a transmissão comunitária da Covid-19 no Brasil, atividades comerciais não essenciais foram interrompidas, e as essenciais tiveram de adotar regras específicas de funcionamento.
 
As pesquisadoras lembram que, no âmbito da nutrição em saúde pública, medidas têm sido defendidas para desestimular o consumo de alimentos ultraprocessados, como a adoção de embalagens com advertência frontal, a tributação de bebidas açucaradas e a regulação da publicidade e de ambientes. Contudo, alertam elas, a despeito da rápida ascensão da indústria de delivery de comida, que pode estar sendo impulsionada no contexto da pandemia, ainda não existem propostas de medidas específicas para estimular a aquisição de preparações culinárias baseadas em alimentos in natura ou minimamente processados, e desencorajar a compra daquelas à base de alimentos ultraprocessados.





O artigo conclui que a indústria de delivery de comida, provavelmente, sairá fortalecida da crise sanitária, e adquirir comida online, especialmente via aplicativos, poderá integrar o cotidiano de muitos brasileiros após a pandemia. Dessa maneira, embora isso esteja fora do escopo deste artigo, as autoras salientam a necessidade de atenção e aprofundamento em diversos aspectos da saúde pública intrincados a esse fenômeno, como os direitos trabalhistas dos entregadores e o impacto ambiental decorrente do uso de embalagens para transportar refeições. “No que se refere à saúde do consumidor, advoga-se pela necessidade de estudos sobre a prática de comprar comida em aplicativos a fim de identificar potenciais impactos nutricionais, definir e fundamentar ações prioritárias para promover uma alimentação adequada e saudável nesse canal digital.”
 
No editorial do 'Cadernos', a pesquisadora Maria Tavares Cavalcanti fala sobre os sintomas depressivos entre imigrantes na Europa e o papel da exclusão social. “Iniciamos com esse mergulho profundo para advogar que o estudo da presença de sinais e sintomas de sofrimento psíquico e/ou transtornos mentais entre imigrantes é apenas a ponta do iceberg de uma questão muito mais ampla e que implica a discussão a respeito do nosso próprio modelo de sociedade, cada vez mais excludente, quando deveríamos estar caminhando na direção oposta, caso tenhamos intenção de que humanidade ainda permaneça por muitos mais séculos na Terra.”

O texto traz dados importantes. Utilizando-se de dados da sétima etapa do Pesquisa Social Europeia de 2014, com uma amostra de 1.792 imigrantes e 22.557 europeus nativos, os autores apontam que o autorrelato de sintomas depressivos é maior entre os imigrantes do que entre os nativos, sendo que as prevalências são maiores entre aqueles imigrantes que estavam na Europa até 10 anos e há mais de 20 anos. Além disso, os resultados mostram que diferentes dimensões de exclusão social - econômica, social e cultural - juntas explicam completamente essas diferenças de sintomatologia depressiva entre nativos e imigrantes residentes por 1-10 anos e muito ligeiramente para imigrantes residentes por > 20 anos. Os fatores econômicos isoladamente explicam as diferenças entre nativos e imigrantes que residem entre 1 e 10 anos na Europa.

Para Maria, desde que o mundo é mundo ocorrem fenômenos de deslocamento de indivíduos, pequenos grupos e até mesmo populações inteiras. Atualmente, dados da Organização das Nações Unidas (ONU) indicam que o mundo tem cerca de 250 milhões de imigrantes internacionais, ou seja, pessoas que vivem em países distintos dos que nasceram. Desse total, mais de 68 milhões encontram-se em situação de deslocamento forçado. Embora o artigo não faça distinção entre os imigrantes internacionais e os refugiados, esta é uma distinção fundamental a ser feita quando se trata do processo migratório. Os primeiros fazem uma escolha voluntária de viver no exterior, em geral por motivações econômicas, os refugiados são obrigados a deixar os seus países “devido a fundados temores de perseguição relacionados à sua raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política, conflitos armados, violência generalizada e graves violações dos direitos humanos”. Os refugiados, portanto, apresentam uma vulnerabilidade ainda maior.

Frente a um contexto tão árido, continua Maria, a acolhida no país que recebe o imigrante é fundamental para uma maior integração, menor exclusão social e consequentemente menor probabilidade do desencadeamento de sofrimento psíquico intenso e transtornos mentais.

Romper as fronteiras dos preconceitos, abrir-se à hospitalidade ao outro que busca acolhida em nossa terra é sempre um enorme desafio. “Tornar-se irmão de todos demanda uma entrega, uma disponibilidade, um caminho de abertura que começa dentro das nossas casas, com aqueles mais próximos e segue por um envolvimento coletivo em busca de transformações mais amplas da nossa sociedade e da nossa humanidade”, conclui ela.

Na seção Perspectivas da revista, o artigo Ancestralidade genética indígena como fator de risco para tuberculose? Perspectivas críticas e implicações em políticas públicas na saúde indígena, de Ricardo Ventura Santos, Luiz Antônio Bastos Camacho, Sergio Tavares de Almeida Rego, Luiz Eloy Terena, Ana Lucia Pontes, Jane Felipe Beltrão, e Carlos E. A. Coimbra Jr., fala que o conceito de vulnerabilidade ocupa um espaço central nos debates sobre a saúde dos povos indígenas em escala global, sendo inclusive amplamente referido nas discussões acerca da disseminação da pandemia de Covid-19. Esse conceito se faz presente na Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas no Brasil, alinhando-se à perspectiva dos determinantes sociais da saúde. Nesse esquema interpretativo, que é tão central para as políticas públicas em muitos países do mundo, e também no Brasil, todo e qualquer agravo que acomete as populações humanas envolvem, em alguma medida, aspectos biológicos, mas os principais determinantes do adoecimento e morte das populações são tidos como se vinculando, primordialmente, a desigualdades étnicas, políticas e socioeconômicas. Mas no caso da saúde dos povos indígenas, por vezes, prossegue o artigo, são acionados argumentos que se ancoram no que poderíamos chamar a outra “face da moeda” do conceito de vulnerabilidade. É quando a noção se assenta, predominantemente - ou completamente, em argumentos ligados à determinação genética. 

Já na seção Questões Metodológicas do CSP, o artigo Pesquisa social em ambientes digitais em tempos de COVID-19: notas teórico-metodológicas, de Suely Deslandes e Tiago Coutinho, trata dos impasses para a pesquisa social e o seu futuro. A pesquisa em ambientes digitais já estava em franca expansão, mas neste momento de suspensão de atividades presenciais, torna-se uma alternativa para viabilizar a continuidade dos estudos. Compreendê-la melhor se torna uma necessidade epistemológica e metodológica para todos os pesquisadores.

Assim, o objetivo do ensaio foi propor algumas considerações teórico-metodológicas sobre a pesquisa qualitativa nos diferentes ambientes digitais formados pela Internet 2.0. Pontuamos alguns aspectos e tensões introdutórias que consideramos estratégicas para os que vão começar seu trabalho nas redes de sociabilidade sustentadas pela Internet. Organizamos o artigo a partir dos seguintes tópicos: (1) a sociabilidade digital; (2) o “ambiente digital” e o borramento de fronteiras entre real-virtual; (3) a redefinição do significado de “campo” na ambiência digital; (4) os diferentes usos culturais das plataformas digitais; (5) as plataformas como produtoras de gêneros discursivos; (6) a produção e extração de acervos. O ensaio procura demonstrar que a pesquisa nas ambiências digitais descortina um campo exponencial de possibilidades, seja para explorar as formas que essa sociabilidade assume em nossos cotidianos, para modular nossas (inter)subjetividades, como permite a produção de narrativas e performances identitárias, associações para propósitos diversos, entre tantas outras possibilidades. Todavia, demanda uma compreensão da ação social a partir da sinergia dos contextos sócio-técnico-culturais que a estruturam.

Confira o Cadernos de Saúde Pública, de novembro, na íntegra, aqui.

Fonte: Cadernos de Saúde Pública

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