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Racismo determina o processo de saúde, doença e morte

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Publicado em:07/12/2018
Racismo determina o processo de saúde, doença e morte"Como as vidas negras acabaram se consolidando no formato de uma política pública? O movimento negro sempre cuidou de si mesmo: nas rodas de samba, nas rodas de mulheres, chás, parteiras, benzedeiras. Isso sempre foi saúde para as pessoas negras. Por quê isto não está estruturado nos cânones da Saúde Coletiva?", questionou o coordenador do Grupo de Trabalho  Racismo e Saúde, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), e pesquisador do Instituto de Saúde, da Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo (IS/SES-SP), Luís Eduardo Batista. O coordenador foi um dos palestrantes do Centro de Estudos Miguel Murat de Vascconcelos da ENSP que teve como tema Vidas negras - saúde e resistência.

Quadros que contam a nossa história

No telão do salão internacional da ENSP, Luís Eduardo Batista projetou a história - em arte. Em um primeiro slide, a chegada dos portugueses. A clássica imagem das caravelas ao fundo, os índios na beira da praia, lusitanos em pequenos barcos. Em seguida, Iracema - perpetuada em um quadro de 1881 - uma jovem índia nua "para lembrar que é pelo corpo da mulher indígena que se passa a relação dos portugueses com os índios, o cunhadismo", explica o pesquisador, referindo-se ao antigo costume indígena de incorporar estranhos a sua comunidade, lhes dando uma mulher da tribo como esposa.

Por fim, a Redenção de Cam. O quadro foi levado em 1911 para o Congresso Universal das Raças, em Londres, a fim de ilustrar a população do Brasil naquela época: a senhora negra, mais idosa, tem uma filha parda, que ao se casar com um homem “caipira” (dentre outras definições, era um homem do campo, branco, mas não detentor de posses) tem um filho mais claro. O discurso foi de que só no embranquecimento da população o Brasil seria um país avançado. Daí veio o aceleramento de imigração de japoneses e europeus.

Racismo como Determinante Social de Saúde

A conclusão de Luís Eduardo, a partir da Redenção de Cam, é de que as contagens populacionais , a categorização do povo, acontece no Brasil há muito. Entretanto, a inclusão de raça/cor como um determinante social de saúde é muito recente. "A gente lia Juan César Garcia, que dizia que as desigualdades econômicas e estruturais determinavam o processo de saúde e doença; Asa Cristina Laurell, que dizia que a inserção no mercado de trabalho determina o processo de saúde e doença; Cecília Donnangelo, que falava sobre a relação médico e paciente. Se no campo da Saúde Coletiva a gente estava falando que os fatores sociais, econômicos, políticos, culturais, ambientais, sociais, econômicos e políticos determinam o processo de saúde e doença, não podíamos começar a pensar que para a população negra essas condições são piores (já que as pessoas negras apresentam os piores índices em todas estas questões)? Mas a raça se confundia com a questão socioeconômica - não estudava-se especificamente".

O primeiro passo para entender-se racismo enquanto determinante social de saúde foi em 1995, quando durante a Marcha Zumbi de Palmares, manifestantes conseguiram do governo Fernando Henrique Cardoso a criação do Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra. Em 2005, o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) ganhou informações de raça/cor (branco, preto, pardo, amarelo e indígena) – mas, neste ínterim, as pesquisas já apontavam que enquanto brancos e amarelos morriam mais por complicações respiratórias, endócrino nutricionais, problemas no aparelho circulatório e outras doenças mais sérias, a população preta morria, principalmente, por complicações no parto, doenças infecciosas e parasitárias. Causas evitáveis.

O abrasquiano cita em suas referências Maria do Carmo Leal, pesquisadora da ENSP, e sua pesquisa 'Nascer no Brasil' , que comprova como mulheres negras têm filho mais cedo e em maior número, são maioria na maternidade solo,  sofrem mais com pré-natal inadequado (menos consultas, maior tempo de espera para serem atendidas), têm menos privacidade no parto e pré-parto, correspondem ao maior número de mulheres em trabalho de parto não aceitas na primeira maternidade que procuram, e, apesar de terem mais partos vaginais, sofrem mais violência obstétrica.

Política Nacional de Saúde Integral da População Negra

A partir do entendimento de que o racismo estrutura a sociedade, e de que as dificuldades de ascensão da população negra, desvantagens históricas, menor escolaridade, menor renda, condições de trabalho mais precárias, miséria material, isolamento social e restrição da participação política dos negros no brasil estão ancoradas por este racismo estrutural - que determina o processo de doença, saúde e morte - é que os olhares se voltaram ao princípio do SUS, a fim de pensar uma política para dar resposta a estes problemas. Assim surge a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), elaborada em 2006 e instituída pelo Ministério da Saúde em 2009 –  produção científica para subsidiar política, gestão e mudanças na sociedade.

Considerando que esta Política foi aprovada no Conselho Nacional de Saúde (CNS) e pactuada na Reunião da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), o pesquisador surpreendeu os ouvintes ao anunciar que de 5570 municípios brasileiros apenas cerca de 50 tenham implantado, de fato, a PNSIPN.

Clique aqui para ler a matéria na íntegra.

*Por Hara Flaeschen, sob supervisão de Vilma Reis.

Fonte: Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco)
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