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Convenção Quadro para o Controle do Tabaco: um avanço na luta contra esse mal

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Publicado em:08/04/2016

Tatiane Vargas

Convenção Quadro para o Controle do Tabaco: um avanço na luta contra esse malAo dar continuidade às discussões do lançamento do Observatório sobre as Estratégias da Indústria do Tabaco e Workshop sobre o artigo 5.3 da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco da Organização Mundial da Saúde (CQCT/OMS), Vera Luiza da Costa e Silva apresentou os avanços da CQCT e a interferência da indústria do tabaco no mundo. Segundo ela, desde 2005, quando países do mundo inteiro assinaram o primeiro tratado de saúde pública global, a Convenção Quadro para o Controle do Tabaco, ascendendo o reconhecimento universal sobre os danos que o tabaco estava causando, o que gerou, portanto, o comprometimento de se mudar os termos da batalha. A compreensão global dos danos causados pelo tabaco é resumida no artigo3 da CQCT, cujo objetivo final é reduzir, de maneira contínua e substancial, a prevalência do consumo e a exposição à fumaça do tabaco.

Onze anos se passaram desde que a Convenção Quadro entrou em vigor. Atualmente, são 180 membros, que, juntos, representam 4/5 da população mundial. Após a ratificação da CQCT, 80% de seus membros reforçaram sua legislação de controle do tabagismo. Globalmente, a implementação de seus artigos substantivos atingiu cerca de 60%. “O progresso tem sido impressionante em muitas áreas importantes das políticas públicas, houve aumento significativo de impostos sobre tabaco, introdução de áreas livres de fumo, proibição de publicidade em pontos de venda, introdução de advertências sanitárias cada vez maiores nas embalagens, além de demanda em alguns países por embalagens padronizadas. Muitas dessas inovações eram inimagináveis em 2005 e refletem tanto a seriedade crescente do movimento do controle do tabagismo como a eficácia da CQCT quando devidamente usada”, comemorou.

Segundo Vera, essas conquistas têm ajudado a reduzir as taxas de tabagismo em muitos países, a exemplo do Brasil em que a prevalência de tabagismo caiu de 15,7% em 2006 para 11,3% em 2013. Diante de tantos avanços e conquistas, Vera lembrou que, lamentavelmente, a implementação para os artigos da CQCT é desigual tanto dentro dos países como entre os membros da Convenção. De maneira geral, a taxa de implementação foi de 59% em 2014, mas, em algumas áreas, o progresso foi muito menor, principalmente nas áreas que lidam com produção do fumo. A chefe do secretariado abordou, ainda, a representação da indústria do tabaco como um parceiro confiante. “É hilariante a noção de que executivos do tabaco sejam confiáveis em uma indústria que mata, pelo menos, metade de seus consumidores. Que dá provas - por meio de documentos e processos judiciais em todo o mundo - que é profundamente indigna de confiança. Que está disposta a contornar ou frustrar a legislação nacional a fim de promover seus próprios interesses”, argumentou.

Vera falou sobre as verdadeiras intenções dessa indústria. De acordo com ela, quando eles não conseguem ter êxito por meio de pesquisa seletiva ou falsa, por lobby ou obstruindo e atrasando táticas, usam a última arma de seu arsenal, isto é, a ação legal ou ameaça de ação legal para intimidar seus oponentes. “A União Europeia está sendo processada por conta de sua Diretiva de Produtos de Tabaco, e os governos britânico e australiano estão sendo levados ao tribunal pela introdução de embalagens padronizadas. O Brasil também enfrentou uma ação legal quando agiu para proibir os aditivos. E, mais recentemente, a indústria pressionou o senado contra a lei de embalagens padronizadas. O comum nesses casos é a alegação de que os governos nacionais e organizações supranacionais não têm o direito de colocar a saúde pública acima de direitos comerciais. Felizmente, os sinais até agora são de que a indústria irá perder.”

Por fim, Vera ressaltou que o monitoramento da indústria do tabaco é um processo difícil e demorado. “Acredito que os observatórios atuam como os olhos e ouvidos da comunidade geral. Eles ajudam a nos proteger, e, por essa razão, a indústria irá ataca-los. Mas, sem as valiosas informações que eles fornecem, será difícil fazer progressos contra essa perigosa indústria e seus produtos imundos que diminuem a qualidade de vida, amontoam bilhões em custos para os sistemas de saúde e enviam milhões de cidadãos precocemente para uma sepultura”, advertiu.

Os avanços brasileiros e a interferência da indústria

Para falar sobre Os avanços da Convenção Quadro da OMS para Controle do Tabaco e a interferência da Indústria do Tabaco no Brasil a atividade contou também com a presença da secretária executiva da Comissão Nacional para Implementação da CQCT (Conicq/Inca), Tânia Cavalcante, que reforçou a questão de a implementação da CQCT fazer parte da Política Nacional de Controle do Tabaco, sendo uma obrigação legal como política de Estado. A Comissão para implementação da Convenção Quadro foi criada em 2003 por um decreto presidencial, com caráter interministerial, com o objetivo de implementar uma agenda nacional para cumprir as obrigações da CQCT e preparar o Brasil para as negociações relacionadas à Conferência das Partes da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco.

Segundo Tânia, ao longo desses onze anos, o Brasil obteve muitos avanços, como aumento de impostos sobre cigarros; proibição de fumar em recintos coletivos; proibição quase total da propaganda e patrocínio de produtos de tabaco; advertências sanitárias com fotos nas embalagens (em 2016, as advertências ocuparão mais 30% da face anterior das embalagens); regulação dos produtos de tabaco, como a proibição dos aditivos; ampliação do tratamento para deixar de fumar pelo Sistema Único de Saúde; além do Programa de Diversificação em Áreas Cultivadas com Tabaco, por conta de o Brasil ser o segundo maior produtor e maior exportador de tabaco.

A prevalência de fumantes também foi apontada pela secretária executiva como importante avanço. “No Brasil, a prevalência de fumantes de 18 anos ou mais caiu de forma significativa, tanto entre homens como entre mulheres, nas últimas duas décadas, segundo os dados de pesquisas nacionais realizadas em 1989, 2003 e 2008. Dados da Pesquisa Especial sobre Tabagismo (Petab), realizada nacionalmente pelo Ministério da Saúde e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2008, mostraram que, naquele ano, já tínhamos mais ex-fumantes que fumantes. Além disso, entre 2008 e 2013 a diminuição da prevalência de fumantes foi maior nos grupos com menor nível de escolaridade e nos mais jovens”, comemorou Tânia.

De acordo com Tânia, a ratificação da Convenção Quadro é um dos maiores enfrentamentos do poder da indústria do tabaco. Ela exemplificou com o caso da indústria do tabaco e as advertências sanitárias nas embalagens. A empresa Souza Cruz e o Sindicato da Indústria do Fumo do Estado de São Paulo (Sindifumo) moveram ação judicial pela impugnação das advertências. Seus argumentos basearam-se na questão de não existir prova sobre a eficiência da medida, as imagens nas embalagens ferirem a dignidade humana, além do questionamento da veracidade das informações, bem como a legitimidade da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para regular produtos de tabaco.

“As advertências sanitárias são uma importante medida da Política Nacional de Controle do Tabaco. Ela está em vigor desde 1989, mas somente a partir de 2001 foi possível incluir advertências sanitárias fortes ilustradas com fotos. Essas advertências são determinadas por lei e ocupam 100% de uma das maiores faces dos cigarros. Também vêm acompanhadas do número telefônico do Disque Saúde, do Ministério da Saúde, para o qual as pessoas podem ligar gratuitamente e receber orientações sobre tabagismo e como deixar de fumar. A Petab de 2008 mostrou que 65% dos fumantes se sentiram motivados a deixar de fumar em razão das advertências com fotos nas embalagens de produtos de tabaco, o que aponta o impacto positivo dessa medida”, alertou Tânia.

Tânia citou também a luta com a indústria na questão da proibição dos aditivos nos produtos derivados. Segundo ela, após a Anvisa regular os produtos de tabaco, muitos avanços aconteceram no Brasil. “Em 2012, depois de um intenso lobby promovido pela indústria do tabaco e outros atores da cadeia produtiva de fumo, inclusive parlamentares da bancada do fumo, a Anvisa conseguiu aprovar uma resolução proibindo o uso de aditivos em cigarros. Os aditivos são uma prática adotada pela indútria há mais de três décadas, seja usando aditivos flavorizantes, para tirar o gosto ruim do tabaco e facilitar o primeiro contato do adolescente com o cigarro na fase de experimentação, ou usando aditivos como a amônia, para manipular o teor de nicotina e aumentar o poder do produto em causar dependência, a indústria vinha investindo de forma crescente nessa tecnologia como forma de garantir seu contingente de consumidores entre jovens.”

De acordo com secretária executiva da Conicq, a Convenção Quadro em suas diretrizes aprovadas em 2010 recomendou que os governos proibissem esses tipos de aditivos nos cigarros. Ainda assim, a Anvisa levou quase dois anos para aprovar essa regulamentação em função do intenso lobby da cadeia produtiva de fumo nos gabinetes do governo federal e no Congresso Nacional. “Essa aprovação só foi possível graças ao apoio ostensivo de várias instituições e organizações, que, em diversas ocasiões, seja na mídia, seja em audiências públicas, manifestaram-se para desmistificar os falsos argumentos do setor fumo para impedir a adoção dessa medida”, finalizou Tânia.

Utilizando o monitoramento da indústria para fazer advocacy

A diretora executiva da Organização Não Governamental Aliança de Controle do Tabagismo + Saúde (ACTBr), Paula Johns, finalizando as apresentações, falou sobre o monitoramento da indústria para fazer advocacy, que compreende o conjunto de ações que visam influenciar a formulação, aprovação e execução de políticas públicas com os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário e à sociedade, por meio do trabalho em redes e a mobilização da mídia. Advocacy significa advogar por uma causa. Segundo Paula, isso envolve a atuação planejada e estratégica para se alcançar os resultados pretendidos, além de ter incidência política em várias esferas. “Trata-se de uma atividade de extrema importância na busca de uma democracia justa e representativa. É uma busca para que o espaço institucional seja o mesmo para todos os grupos de pressão”, explicou.

Paula citou alguns exemplos de estratégias de advocacy, entre elas: identificação de um problema que afeta a comunidade; identificação do tema; produção de dados e levantamento de informações - leis, pesquisas para advocacy -; definição de metas e objetivos; identificação de tomadores de decisão, aliados, adversários e não mobilizados; identificação de parcerias, formação de Redes; elaboração do Plano de Ação e Plano de Comunicação; e monitoramento e avaliação. Para Paula, a maior diferença entre o advocacy e o lobby é que o segundo visa apenas ao dinheiro. “O lobby tem foco em interesse setoriais, além de ser realizado por agentes de setores empresariais e comerciais de grande porte. Seu foco é evitar regulação e tributação. Além disso, monitora qualquer coisa que possa impactar o negócio, não discute mérito ou legitimidade de políticas públicas e tem a ideologia da liberdade total do mercado”, descreveu ela.

A diretora da ACT citou, ainda, a questão das doações de grandes empresas às campanhas eleitorais e como isso compromete as políticas públicas. Segundo Paula, o financiamento de campanhas por empresas privadas foi proibido no Brasil, mas possivelmente não vai resolver o problema da preponderância de interesses econômicos privados em processos decisórios.

Sobre a ACT+

A ACT+ é uma organização não governamental focada no controle do tabagismo e controle das Doenças Crônicas Não Transmissíveis. São promovidas e executadas ações de advocacy, mobilização, comunicação, pesquisas e acompanhamento da implementação da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco e do Plano de Ações para o Enfrentamento das DCNT. As atividades são realizadas com o apoio de uma rede formada por representantes da sociedade civil e cidadãos comprometidos com a promoção da saúde pública.

Em breve, todas as apresentações do evento estarão disponíveis no Canal da ENSP, no YouTube.



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