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Raízes profundas: a trajetória da Saúde Indígena na Saúde Coletiva

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Publicado em:19/01/2021

Até o dia 11 de janeiro de 2021, 915 pessoas indígenas morreram pelo novo coronavírus no Brasil, e mais de 44 mil foram contaminadas. Dez meses depois do primeiro caso confirmado no país, ainda está em discussão um plano de enfrentamento à pandemia específico para os povos originários – e as medidas necessárias para protege-los do vírus ainda não foram implementadas. Mas há resistência. Desde a chegada da doença no Brasil, indígenas e seus apoiadores constroem uma frente política, pautada na ciência e na saúde como direito, para exigir que o Estado brasileiro cumpra seu dever. O Grupo Temático Saúde Indígena da Abrasco está nesta trincheira, entre a vida e a barbárie. E é nesta conjuntura que celebram 20 anos de existência. 

Saúde indígena e Movimento da Reforma Sanitária

Em meio ao caos do presente, o marco – duas décadas de atividades do GT – fez os pesquisadores, alguns deles da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz), refletirem sobre os caminhos que os trouxeram até o lugar que ocupam hoje: referência na academia e na militância, aliados e companheiros dos povos que lutam pela sobrevivência e pela proteção das terras que lhes pertencem. O Grupo Temático foi articulado em dezembro de 2000, durante uma oficina realizada em Manaus, mas as raízes são mais profundas, mergulhadas na história do Movimento da Reforma Sanitária, do SUS, da democracia – e antes disso.

Às vésperas da constituinte, a discussão sobre a saúde dos povos indígenas pulsava: em 1986, após a histórica 8ª Conferência Nacional de Saúde, ocorreu a 1ª Conferência Nacional de Proteção à Saúde do Índio, onde primeiro se falou em um subsistema de saúde indígena. Os diálogos travados no encontro foram registrados em uma edição especial da revista Saúde em Debate, publicada pelo Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes) em janeiro de 1988: A Saúde do Índio . A revista reuniu artigos de antropólogos, médicos, dentistas, indígenas e diversas organizações sociais.

No editorial, uma convocação: “Torna-se imprescindível que o debate sobre o índio não fique restrito apenas aos poucos profissionais que têm dedicado suas vidas à assistência a estas populações”. A publicação ilustra o momento em que a Saúde Coletiva  passou a discutir o direito à saúde dos povos indígenas de forma mais ampla, e foi a partir dessa perspectiva intelectual  e política que indígenas e sanitaristas lutaram pela criação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI-SUS), em 1999. Nesse contexto, o embrião do GT Saúde Indígena da Abrasco começou a ser gestado.

Atuação política como tradição 

A partir de 1999, com a implementação dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), os pesquisadores da área avaliaram que um dos grandes desafios era consolidar o novo modelo de assistência sem suprimir a “sociodiversidade indígena” e a heterogeneidade de seus perfis epidemiológicos. “O GT surge nesse contexto da discussão de uma nova política pública, com a necessidade de produção de conhecimento e tecnologias, com postura crítica, para pensar a saúde indígena. Estávamos profundamente envolvidos, assessorando o Estado e as organizações indígenas. Por outro lado, sentimos necessidade da institucionalização dentro da própria Saúde Coletiva”, pontuou Ricardo Ventura – membro fundador do GT Saúde Indígena da Abrasco, pesquisador da ENSP/Fiocruz e do Museu Nacional/UFRJ. 

Segundo Esther Jean Langdon, pesquisadora da UFSC e também integrante do GT desde o princípio, a articulação política do grupo, e a interlocução com os DSEIs e com o Ministério da Saúde, eram “impressionantes” nos primeiros anos. “É um caminho interessante: a seriedade das pesquisas com um engajamento fora das paredes da academia. Essa tradição de movimento político e postura crítica é um dos fatores que me fazem feliz por ser parte deste grupo”, sinalizou. Langdon ponderou, no entanto, que ocorreram mudanças neste diálogo com o governo, ao longo dos anos e que, particularmente na atual conjuntura, “a ciência não é bem vista”.

O contexto político desfavorável aos cientistas e às populações vulnerabilizadas se acentuou com o governo Bolsonaro, em 2019. Ana Lúcia Pontes, atual coordenadora do GT e pesquisadora da ENSP/Fiocruz, relembrou que  a SESAI entrou na pauta logo no começo do mandato, quando Henrique Mandetta, então ministro da saúde, anunciou uma reformulação na pasta: “Começamos a acompanhar o debate – e a política anti indigenista no Planalto – e entendemos que a gente tinha um papel importante para exercer neste momento”. Em março do ano passado, Mandetta sinalizou que a secretaria seria extinta, e viraria um departamento na Secretaria de Atenção Primária à Saúde do MS:

Naquele momento, o GT produziu notas técnicas, participou de audiências públicas no Congresso Nacional, e fortaleceu os vínculos e a troca de diálogos  com novos e históricos parceiros, como a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), a Associação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), e o mandato da deputada indígena Joênia Wapichana (Rede Sustentabilidade/RO). “Nos colocamos disponíveis para subsidiar tecnicamente estes movimentos, e abrimos um diálogo com a mídia, ocupando um espaço na produção da informação e debate público dessa ameaça ao subsistema de saúde indígena”, explicou Ana Lúcia. 

Clique aqui e leia a matéria na íntegra. 


Fonte: Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco)

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