Professor de universidade japonesa participa de atividades de pesquisa da ENSP junto ao povo Munduruku, no Pará
Por Barbara Souza
O grupo de pesquisa 'Ambiente, Diversidade e Saúde', da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz), coordenado pelo pesquisador Paulo Basta, recebeu o professor Kunihiko Yoshida, da Universidade de Hokkaido, do Japão, durante trabalho de campo com o povo Munduruku, no Pará. Advogado e especialista em direito ambiental e saúde, o visitante quer entender se esta população apresenta sinais e sintomas da Doença de Minamata, causada pela contaminação por mercúrio. “Estou visitando a aldeia pela primeira vez. Provavelmente eu sou o primeiro japonês que vem aqui! O objetivo principal da visita é conhecer a realidade da Doença de Minamata brasileira entre os Munduruku”, conta Yoshida, que encontrou Paulo Basta e equipe na última sexta-feira (10/3).
O professor Yoshida tem participado de atividades do ‘Estudo Longitudinal de Gestantes e Recém-Nascidos Indígenas expostos ao Mercúrio na Amazônia’. Primeiro, ele esteve presente no encerramento do curso “Vigilância e Monitoramento de Populações Expostas ao Mercúrio no Brasil: Aspectos Práticos” que, em sua quarta edição, foi voltado para profissionais de saúde do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Rio Tapajós, em Itaituba (PA). Já nesta semana, o visitante japonês acompanha um treinamento para professores indígenas, que está sendo realizado na Terra Indígena Sawré Muybu. Este curso tem como público-alvo professores do 6º ao 9º Ensino Fundamental e o objetivo é prepara-los para utilizar um livro bilíngue Munduruku/Português que tem como tema os impactos sanitários e ambientais do garimpo ilegal, como a contaminação por mercúrio. O livro é fruto de um projeto de pesquisa liderado por Ana Claudia Vasconcellos, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), em parceria com Paulo Basta (ENSP).
“A visita do professor Yoshida é um reconhecimento público do problema que o povo Munduruku tem enfrentado nas últimas décadas em relação à presença de garimpo ilegal no território, à contaminação das águas e de todo o ecossistema amazônico pelo mercúrio, que é usado indiscriminadamente nos garimpos. A presença dele aqui é um reconhecimento internacional da luta do povo Munduruku. Significa que os desafios que eles têm passado vão ser conhecidos do outro lado do mundo”, afirma Paulo Basta.
Membro do Conselho Ambiental do Japão - JEC, Kunihiko Yoshida assumiu a missão de identificar o maior número de pessoas no mundo afetadas pela Doença de Minamata, a fim de tomar providências jurídicas. Ele quer estabelecer uma aliança internacional para o combate à doença e oferecer assistência aos portadores dela. A expectativa é que a ENSP/Fiocruz faça parte desta aliança. Ele esteve na ENSP em setembro de 2022 para iniciar as tratativas em prol da assinatura de um memorando de entendimento entre a instituição brasileira e o Conselho Ambiental do Japão. Yoshida retornará à Escola na próxima segunda-feira (20/3) para um novo encontro com a vice-diretora da Escola de Governo em Saúde da ENSP, Marismary Horsth De Seta. O professor japonês reafirmou a relevância de estreitar laços institucionais: “compartilhar informações é importante e eu espero que a parceria nos traga muito”.
Paulo Basta aposta no estreitamento da parceria. “Vai permitir a todos a ampliação da troca de conhecimento, a possibilidade de projetos de intervenção para o enfrentamento do problema da contaminação por mercúrio e, quem sabe, até apoio financeiro das agências de fomento do governo japonês e de outros países que queiram apoiar a luta dos povos indígenas e originários do Brasil”, afirmou.
Os pontos a serem debatidos para a formalização de um memorando de entendimento bilateral são: esforços gerais para melhorar a situação da mineração ilegal de ouro; compartilhamento de informações sobre a Doença de Minamata; colaboração internacional em check-up de saúde e educação em saúde para os pacientes brasileiros com Doença de Minamata; esforços de movimento de base entre os dois países (Brasil e Japão) em busca de ajuda financeira por danos aos povos indígenas; encontros híbridos internacionais e trabalho de campo em aldeias indígenas no estado do Pará, no estado de Roraima, no estado do Amapá etc.; e Educação Ambiental Indígena para jovens.
Estudo com gestantes e bebês indígenas
O curso ‘Vigilância e monitoramento de populações expostas ao mercúrio no Brasil: aspectos práticos’, realizado de 6 a 10 de março preparou profissionais de saúde para colher as amostras biológicas das mulheres e bebês participantes do "Estudo Longitudinal de Gestantes e Recém-Nascidos Indígenas expostos ao Mercúrio na Amazônia", coordenado pelo pesquisador da ENSP Paulo Basta. O estudo integra o 'Projeto Proteção dos Povos Indígenas e Tradicionais do Brasil', financiado pelo governo da Alemanha por intermédio da rede WWF. Foram treinados profissionais de saúde de níveis superior e médio, não-indígenas e indígenas, como técnicos de enfermagem e agentes indígenas de saúde e de saneamento. Essa foi a quarta turma a receber a capacitação, mas a primeira a focar nos aspectos práticos, já que a principal finalidade é a participação desses profissionais na coleta de amostras a serem analisadas durante a pesquisa.
O curso com os professores indígenas a respeito do garimpo ilegal e seus prejuízos, em andamento nesta semana, é a segunda atividade de campo do mesmo projeto. Na semana que vem, para encerrar esta visita ao povo Munduruku, será realizada uma oficina musical, com a participação de coletivos audiovisuais indígenas, para a composição de canções e gravação de um clipe de caráter educativo para a conscientização das comunidades locais e da sociedade a respeito dos danos à saúde e ao ambiente causados pelo mercúrio.
No total, estão previstas visitas trimestrais da equipe coordenada pelo pesquisador Paulo Basta às aldeias onde as mulheres e seus filhos serão monitorados até que se complete o segundo ano de vida das crianças. Na última etapa, serão entregues às mulheres os resultados dos seus exames e os prontuários médicos nos quais estarão registradas as informações relevantes para eventuais tratamentos, por exemplo. Cópias desses registros também serão recebidas pelas autoridades de saúde locais para a devida assistência.